Teatro
TIVOLI E OUTROS TEATROS DE RAUL LINO
Em Portugal, existe, ao longo do século passado, uma certa “especialização” arquitectónica vocacionada para teatros e salas de espectáculo: sobretudo a partir de Ventura Terra ou de Moura Coutinho de Almeida de Eça, e mais tarde, de Marques da Silva, Norte Júnior, Raul Rodrigues de Lima, Cassiano Branco, Cristino da Silva, Cotineli Telmo, Ernesto e Camilo Korrodi, até aos nossos dias, em exemplos que iremos referindo. É aliás uma tradição que surge nas dezenas de salas erguidas ou adaptadas na sequencia do D. Maria II. A seu tempo o veremos.
Mas importa agora evocar, a partir do Tivoli, os Teatros e Cine-Teatros que Raul Lino desenhou ou adaptou. Desapareceu, em Lisboa, o Cinemas Palácio, inaugurado em 1930 com o nome insólito de Trianon: ficou a imagem e a memória de uma fachada ainda muito marcada por sugestões de arte decorativa, com entrada em vãos e cinco janelões com elementos de ferro. Mas interessa-nos agora evocar a memória e a imagem do interior, na medida em que a disposição do balcão e de frisas e a decoração do tecto faz lembrar claramente o Tivoli, este felizmente conservado e em plena actividade. O proscénio, por seu lado, era enquadrado por uma algo insólita decoração floral.
O Tivoli, grande projecto de Raul Lino, que aliás o dirigiu durante anos na exploração cinematográfica, o que mostra a vastidão e interesses e a heterogeneidade cultural do arquitecto, constitui de facto um grande modelo de sala de espectáculos, que resistiu às adaptações e não perdeu, nem época, nem modernidade.
Foi inaugurado em 1924 como cinema: mas desde logo, tanto Lino como o proprietário, Lima Mayer, previram e equiparam a sala para espectáculos de música e teatro, inclusive com um pequeno fosso de orquestra. O palco e o proscénio foram reformulados em 1951 para adaptação ao cinemascópio: e “A Túnica” esteve meses em cartaz. Mas manteve-se a estrutura da sala em tom castanho claro, com os dois balcões, as frisas e os camarotes, a cúpula marcante na arquitectura da cidade, a entrada em círculo menos funcional, o imponente foyer onde, em 1925 António Ferro lançou a experiência “modernista” do seu Teatro Novo…
Mas sobretudo, a formidável tradição cultural do Tivoli, das “terças-feiras clássicas” com o melhor cinema, dos concertos, dos espectáculos de teatro, nacional e estrangeiro, da ópera de câmara e da melhor selecção cinematográfica – e tudo isto dura até hoje.
É uma sala “afrancesada”? Num belo texto alusivo, Raul Lino refere “a vincada predilecção do proprietário pelo clássico estilo francês”. E acrescenta: “eu tinha empenho em ser agradável ao meu bom amigo, mas ao mesmo tempo era grande a vontade de fazer alguma coisa de original na decoração interna pelo menos, e cheguei a propor uma decoração que principalmente consistia em uns ramalhetes de estilo moderno, e cores muito vivas, que ornavam os balcões, contrastando com a finura clara e neutra do conjunto. Mas não convenci o meu bom amigo”…
Nos dias de espectáculo: das 13h00 até ao inicio do mesmo
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Sousa Bastos, “Diccionário do Theatro Português”, Lisboa 1908; M. Félix Ribeiro “Os mais antigos Cinemas de Lisboa”. Ed.IPC-Cinemateca Nacional, 1978; Eduardo Kol de Carvalho “Sopa de Pedra – Trilhos do património Português – Ed. Tágide 2006; Raul Lino, escritos diversos in Catálogo da Exposição Retrospectiva da sua Obra, FCG, 1970. Duarte Ivo Cruz, “Teatros de Portugal” Ed., INAPA 2005 e “Teatros em Portugal – Espaços e Arquitectura”, Ed. Mediastexto e Centro Nacional de Cultura, 2008.