Conferências
Uma alegoria da Arte Contemporânea - Conferência por José Bragança de Miranda
Paradoxalmente uma crise difusa atravessa a ideia de arte contemporânea, enquanto as obras de arte se multiplicam e disseminam. Num momento de viragem, em 1970, Adorno afirma que “se tornou manifesto que tudo o que diz respeito à arte deixou de ser evidente, tanto em si mesma como na sua relação com o todo, e até mesmo o seu direito à existência”.

29 Mar 2025 | 15h30
Esta conferência insere-se no ciclo de conferências Outros Espaços, que é uma parceria entre o Centro Cultural e Belém e a Escola de Comunicação, Arquitectura, Artes e Tecnologias da Informação (ECATI) e o Centro de Investigação em Comunicação Aplicada, Cultura e Novas Tecnologias (CICANT) da Universidade Lusófona-Centro Universitário de Lisboa.
O objetivo desta parceria é ligar a produção académica e científica com a comunidade, proporcionando a possibilidade de transmissão de conhecimento ao mesmo tempo que se mostra como um espaço de diálogo plural. A ação que cada instituição leva a cabo contempla a possibilidade de sinergias temáticas, que vão desde as artes visuais, o cinema, as artes cénicas e as artes sonoras, a comunicação e a cultura, a arquitectura e os novos dispositivos digitais.
Estas conferências anuais terão lugar no Centro Cultural de Belém uma vez por mês, Sábado, 15:30h no auditório do MAC/CCB e com uma programação que se estende entre Março e Dezembro.
A arte do século XXI…? Outros espaços: Margens criativas.
O fazer criativo do homem consiste, também, em criar uma dimensão que não pertence ao regime do natural, da cognição, do conhecimento, mas sim da imaginação e das novas formas de redesenhar os objectos, ainda que às primeiras dimensões possa ainda estar ligada; a arte, porque age a partir do real, e sobre ele, é construtora e configuradora do real, já que o organiza, reorganizando os seus objectos em torno de leis que não existem na natureza, mas só e sim na própria pulsão criativa do homem; porque só a arte tem o poder de «transformar as coisas em signos nunca vistos» (Carl Einstein). Compreende-se esta caracterização porque para Einstein se tratava sempre, e principalmente, de se afastar do seu tempo, de criar distâncias para poder pensar, de um querer ir mais além da época histórica, procurando a simultaneidade temporal das formas de ver que a história até então tinha produzido, «o dever», diz em A arte do século XX, de «transformar a actividade e a percepção humanas». Para Einstein tudo se jogava nas formas de afecção da visualidade e da organização das imagens, antecipando muito das fracturas que, no mesmo século, vieram a produzir-se e que ainda hoje subsistem. É essa forma de reorganização da visão que recolhe dentro de si o conceito do alucinatório, um elemento que para ele pertence à arte enquanto instrumento que permite recriar novas formas de ver, não um meio ou instrumento que dá a ver formas, que projecta ideias ou sensações, mas sim que provoca modificações do olhar e, ao fazê-lo, produz novos modos de ver, de recriar a própria realidade. Por isso, para este, a arte é sempre, também, da ordem do político. O uso do conceito de alucinatório remete, em Einstein, para processos psíquicos complexos que ligam condições subjectivas e condições objectivas, processos psíquicos e fenómenos perceptivos, fenómenos sociais, também. Quando o alucinatório se produz, ocorrem para este processos de reacções entre o psiquismo e o fenómeno biológico, produzindo-se dessas reacções o trans-visual, um conceito que vai mais além da simples definição da arte como algo estanque, completamente definido. Entre estas possibilidades, queremos pensar, um século depois, a situação da arte no século XXI e para tal, não só Carl Einstein nos interpela, também vem a jogo a conhecida afirmação, vezes sem conta repetida na última centúria, de Samuel Beckett num título muito afim ao que propomos: «É o fim que é o pior, depois o meio, depois o fim, no fim é o fim que é o pior» (L'Innommable, 1958).