Património Material
Mosteiro de Arouca
A fundação deste mosteiro remonta ao séc. VIII mas, com as invasões árabes o edifício foi destruído. Mais tarde, D. Ansur e sua mulher, D. Eleva, adquiriram o direito do padroado sobre o convento aos seus fundadores, reedificando-o e ampliando-o (951); cederam-no ao abade Hermegildo, da ordem de S. Bento, através da doação de 12 de abril de 961.
D. Eleva e os seus filhos fundaram junto a este mosteiro um recolhimento de mulheres com a regra de S. Bento que foi mais tarde integrado no mosteiro. Até ao séc. XII, foi um mosteiro de frades e freiras para cerca de 1154, com o domínio de D. Toda Viegas, ter sido anulada a comunidade masculina.
A riqueza do mosteiro aumentou com o seu domínio e de D. Mafalda (D. Toda Viegas conseguiu que D. Afonso Henriques lhe desse um couto para o mosteiro, sem quaisquer direitos régios). O couto inicial é de 1143 e englobava as as atuais freguesias de Moldes e Arouca, uma parte da freguesia de Burgo e uma parcela de Canelas. Este couto foi ampliado em 1255, abrangendo toda a área de Arouca, através de uma carta de D. Afonso III a D. Mafalda. Quando D. Toda Viegas morreu deixou expresso o desejo de doar todos os seus bens à Coroa, razão pela qual o mosteiro foi posteriormente legado por D. Sancho I a sua filha, D. Mafalda.
Esta era casada com D. Henrique I de Castela, seu primo e, quando o seu casamento foi anulado, regressou a Portugal e ingressou na vida religiosa, no mosteiro de Arouca. Conseguiu, finalmente, que seu irmão, D. Afonso III, lhe concedesse os direitos reais e a jurisdição da vila de Arouca, as propriedades e rendas de Estarreja, assim como o padroado de várias igrejas. Quando D. Mafalda morreu, em 1256, deixou o mosteiro considerado como um dos mais importantes da península, seguindo já a regra de Cister.
Nos finais do séc. XV, início do séc. XVI, o mosteiro atravessou uma outra fase de grande prosperidade durante os abadessados de D. Leonor Coutinho, filha dos Condes de Marialva e D. Melícia de Melo. Por esta ocasião, foram efetuadas algumas obras de construção nos edifícios e um maior enriquecimento dos mesmos, com a introdução de esculturas, pinturas, peças de ourivesaria, entre outros elementos, a adornar os altares. Atualmente, nada existe do mosteiro original exceto um silhar com a palavra "ERO" seguido duma cruz (comemoração fúnebre), datando talvez do séc. X, e os vestígios de uma rosácea do séc. XIV. O conjunto resulta de sucessivas remodelações e construções, sobretudo dos séculos XVII e XVIII, salientando-se o coro, o claustro e a cozinha.
Apresenta uma planta de forma retangular, formada por quatro corpos e divide-se, no seu interior, em duas partes: o antigo refeitório que faz a ligação entre a ala nascente e a ala poente; a ala Norte é ocupada pela igreja, um edifício de grandes proporções, em ruínas (reconstruída entre 1704 e 1718 pelo arquiteto maltês Carlos Gimac). O interior tem três áreas livres: o pátio do Norte no topo do coro; o claustro e o pátio dos Comuns a Sul. Estes espaços são definidos e separados pelos corpos das celas. O lado Norte do edifício é formado pela igreja e pelo coro, assim como pelo dormitório, local onde se encontram as portas mais antigas, do séc. XVII.
A porta principal da igreja é lateral, situação comum nos mosteiros femininos, muito simples, com pilastras recuadas e um pequeno frontão curvo, não tendo ornatos. A nave da igreja é retangular, sem transepto, dividindo-se verticalmente em duas partes: a parte inferior é cortada em arcos para capelas, dando acesso ao templo e a parte superior apresenta janelas-tribunas. Podem ver-se nichos com estátuas da ordem beneditina. A capela-mor, estreita e quadrada, tem um retábulo que se sabe ter sido executado pelo entalhador Vieira da Cruz (1723) e dourado em 1733, ao estilo joanino.
