Património Material
Igreja do Convento do Carmo
A Igreja do Carmo foi mandada construir por D. Nuno Álvares Pereira, no ano de 1389, em honra de Nossa Senhora do Vencimento, em cumprimento da promessa feita na Batalha de Aljubarrota. As fontes mencionam Gomes Martins como um dos principais mestres implicados na obra (concluída no séc. XV). A este edifício veio ligar-se o Convento de Nossa Senhora do Monte do Carmo, cuja construção se iniciou em 1393 e terminou em 1423.
A igreja reflecte a conjugação entre os princípios estruturais das fundações monacais das Ordens Mendicantes, respectivamente quanto à planta e à estrutura, introduzidas em Portugal no período ducentista, e as inovações apresentadas no Mosteiro da Batalha no séc. XV. O edifício foi parcialmente destruído pelo Terramoto de 1755, não chegando a ser reconstruído; embora tenha beneficiado de obras de recuperação e consolidação no séc. XIX, estas não imprimiram ao monumento o seu aspecto original.
O monumento quatrocentista é sede da Associação dos Arqueólogos Portugueses, desde 1857, e alberga o Museu Arqueológico do Carmo. O museu ocupa o espaço do corpo da igreja e quatro capelas da cabeceira; do seu acervo fazem parte peças pré-históricas, romanas, medievais, manuelinas, renascentistas e barrocas, exemplares de cerâmica, epigrafia, heráldica, numismática, azulejaria, tumulária, etc. A área do convento foi convertida em quartel da Guarda Nacional Republicana.
O templo apresenta-se como um espaço de grande monumentalidade (comprimento cerca de 72 metros e nave central 24,64 metros de altura).
Do primitivo edifício carmelita subsiste parte da fachada principal, partes da estrutura do corpo e do transepto e quase toda a cabeceira. Os arcos divisórios, o revestimento interno dos muros, as janelas, entre outros elementos, são resultado das obras de restauro. A igreja de planta de cruz latina tem três naves de cinco tramos, transepto saliente e cabeceira de cinco capelas. A cobertura da nave central foi completamente destruída com o Terramoto. Relativamente à cobertura das capelas da cabeceira da igreja era em cruzaria de ogivas, com um sistema de nervuras na ábside e tramos rectilíneos de quatro terceletes e cadeia, entre a ábside e a nave.
A igreja ostenta a cabeceira composta por capela-mor e quatro capelas secundárias intercomunicantes, escalonadas em altura e em profundidade, cobertas de ogivas e de nervura longitudinal e com ábside poligonal de três panos.
A capela-mor apresenta seis contrafortes e dois andares definidos por cornijas. No primeiro, desenham-se cinco frestas com dois colunelos, o segundo é composto por cinco janelas. Nas restantes capelas absidais é patente a influência das capelas da Sé de Lisboa, que são definidas por um andar e dois panos livres de parede divididos por contrafortes, nos quais se rasgam frestas e, em cima, um renque de modilhões.
A parte central da fachada principal era encimada por uma rosácea e possuía coroamento de empena triangular. A porta axial insere-se num corpo saliente de forma rectangular, reforçado por dois contrafortes dotados de uma mísula. As ombreiras são compostas por seis colunelos assentes em bases quadradas e encimados por capitéis decorados de folhas recortadas e cabeças humanas. Na frontaria poente encontra-se um portal de perfil tardio-gótico, de arquivoltas ladeadas por um arco contracurvado, destacando-se nas ombreiras os fustes coroados de capitéis de decoração vegetal de feição naturalista combinados com máscaras humanas. Nesta fachada permanecem vestígios das moldura de um óculo que se rasgava sobre o portal. Na parte superior da fachada lateral sul do transepto conserva-se um janelão, e em baixo, desenha-se um portal gótico de três arquivoltas, com três colunelos nas ombreiras e capitéis. A separar os colunelos uma decoração de flores de lis em relevo dispostas em bandas verticais.
Do restante edifício conventual pouco se sabe, da campanha inicial permaneceu apenas a torre sineira e a sacristia adjacente à igreja. A sacristia edificada na primeira campanha de obras, possui abóbada de cruzaria de ogivas em pedra e dois janelões góticos.
Nas dependências conventuais encontram-se aduelas manuelinas avulsas ornamentadas com flores em relevo e um portal de pedraria de arco abatido com ombreiras de duplo colunelo e capitelização, de decoração vegetalista simétrica; a meia altura das ombreiras desenha-se um nicho com base semicircular com uma máscara de querubim coroado por um baldaquino com volutas. Na decoração do arco destaca-se o prolongamento dos colunelos em arquivoltas de toros redondos, intercalados por doze cabeças aladas de querubins; no centro, um fecho vegetalista cinta os toros do arco e na arquivolta inscreve-se um colar de pérolas. Este portal representa simbolicamente uma descrição bíblica - o templo de Salomão.
As obras de restauro converteram o edifício do Carmo numa ruína romântica representativa da preservação patrimonial e da memória da tragédia que deixou a cidade em escombros.
PEREIRA, Paulo, A Igreja e Convento do Carmo: do Gótico ao Revivalismo, Associação dos Arqueólogos Portugueses, Lisboa, 1989.