Teatro
Teatro ABC
O último teatro construído no Parque Mayer
O Teatro ABC foi a última sala de espetáculos inaugurada no Parque Mayer: e, no que se refere ao espetáculo propriamente teatral, terá sido a primeira a ser encerrada. Vocacionado para a revista, que na prática e salvo eventuais iniciativas esporádicas, foi a expressão dramática lá dominante, o ABC estreou como teatro em janeiro de 1956, e durou até 1997. Desde a origem fazia-se notar o carater algo provisório do edifício, fundado pelo empresário José Miguel e instalado em áreas antes ocupadas por outras expressões de espetáculo e/ou de serviço público: restaurantes, ringue de patinagem, cinema ao ar livre.
Em 1955 José Miguel era um nome determinante do espetáculo de revista. Procedeu à adaptação do espaço, privilegiado pela localização, em recinto repetimos, vocacionado para o espetáculo.
De acordo com o levantamento exaustivo de Jorge Trigo e Luciano Reis, o Teatro ABC alternou esporadicamente a revista com espetáculos de teatro infanto-juvenil, tal como dizemos hoje: e o carater esporádico dessas iniciativas dispersas não desmerece da qualidade de elencos e da exigência dos autores envolvidos: entre autores e atores, surgem nomes como Eduardo Damas, Rui de Carvalho, Francisco Nicholson, Canto e Castro, Luís Cerqueira, Maria Clara Machado, Curado Ribeiro e até o francês Labiche, traduzido por César de Oliveira… isto, em elencos que no total excedem centenas de artistas, muitos deles de primeiríssimo plano artístico e profissional.
Porque a revista, foi sempre relevante, e o teatro infanto-juvenil, era-o já também, na época, e muito o foi nos anos seguintes: basta lembrar o Teatro do Gerifalto de António Manuel Couto Viana.
Ora, é de salientar que o Parque Mayer, independentemente da heterogeneidade de expressões cénicas e musicais que lá se produziam, e que temos aqui evocado nesta série de artigos, ainda constituía à época, e aliás não era novidade, o grande centro de produção de revista no país.
Só que, como temos aqui visto, os outros teatros do Parque Mayer – Capitólio, Maria Vitória, Variedades - ao longo de dezenas de anos, iam alternando, é certo que uns mais do que outros, o género de espetáculo dominante: nesse aspeto, aliás, o mais heterogéneo será o Capitólio, durante dezenas de anos vocacionado quase exclusivamente para o cinema: e mesmo assim, como já tenho recordado, lá se instalou por exemplo a companhia brasileira de Maria Della Costa e Sandro Polónio, que estreou Brecht, ou a Empresa Rey-Colaço – Robles Monteiro na época marcada pelos sucessivos incêndios dos Teatro D. Maria II e do Avenida…
Em qualquer caso, o Teatro ABC foi sobretudo um teatro de revista. Fundado e primeiramente dirigido pelo empresário José Miguel, e a partir de 1971 dirigido por Sérgio de Azevedo, produziu, escreveram Jorge Trigo e Luciano Reis, um total de 47 revistas, o que é assinalável, tendo em conta que as revistas ficavam meses em cartaz. (cfr. Jorge Trigo e Luciano Reis “Parque Mayer” vol. 2 ed. Sete Caminhos págs. 127 e segs.)
A primeira revista foi “Haja Saúde” da autoria de José Galhardo, Carlos Lopes e Frederico de Brito, com Curado Ribeiro no primeiro papel. Seguiram-se, como já referimos, mais 46 revistas, intercalando com os espetáculos infantis e outros espetáculos diversificados: mas efetivamente, o Teatro ABC foi predominantemente um teatro de revista.
Fazemos aqui uma transcrição da “História do Teatro de Revista em Portugal” de Luis Francisco Rebello que evoca valores notáveis das sucessivas temporadas da ABC (vol. 2 – Publicações D. Quixote - 1985):
“Num dos primeiros dias de janeiro de 1956 inaugurava-se, ao lado do Maria Vitória, o quarto teatro do Parque Mayer, o ABC – construído no mesmo local onde haviam funcionado o Alhambra e o Pavilhão Português”. Refere que “à semelhança da sala, a companhia era modesta”. Mas refere que foi sobretudo na revelação de novas personalidades que em empresário José Miguel e o seu sucessor Sérgio de Azevedo apostaram”. E cita nomes que realmente hoje fazem parte da história do espetáculo em Portugal: por exemplo Hermínia Silva, Raul Solnado, António Silva, Humberto Medeira, Manuel Santos Carvalho, Ivone Silva irene Cruz, Henriqueta Maia, José Viana, Aida Batista, Camilo de Oliveira, e tantos mais. E mais refere que “1972 foi um ano fausto para a revista portuguesa” e “foi o ABC, uma vez mais, o palco dessa aventura que se iniciou com «É o Fim da Macacada» segunda revista montada pelo novo e ativo empresário do Teatro mais recente do parque Mayer, Sérgio de Azevedo (ob. cit.págs 131 e 142).
Ora bem: em 1990, o Teatro ABC arde! Carlos Santos toma conta dos trabalhos de reconstrução, e o ABC reabre em 1993. Mas em 1977 fecha definitivamente.
E hoje, nem o edifício resta!
Duarte Ivo Cruz