interior da Igreja
No retábulo do altar do lado do Evangelho encontra-se a urna-relicário de Santa Mafalda, com estrutura em ébano e grandes aplicações de prata e de bronze dourado nas partes que exigiam maior solidez, apresentando chapas de cristal na parte da frente e dos lados, dando a possibilidade às relíquias, envoltas em estofos, de serem vistas (resultou da bula de beatificação de D. Mafalda, de 27 de junho de 1792, tendo sido inaugurada a 15 de julho de 1793, com a trasladação solene das cinzas da rainha); tem uma forma retangular, alargando-se para cima, e a sua tampa tem uma composição de aletas que se unem sob uma coroa real; o trabalho de prata é muito requintado. Os altares são decorados em talha dourada, com esculturas de santos em madeira policromada. A igreja tem uma grande riqueza em esculturas, de figuras ou baixos-relevos, quer em pedra quer em madeira, encontrando-se algumas delas no Museu de Arouca.
O Côro, mais baixo e mais estreito, embora mais comprido, está dividido em duas partes: a parte superior tem janelas e nichos, sendo decorada com esculturas femininas, em tamanho natural, executadas em calcário de Coimbra pelo escultor Jacinto Vieira, de Braga, em 1725. A parte inferior do Côro tem um cadeiral sumptuoso, em boa talha, com duas filas sobrepostas, sobre as quais se encontra um emolduramento em talha dourada a rodear telas do séc. XVIII, representando cenas sacras (vida e morte da beata Mafalda, vida de Cristo e da Virgem, assim como de santos), de oficinas portuenses, do séc. XVIII; o cadeiral é datado de 1725.
Ao nível da tribuna encontra-se um imponente órgão, da mesma época, decorado com diversas figuras de monges (barrocas); o órgão é todo dourado, com exceção da base, a qual é pintada a marmoreados, apresentando dois medalhões de bustos clássicos e, ao centro, a data de 1743. O órgão é composto por um varandim e pelo alto espaldar da tubagem, esta repartida em panos verticais por pilastras, sobrepostas por lambrequins e sanefas; a rematar encontra-se o escudo de Portugal e o de Cister-Alcobaça, além de uma pequena figura da Fama. O varandim encontra-se dividido em panos vazados e ornados e ao lado do teclado estão retângulos pintados de motivos chineses; sobre o teclado está a imagem de Santa Cecília a tocar.
O retábulo da capela-mor é em talha dourada joanina, igualmente do séc. XVIII. Foram recolhidas do espólio do mosteiro pinturas que formam um conjunto raro em coleções provinciais, do séc. XV ao séc. XVIII.
O mosteiro tem poucos azulejos, limitando-se ao conjunto do Capítulo e aos ornamentais das escadas e da capela-mor; no entanto, conservam-se restos de revestimento do edifício anterior aproveitados nas duas salas superiores à sacristia, que formam o pavimento, do tipo tapete, de Lisboa e do séc. XVII.
A Sala do Capítulo é revestida por um grande conjunto de azulejos da segunda metade do séc. XVIII, de Coimbra, semelhantes aos da Universidade, com caçadas, paisagens e jogos. Cada alizar é dividido em setores pelo desenho de pilastras, sobrepostas dum vaso de tipo concheado, assimétrico e com motivos florais.
O mosteiro é, igualmente, rico em mobiliário: mesas, cadeiras (abaciais, de aparato, faldistório), tamboretes, entre outros tipos de peças.
No séc. XVIII, o mosteiro mandou executar uma grande quantidade de castiçais, meios tocheiros e altos tocheiros. A sul, e a fechar o Pátio dos Comuns, está situado o denominado "corredor de Mafra", nome que se deve ao facto de ter sido construído por artistas que estiveram a trabalhar no Convento de Mafra. O Claustro foi iniciado em 1791 e terminado no séc. XX, compondo-se de duas ordens sobrepostas, com pilastras dóricas na inferior e jónicas na superior, em estilo neoclássico e apresentando em cada galeria cinco arcos. No centro do jardim encontra-se um fontenário, composto por um tanque circular, dentro do qual está um outro quadrilobado; a urna, no meio, tem uma forma esférica, com caneluras, saindo dela quatro bicas de água. Um patamar circular rodeia-a, com resguardo de bancos. Neste local encontra-se o grande refeitório, o qual está ligado a uma espaçosa cozinha, na qual existe uma mesa executada numa só pedra. A Sala de Capítulo tem uma abóbada rebaixada, duas janelas amplas no topo e é revestida a azulejos de fabrico coimbrão.
