Maria Carrilho (1943-2022)

A morte de Maria Carrilho deixa mais pobre a comunidade dos estudos internacionais.

Maria Carrilho era uma europeísta convicta e uma defensora dos direitos humanos. Foi membra da direção do Instituto de Estudos Estratégicos e Internacionais. Da colaboração com o IEEI ficam textos importantes sobre a normalização das relações político-militares e sobre a exigência da coerência europeia em defesa dos direitos humanos.

Hoje queria lembrar a mulher livre e generosa, que foi a primeira a afirmar-se numa área, os estudos da defesa, que era até ela domínio quase exclusivo de homens.

Citação

“Poderá dizer-se que a finalidade da ajuda aos refugiados se encontra cumprida ao assistir as pessoas e contribuir para as salvar numa situação de emergência? Sim, quando ao fim de semanas ou de poucos meses a situação se normaliza e as pessoas podem regressar. No entanto, infelizmente não é sempre este o caso.

Acontece que as crises se prolongam e que ao fim de alguns meses, terminada a vigência das linhas de ajuda, aqueles a quem ajudamos a sobreviver se encontram sem meios para subsistir.

Com efeito, as ajudas internacionais têm vindo a concentrar-se nas situações de emergência por motivos que pouco têm a ver com razões humanitárias, e muito com a mediatização que privilegia esses momentos de impacto, de tragédia, oferecendo mais oportunidades de reconhecimento público. (Garanto que esta observação é menos cínica do que parece).”

Artigos

Questões emergentes da crise do Golfo (1991)
O tema da nova arquitetura de defesa europeia adquiriu ainda maior premência à luz da guerra no Golfo e do agravamento da instabilidade na União Soviética. Tornou-se evidente que a questão da defesa é fulcral para qualquer projeto de união europeia ou, se não de união, pelo menos de conjugação ou concertação europeia com vista a uma política externa com algum peso significativo. Por outro lado, depois de um curto período promissor, o aumento da conflitualidade internacional obriga a um questionamento sobre os conteúdos das próprias políticas de defesa, implicando também um renovado esforço de reflexão e de investigação no plano teórico. Sem pretender delimitar a discussão, o presente artigo foca-se em dois aspetos fundamentais: o primeiro diz respeito à relação que as atuais sociedades tecnologicamente avançadas estabelecem com o instrumento militar e a guerra; e o segundo tem a ver com o armamento, a sua produção e controlo.

Os Conflitos nos Balcãs e a Redefinição das Missões Internacionais (1999)
A questão do Kosovo e da Guerra do Iraque irá marcar não só a história dos conflitos armados no Pós-Guerra Fria como toda a reflexão sobre a intervenção internacional, com projeção para o séc. XXI. Um dos aspetos da ordem internacional mais investido pela nova realidade é o da capacidade de gestão das Nações Unidas de situações de conflitualidade violenta – e, por conseguinte, o papel das alianças e estruturas militares, e do peacekeeping. Este artigo procura, assim, contextualizar as missões de escopo mundial no plano das estratégias e doutrinas militares predominantes nos EUA e na Europa e, resumidamente, referir a participação portuguesa em missões das Nações Unidas, assim como alguns aspetos das perceções dos militares relativas à legitimação de tais missões.

Gente desenraizada: a vida depois da sobrevivência (2001)
Há cerca de 35 milhões de pessoas desenraizadas por todo o mundo, numa fase em que, à exceção da UE, os doadores estão menos generosos. As causas são várias, sendo uma das principais os conflitos violentos, tendo-se tornado este num dos grandes problemas que a humanidade enfrenta. Quanto à ajuda, a mesma não pode limitar-se, como se verifica com frequência, às situações de emergência. E se a situação não normalizar num curto espaço de tempo, o que acontece aos desenraizados? O que acontece aos que não estão deslocados, mas cujas condições continuam insuportáveis? Há uma “zona cinzenta” entre a ajuda de emergência e a de ajuda ao desenvolvimento não resolvida. Há um novo regulamento, mais abrangente, destinado aos desenraizados da Ásia e América Latina ao qual é preciso dar continuidade.

Índia/Paquistão – contenção dos riscos? (2003)
Partindo das declarações do primeiro-ministro indiano, Atal Vajpayee, de uma iniciativa a desanuviar as tensões com o Paquistão, o presente artigo debruça-se sobre o escopo tanto regional como internacional que o conflito das identidades, religiões, da soberania e, até, da integridade dos estados, possui e de que forma um acordo entre estes dois países poderia fruir. É, neste sentido, concluído que a solução para a complicada questão de Cachemira não pode ser uma condição prévia para avanços e acordos noutras áreas, que vão desde o domínio económico ao da diplomacia ou ao da cultura e constituem elementos para a criação de uma “base de confiança”.

Da consolidação tutelada ao predomínio civil democrático (2005)
O presente artigo faz um levantamento sobre a presença forças armadas na democracia portuguesa sobretudo após o 25 de Abril, em especial nos cargos de Presidente da Républica, e de que forma um presidente da República de carreira militar pode ou não influenciar a política de defesa.