Teatro
Teatro das Laranjeiras (Teatro Thalia)
O Teatro que o Conde de Farrobo instalou junto do Palácio das Laranjeiras, hoje edifico oficial ligado pelos jardins ao Jardim Zoológico de Lisboa, surge referido na literatura especializada como Teatro Thalia ou Teatro das Laranjeiras. Em qualquer caso, o que realmente interessa é que o velho teatro, inaugurado em 1825, modificado em 1842 sob a traça de Francisco Lodi e destruído, em 9 de setembro de 1862 por um incêndio, que só poupou a fachada de belo estilo clássico, é reconstruido e restaurado em 2012, segundo projeto de arquitetura de Gonçalo Byrne e Barbas Lopes, o qual manteve as reminiscências do projeto inicial, designadamente a formidável fachada, devidamente restaurada.
O conjunto polivalente servirá de apoio a todas as espécies de espetáculo. E repare-se numa curiosa cronologia: o Teatro começa a ser construído cerca de 1820; é inaugurado em 1825; arde em 1862; renasce em 2012 exatos 150 anos depois. E o resultado é um edifício eclético, com o mérito da modernidade conciliada com o restauro da fachada e a conservação do que restou do teatro primitivo do Conde de Farrobo.
O Palácio das Laranjeiras, hoje edifício oficial, foi habitado pelo Conde de Farrobo, e posteriormente pelo Conde de Burnay, que iniciou a instalação, na quinta anexa, do Jardim Zoológico. Nele se realizaram nos anos 20 do século passado os bailados da Condessa de Castelo Melhor a que esteve ligado Almada Negreiros. O Conde de Farrobo, Joaquim Pedro Quintela, herdou do pai o titulo de barão de Quintela, depois “promovido” a Conde de Farrobo. Mas já o pai surge envolvido na edificação do Teatro de São Carlos, inaugurado em 1793. O filho seguiu-lhe as pisadas, como veremos adiante.
Morreu arruinado em 24 de setembro de 1869. E pode ter contribuído para essa decadência, ou foi símbolo dela, o incêndio do Teatro, ocorrido em 9 de setembro de 1862, exatos 42 anos após o inicio das obras do teatro. Eduardo de Noronha conta que nessa madrugada fatídica, foram acordar o Conde, então a residir no chamado Palácio Quintela, na Rua do Alecrim. Perguntou se havia mortes ou danos pessoais e, tranquilizado a esse respeito, despediu quem o informava e continuou a dormir… ou pelo menos a fingir que dormia! E já estava semiarruinado.
O teatro foi inaugurado com uma ópera hoje esquecida, “II Castello de Spiriti” de Mercadante, compositor e maestro então responsável pelas temporadas de ópera que Farrobo durante décadas organizou, e em não poucas participou, como executante - foi aluno de Domingos Bomtempo em composição e tocava contrabaixo - ou como cantor, acompanhado por vezes no canto pela própria Condessa. Tal como noutro lado recordo, como mero exemplo da vida cultural e mundana de Farrobo no seu teatro, as Memórias do Marechal francês Castellae, recebido nas Laranjeiras, referem enfaticamente “uma festa espaventosa, que seria por ele comparado às Tulherias do primeiro Império”.
De assinalar que o repertório tinha qualidade e certa modernidade para a época: Rossini, Donizetti, Auber. E os cantores eram do melhor que vinha a Lisboa.
Refira-se aliás que Farrobo foi episódico diretor do Conservatório. O pai, já vimos, surge elencado entre os fundadores do Teatro de São Carlos. E o Conde esteve envolvido na gestão do São Carlos e surge também ligado a Garrett e a Passos Manoel na criação do que viria a ser, em 1846, o Teatro de D. Maria II.
Ana Isabel P. T. de Vasconcelos evoca aliás a presença frequente de Passos no Palácio e no Teatro das Laranjeiras, e recorda a colaboração dos cenógrafos Rambois e Cinatti, do melhor que havia na época a nível europeu. Cita Francisco Cancio, que descreve com pormenor uma receção a D. Maria II e remete ainda para Fialho de Almeida.
E finalmente, refere-se aqui também Raul Proença, que evoca “um grandioso teatro para 360 espetadores, com salão de baile revestido de espelhos e, desde 1830, iluminado a gás, o que era grande novidade para o tempo”…
Veremos o que vai fazer-se, em matéria de arte e cultura, no novo Teatro Thalia das Laranjeiras.
DUARTE IVO CRUZ
Raul Proença - "Guia de Portugal - Lisboa e Arredores" - 1924;
Eduardo de Noronha - "O Conde de Farrobo - Memórias da sua Vida e do seu Tempo" - 1945;
Francisco Câncio - "Lisboa no Tempo do Passeio Público" - 1962;
Ana Isabel P. Teixeira de Vasconcelos - "O Teatro em Lisboa no Tempo de Almeida Garrett" - 2003;
Duarte Ivo Cruz - "História do Teatro Português" - 2001 e "Teatros de Portugal" - 2005;
Sandra Leandro e Fernando Mota de Matos - "Palácio Quintela ou Farrobo/Teatro Tália/ Jardins", in "Portugal Património" vol. VI - 2006: - "Reconversão do Teatro Thalia" - in "Revista ARQA" - janeiro/fevereiro 2012