A sua classificação engloba o túmulo de Santa Mafalda.
Túmulo da Rainha Santa Mafalda
Esta rainha faleceu a 1 de maio de 1256, em Arouca, tendo sido sepultada primeiro num túmulo de madeira para ser, mais tarde, trasladada para um túmulo de pedra, o qual se encontra por baixo do altar. O seu túmulo atual é em madeira preciosa, intensamente ornada a bronze e prata, destacando-se a coroa real e as armas de Portugal e Castela, tendo sido mandado executar pelas freiras.
A trasladação do corpo para este último túmulo deu-se a 15 de junho de 1793, assistindo à cerimónia D. João António Binet Pincia, Bispo de Lamego, após a sua beatificação por Bula Papal de 24-06-1792. O seu entalhador foi José Francisco de Paiva, do Porto, e o aplicador de pratas foi António Faria Soares.
Órgão Monumental
A construção iniciou-se em Lisboa em 1739 e foi assente no Côro em 1743. Compreende 1352 vozes e 24 registos (trombeta de batalha, trombeta real, baixos imitando o mar agitado, registo de bombo, registo de vozes de canários, registo de vozes de ecos, flauta, clarinetes, flautins, trompas, etc.).
O órgão é inteiramente dourado, exceto na sua base, pintada em marmoreados.
Este órgão encontra-se integrado na 3ª fase do estilo joanino. A caixa foi executada por Manuel Bento Gomes, um artista que viveu no Mosteiro de Alcobaça.
Encerra às Segundas
Idem - O Mosteiro de Arouca, in "Occidente", Lisboa, 1883, nºs 174, 177, 178, 179; p. 240; p. 264; 1884, nºs 181, 183 a 187; 1886, pp. 59, 92.
Idem - Rápida notícia acerca do Convento de Arouca, Porto, 1888.
COELHO, Maria Helena da Cruz - O Mosteiro de Arouca do séc. X ao séc. XIII, Coimbra, 1988.
DIAS, Pedro - As pinturas quatrocentistas do museu de Arouca, Viseu, 1982.
Idem - Mosteiro de Arouca, Coimbra, 1980.
FERNANDES, Armando de Almeida - Arouca na idade pré-nacional, in "Arquivo do Distrito de Aveiro", 117 a 128, Aveiro, pág. 1964 a 1966.
GOMES, Marques - Mosteiro de Arouca. Com fot. de Marques Abreu, in "A Arte", 5º ano, 1909.
GUSMÃO, Adriano de - Seis novos Painéis de Diogo Teixeira identificados em Arouca, in "Diário de Notícias", Secção Artes e Letras, Lisboa, 30-11-1954.
JOAQUIM, Manuel - O colectário de Arouca e os seus textos musicais, in "Douro Litoral", Porto, 1957.
LOPES, Flávio (coord.), Património Classificado - Arquitectónico e Arqueológico - inventário, vol. I, Lisboa, IPPAR, 1993.
SIMÕES JÚNIOR, Manuel Rodrigues - Arouca. Subsídios para a sua monografia, in "Cancioneiro de Arouca" pelo maestro Vergílio Pereira, Porto, 1959.
Idem - Couto de Arouca. Freguesia do Salvador, in "Arquivo do Distrito de Aveiro", 1939.
Idem - Mestres entalhadores que trabalharam no mosteiro de Arouca, in "O Tripeiro", VI série, ano III, Porto, 1963.
Idem - Mosteiro de Arouca, Porto, 1960.
Idem - Mosteiro de Arouca. Privilégios da Abadessa, in "Arquivo Distrital de Aveiro", 1961.
Idem - Trasladação da Rainha Santa Mafalda, in "Arquivo Distrital de Aveiro", 1942.
SMITH, Robert C. - Uma cela de Santo Ambrósio setecentista do museu de Arouca, in "Museu", 2º ano, nº 6, Porto, 1963.
VITERBO, Sousa - Diccionario historico e documental dos architectos, engenheiros, construtores portugueses, Vol. I, Lisboa, 1899.
VITORINO, Pedro - O tesouro artístico de Arouca, in "Illustração Moderna", com fot. de Marques Abreu, 7º ano, Porto, 1932.