Personalidades
Ofélia Diogo Costa
Filha do extraordinário pedagogo João Diogo, que marcou uma época na renovação do ensino no nosso País, Ofélia Diogo Costa aliava a uma sensibilidade artística rara, um espírito de ação notável.
Ofélia Diogo Costa viveu num ambiente invulgar que lhe possibilitou o desenvolvimento de variadíssimas aptidões e uma forte personalidade.
Discípula de M.me Rodrigues de Freitas e D. Atília Cunha muito nova estudou literatura alemã e francesa, muito especialmente a sua poesia, que tão bem se coadunava com o seu temperamento lírico. Dedicou-se também à pintura, sendo aluna dos mestres Artur Loureiro e António Carneiro.
Só mais tarde, se consagraria à arte, na qual, segundo a sua opinião, se reuniam todas as outras — o «Lied».
Um dos seus mais justificados orgulhos era ter sido a primeira senhora portuense e portuguesa a apresentar-se num recital totalmente dedicado a esse género de canto.
Num desejo de aperfeiçoamento, trabalhou em Paris com a famosa cantora francesa Croiza, tendo atuado naquela cidade com grande êxito.
Com condições naturais excecionais - uma presença insinuante uma bela voz e uma inteligência que a tornava uma intérprete rara, apresentou-se, inúmeras vezes, ao público portuense e lisboeta.
Citaremos, entre outras, algumas das suas atuações no Porto; nas comemorações do centenário de Beethoven, no concerto comemorativo do 1.° centenário da Faculdade de Medicina, numa série de conferências sobre Música Moderna Francesa do Prof. Paul Guinard, que a considerou «a intérprete ideal da melodia francesa», no 69.° aniversário da Biblioteca do Ateneu Comercial do Porto, na excelente série intitulada «A Música de Canto através dos tempos» por ela organizada e em que colaboraram os conferencistas Prof. Freitas Gonçalves, Francine Benoit, Vieira de Almeida, Artur Libório, Cronner de Vasconcelos, no concerto de homenagem, de sua iniciativa, ao compositor António Lima Fragoso. Em Lisboa, interpretou «Os Amores do Poeta» de Schumann na versão alemã e portuguesa do Dr. Vieira de Almeida e exemplificou várias conferências de Charles Oulmont.
Dedicou-se no Porto, ao ensino do canto tendo formado um grupo de alunas de apreciável mérito, que se apresentaram em várias audições.
Síntese do seu labor pedagógico realizou uma notável conferência exemplificada intitulada «Do Público - Do Intérprete - Da Lição».
Assumiu a direção da Delegação do Porto do Círculo de Cultura Musical, criada por sua irmã Maria Adelaide Diogo de Freitas Gonçalves e com invulgar espírito empreendedor consegue trazer ao Porto os maiores músicos da atualidade.
A apresentação de Richter, André Watts, Elisabeth Schwarkopf, Hermann Prey, Rostropovitch, Orquestra de Câmara de Stuttgart, Orquestra de Bamberg Royal Philharmonic Orchestra, ópera de Kent, Companhia do Royal Ballet com Margot Fontayn e Nureyev, são exemplos do alto nível artístico atingido por esta sociedade de concertos, sob a sua orientação.
Na presidência da Delegação do Porto da Juventude Musical Portuguesa com extraordinária visão, desenvolveu notabilíssima ação de descentralização, conseguindo que as atividades musicais se estendessem a uma vasta região do Norte do Pais, criando agências na Póvoa de Varzim, Vila Nova de Famalicão, Braga, Viana do Castelo, Vila Nova de Gaia, Santo Tirso, Trofa, Vila Real e Vila do Conde.
Dispensou ainda particular carinho à divulgação do ensino de educação musical infantil, continuando a obra iniciada por sua irmã Maria do Céu Diogo, e procurou os meios mais diversos, e sempre inovadores de dar a conhecer e atrair os mais jovens para a bela arte dos sons.
Pertenceu também à direção da Camarata Portucalense, associação de características muito próprias, fundada por Guilhermina Suggia, a que imprimiu maior dinamismo.
A Fundação Calouste Gulbenkian encontrou em Ofélia Diogo Costa e no seu grande desejo do desenvolvimento musical da cidade do Porto, uma excecional colaboradora na apresentação de inúmeras e importantes manifestações musicais integradas nos seus 13 Festivais.
Ofélia Diogo Costa deu-se inteiramente, generosamente, gratuitamente, ao grande ideal da sua vida, que foi, sem dúvida a Música.
Deixaríamos, porém, muito incompleto o seu perfil, senão referíssemos a sua notável ação humanitária na Póvoa de Varzim, com vista a melhorar as condições de vida dos pescadores, coadjuvando a ação de seu marido, quando capitão do porto, naquela cidade. Dinamizando um grupo de senhoras organizou formas de apoio aos mais necessitados. Saliente-se a iniciativa de pedir versos sobre os poveiros aos maiores poetas portugueses - António Correa d’Oliveira, José Régio, Afonso Lopes Vieira, Teixeira de Pascoais, etc., que se encontram reunidos num pequeno opúsculo dedicado «Aos Poveirinhos do Mar».
Dando-se, esquecendo-se sempre de si, pretendeu o melhor para os mais desprotegidos, com a maior compreensão, a maior bondade e o maior interesse.
Senhora e artista em toda a extensão destas palavras, a par da sua vida artística soube criar um ambiente de eleição no seu lar.
Ofélia Diogo Costa era agraciada pelo Governo francês com o grau de Chevalier de «L’Ordre des Arts et des Lettres».
Círculo de Cultura Musical, Porto