Teatro
ANTIGO MERCADO DE LEIRIA E OS TEATROS DOS KORRODI
Encontramos, ao longo dos últimos 150 anos, uma tipologia muito diversificada de património construído ou adaptado a espetáculos, desde o remanescente dos teatros do século XIX expressamente construídos – e restam algumas dezenas, aí incluindo São Carlos que, aliás, é de 1793 -, aos teatros adaptados de Igrejas, ainda bastante numerosos, aos edifícios de estilo art deco ou eclético na transição para o cinema, a que se seguiu a esplendorosa geração dos grandes cineteatros, até aos projetos de sala de espetáculo e centro cultural integrado, em boa hora implantados, cada vez mais por todo o País a partir dos anos 90 até hoje.
E simultaneamente, temos a recuperação ou reconstrução criteriosa de todas estas tipologias, em projetos mais ou menos conciliatórios da traça arquitetónica original com as exigências da tecnologia do espetáculo – e isto, em todos os “modelos” que acima se referiram: e quase todos de iniciativa municipal.
Mas deixamos fora deste enunciado, que iremos aqui percorrendo, o caso interessante dos edifícios de raiz e matriz industrial ou comercial, e dos mercados, adaptados a salas de espetáculo, ou reconvertidos em centros culturais com teatros neles integrados. Por vezes coexistindo em boa harmonia arquitetónica e sociocultural com galerias de arte, bibliotecas, museus, centros de informática, centros de documentação, cibercafés, restaurantes, áreas de lazer…
Funcionam em rede, com uma pluralidade de expressões e eventos culturais simultâneos. Iremos vendo casos exemplares dessa valorização de património.
Um exemplo notável dessa reconversão encontramo-lo integrado no antigo Mercado Municipal de Leiria, projetado em 1921, mas só inaugurado 10 anos depois, segundo a traça do arquiteto suíço Ernesto Korrodi, o qual se fixou em Portugal em 1889. A partir de 1897, os seus projetos espalham-se por todo o País, mas é em Leiria que concentra a principal atividade, com edifícios de habitação mas sobretudo com grandes projetos de obra pública e de restauro, a começar pelo próprio Castelo que, na forma hoje visitável, não pouco lhe deve.
No que respeita a teatros, deve-se a Ernesto Korrodi e, também, em projetos autónomos ou em parceria, ao seu filho Camilo Korrodi, Teatros e Cine-Teatros na Nazaré, Pombal, Castelo de Vide e Alcobaça, alguns deles ainda funcionais, como a seu tempo se verá. E em todos, surge, aplicada à arquitetura de espetáculo, um gosto eclético exuberante próximo da arte decorativa, na profusão de arcos, colunas, pilastras, painéis, na harmonização das fachadas, na implantação de torreões, nos elementos escultóricos e pictóricos.
O Mercado Municipal funcionou até aos anos 90. Korrodi ergue-o sobre os vestígios do antigo Convento de Santa Ana, datado de 1498, e não foge, antes pelo contrário, a certo revivalismo conventual deste grande edifício construído em torno de um espaço aberto, evocativo de claustro. A fachada desdobra-se em dois andares com frontão armoriado e dois imponentes torreões.
Neste conjunto inscreve-se o pequeno mas muito moderno Teatro Miguel Franco, homenagem justa a um dramaturgo de cidade. A sala, toda em plateia de 213 lugares, abre-se diretamente para uma rua lateral de excelente na centralidade urbana. O envolvimento de madeiras valoriza o vermelho tradicional da plateia.
Lucília Verdelho da Costa, “Ernesto Korrodi – 1889 – 1944 – Arquitectura, Ensino e Restauro do património”, Ed. Estampa, 1997;
Pedro ferreira Mendes, “Ernesto Korrodi – O Suíço que Mudou Leiria”, in “Arquitectura e Construção”, Fevereiro/Março 2009;
Duarte Ivo Cruz, “De Volta aos Teatros”, Liv Civilização ed., 2008; Maria Genoveva Moreira Oliveira”, “Rota de Arquitectura Korrodi”