Contos e Lendas de Arouca
• Contos
As narrativas dos contos tradicionais reflectem a construção e a permanência de sistemas de interpretação do mundo, que se foram acumulando com o tempo. No Concelho existem alguns contos narrados por pessoas idosas tais como: os baptizados da raposa; a raposa e os malhadores; o rei e os três empregados; as perdizes; a velha e a cabaça, etc.
Eis o conto da raposa e os malhadores.
A Raposa e os Malhadores
A Raposa é sempre muito manhosa e convidou o lobo para ir a uma malha. Era uma malha de centeio; nas malhas existe sempre uma boda, para comer e beber.
Lá estiveram a espiar, a espiar, eles andavam lá todos na eira, a malhar o centeio.
Quando a raposa viu que o comer estava mais ou menos pronto, chamou:
-Ó compadre! Olha, tu agora vais para a eira e vais disfarçar lá os malhadores que andam a malhar, enquanto que eu vou a casa, à cozinha, roubar alguma coisa para a gente comer.
-Está bem.
O desgraçado foi lá para a eira e eles malharam-no todo com pancada.
Enquanto a raposa foi a casa:
-Fujam todos! Olha o lobo! Olha o lobo!
Foi tudo para a eira. A raposa ficou à vontade em casa. Comeu, comeu até ficar satisfeita. Tapou com um folhado de erva na testa e, pronto, foi-se embora a fazer que já não podia com a barriga, a fazer que estava muito doente:
-Ai Jesus Senhor! Apanhei muita porrada!
E o lobo era assim:
-Ai, comadre! Pois eu vou todo partidinho…Eu é que vou mesmo a morrer!
E ela era assim:
-Eu é que vou a morrer! Então, já me saem os miolos aqui pela testa fora! Eu é que vou mesmo a morrer! Tens que me levar as costas!
E o lobo era assim:
-Então!? Eu vou todo partidinho! Como é que eu te vou levar às costas?
-Ai! Tens que me levar, porque eu não posso caminhar!
Pronto, e o lobo lá botou a raposa às costas e ela, depois, com a barriga cheia e ainda a cavalo do lobo, era assim:
-Rão, rão, o doente leva o são! Rão, rão, o doente leva o são!
• Lendas
As lendas do concelho resumem-se em: o milagre que fez Nossa Senhora da Mó; as laranjas do Burgo; as pegas nas lendas de Santa Mafalda; a lenda de Soror Rosimunda Abadessa do Mosteiro de Arouca; a lenda do lobisomem; a lenda do Rego do Boi.
Lenda da Rainha Santa Mafalda
Em 1217, deu entrada no Mosteiro de Arouca a rainha D. Mafalda, filha de D. Sancho I de Portugal, que acabava de se separar do rei Henrique I de Castela, uma vez anulado o casamento que os deveria unir. Na verdade, a filha do segundo monarca português tinha uma educação religiosa muito profunda, o que a conduzia ao gosto pela vida contemplativa e penitente. Só as suas obrigações de princesa a levaram a um casamento que não se terá consumado. Porém, não só a anulação do consórcio como a morte do noivo fizeram que ela regressasse a Portugal.
Em 1224, por determinação da rainha, graças a uma bula do papa Honório III expedida de Latrão, a instituição arouquense passava para a Ordem de Cister, facultando-lhe ela aumento de instalações e largos rendimentos que permitiram a independência daquela comunidade de bernardas. Recorde-se que este mosteiro havia sido fundado em 716 por Luderico e Vandilo, filhos de um fidalgo de Moldes. Nessa altura, era de Ordem de São Bento. Mas o que agora nos importa é o tempo em que D. Mafalda, já com aura de santidade, procedeu à reforma do mosteiro. Nunca ela foi abadessa, embora pertencesse à sua família a primeira fidalga que ocupou tal cargo, Ora, tanto quanto reza a tradição arouquense, Santa Mafalda terá falecido em Rio Tinto, estando o dia historicamente registado como o 1° de Maio 1256 e, tanto quanto lendariamente se sabe, ela terá deixado uma disposição pela qual o ataúde que levasse o seu corpo seria colocado em cima de uma burrinha e esta posta a andar quando a burrinha parasse, aí lhe seda dada a sua derradeira morada.
Conforme o estabelecido, o caixão de Santa Mafalda foi a carga da uma burrinha que logo encetou a marcha. Passou por Alpendurada, por Castelo de Paiva e pelo lugar de Santo António, na freguesia de Santa Eulália, já no concelho de Arouca. Ao longo desse itinerário, foram mais tarde colocados marcos comemorativos. E a burrinha apenas parou junto da porta principal do Mosteiro de Arouca, ai aguardando que lhe retirassem a carga. E quando isso aconteceu, o animal caiu para o lado, morto de cansaço. Então, as freiras inumarão o corpo da que se tornara padroeira de Arouca no chão da igreja e enterraram o cadáver da burrinha no átrio sobranceiro a entrada principal do mosteiro. No entanto, o testamento da finada dispunha que as suas exéquias fossem como as das rainhas de Espanha, com coroa e ceptro reais. Mas isso era tão caro que não foi cumprido. Bem, e em 1617 perante o bispo de Lamego, foi aberto o túmulo, estando o cadáver incorrupto.
Diz uma lenda que, quando Santa Mafalda foi para Arouca, a acompanhou um ruidoso bando de pegas. Irritada pela maneira como elas assinalavam a sua passagem, a rainha excomungou-as e proibiu-as de aparecerem no vale de Arouca!