Teatro
O Teatro Joaquim de Almeida
A Sala e o Ator
Merece destaque esta convergência, pois representa em si mesma como que a homenagem bem merecida à tradição de arte e de espetáculo teatral, numa área urbana que, por esta via, muito se valorizou no aspeto cultural. No entanto, é legítimo perguntar até que ponto a magnificência arquitetónica do Teatro Joaquim de Almeida do Montijo e a sua atividade constante, conduzem à memória do grande ator da transição dos séculos XIX/XX que dá o nome ao Teatro e a outras salas que o antecederam.
Com efeito, Joaquim de Almeida (1838-1921), nascido no Montijo, onde hoje se situa o Cinema Teatro que o invoca, deu nome a pelo menos três salas de espetáculo, e isto desde 1911. Escrevendo em 1908, Sousa Bastos já lhe elogia o prestígio e a versatilidade de forma que desde logo alude à ligação do nome a salas de Teatro: “Trabalhava hoje em D. Maria, amanhã no Rato; agora no Trindade, logo no Coliseu, duma vez no Ginásio, doutra na Rua dos Condes, e assim percorrendo todos os teatros de Lisboa, Porto, províncias, ilhas e Brasil (…) e sempre brilhantemente” (“Diccionário do Theatro Português” 1908).
Ora, vale a pena então referir que houve Teatro(s) Joaquim de Almeida em Lisboa, este situado no largo do Rato e demolido em 1930, mas sobretudo no Montijo, onde um recinto de madeira mais ou menos improvisado mas já denominado Teatro Joaquim de Almeida em 1911, deu lugar, em 1957, ao Cinema Teatro Joaquim de Almeida, projeto original do arquiteto Sérgio Gomes “com excelentes esculturas em friso de José Farinha e Martins Correia, representando as quatro artes do espetáculo e ainda, o Talento”, tal como noutro lado escrevi a propósito desta sala de espetáculos. (cfr. “De Volta aos Teatros” Livraria Civilização Ed., 2008, pag.149)
E acrescente-se que no mesmo dia 20 de Outubro de 1957,foi também inaugurado o Mercado Central do Montijo, projeto do arquiteto Paulo Cunha. Assinale-se uma certa convergência arquitetónica e urbanística entre estes dois grandes edifícios. Ambos apresentam uma fachada em pilastras, com um remate de varanda no Mercado e de uma cobertura que no Cinema, protege o acesso e completa-se na fachada lateral em curva.
Tal como escrevi no texto acima citado, “O Cinema Teatro correspondeu a uma definição urbana de certa transição na expansão da cidade. E revelou também uma mudança de hábitos do espetáculo. Foi construído no local da antiga Praça de Touros, na cerca e jardim de um convento. Mas a traça é bem característica de certo modernismo que perdurou até tarde”.
Ou, como escreveu José de Matos Cruz, “caracterizando-se como um belo exemplar da arquitetura civil do gosto modernista, este imóvel apresenta, a par da sua grandiosidade, uma fachada de linhas sóbrias, constituindo uma peça fundamental do património arquitetónico e cultural do Montijo” (in “Cinema e Teatro Joaquim de Almeida – Montijo e o Cinema” – Publicações D. Quixote e CM Montijo -2001 pag.27).
Em qualquer caso, importa referir que o Cinema Teatro Joaquim de Almeida inscreve-se também no seu historial, na própria evolução e significado do espetáculo teatral e cinematográfico, desde a época da inauguração. Quem o inaugurou foi a Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro: nisso integra-se bem na cronologia cultural/teatral. Mas rapidamente passa a concentrar-se no cinema. E nesse aspeto, a sala correspondia às exigências habituais naquele tempo: desde logo a lotação exagerada (1220 lugares), a separação em plateia, dois balcões e uma geral (terceiro balcão como então se dizia), um pequeno palco e um avantajado foyer, como também se dizia.
Netas condições, não é de estranhar que o Cinema Joaquim de Almeida tenha perdido a designação de Teatro e tenha encerrado em 1991. Em boa hora, porém, a Camara Municipal do Montijo adquire-o em 1999, e reinaugura-o em 2005, devidamente restaurado no exterior e reconstruído no interior. Desaparece o terceiro balcão, reduz-se a lotação a metade, alarga-se o palco.
E recupera-se a zona de circulação do público, agora valorizada por atividades de cultura e convívio: livraria, café-concerto, sala de música, galeria de exposições, espaço de conferências.
Duarte Ivo Cruz