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Teatro

Jorge Patego ou o marido humilhado

«Qual a questão desta peça? A impossibilidade de harmonizar o desejo de festa “libertino” de Angélica, próprio de um feminismo emergente em que a mulher já pensa o direito ao seu corpo, com o modelo de casamento que Patego tem na cabeça: obedecer e dar filhos, neste caso com estatuto nobilitado.» Assim se refere Fernando Mora Ramos a “Jorge Patego ou o marido humilhado”, de Molière, texto que conhece bem.

10 Jul a 14 Jul 2024

Largo do Hospital Termal
Caldas da Rainha
Preço
Entrada livre
Foi com ele que se estreou na encenação, em julho de 1979, e a ele regressa agora com uma nova tradução de Isabel Lopes. Estreia agendada para o próximo dia 10 de Julho, no Largo do Hospital Termal, numa produção com o apoio do Município das Caldas da Rainha. Espetáculo ao ar livre, com entrada gratuita, sempre às 21h30.

Jorge Patego, camponês rico, casa com Angélica, filha de aristocratas rurais falidos, tendo em vista ascender socialmente. Pretende filhos fidalgos. Ao descobrir que Angélica anda enamorada por Clitandro, visconde com presença nos mais nobres salões da aristocracia francesa, Patego tenta provar junto dos sogros, o Senhor e a Senhora de Vilar de Tolos, a infidelidade conjugal de que é vítima. Os pais negam que a filha possa fazer algo tão desonroso, é descendente da mais nobre linhagem. Com o apoio de Claudina, a empregada, Angélica consegue habilmente escapar a todas as tentativas de prova levadas a cabo por Patego, que acaba só e humilhado.

Apresentada pela primeira vez na Versalhes de Luís XIV, a 18 de julho de 1668, “George Dandin ou le Mari confondu” gerou controvérsia. Ainda que os cortesãos observassem em Patego uma personagem hilariante, o texto suscitou protestos ao longo dos séculos. Padres, escritores, críticos, opunham-se a que uma mulher infiel pudesse escapar à justiça do marido traído e ciumento.

Outros viram nesta comédia um tratado acerca da democracia, simpatizando tanto com o camponês maltratado pela aristocracia como com as reivindicações feministas de Angélica. Os próprios nomes das personagens são altamente irónicos, evocando traços de carácter desenhados por um génio do teatro que nada tinha de ingénuo.

Para Fernando Mora Ramos «neste “Jorge Patego” a dimensão cómica assenta na cisão identitária do protagonista: entre o estatuto querido e a impossibilidade de lhe aceder por via da “fazenda” — o que constata já depois de casado, a esposa não é a que comprou, a norma dela não é a dele.» E acrescenta: «”Jorge Patego” é uma comédia negra. Se a peça é sobre o lavrador rico, a riqueza não lhe traz a nobreza, ao negócio não correspondem os comportamentos da esposa que lhe é “infiel”, fiel que é aos prazeres de jovem desejosa de flirtar com gente fina, vinda de fora.» Um casamento que condena à infelicidade tanto o marido traído como a mulher forçada a casar com quem não ama.

Nenhuma personagem sai ilesa da pena afiada de Molière, que também não é gentil com os aristocratas de Vilar de Tolos, a pequena nobreza decadente de um país onde eram já visíveis as raízes da contestação que veio, mais de um século depois, a dar em Revolução. De gente arruinada nas suas posições classistas, de gente mesquinha e tacanha, vaidosa, insensível, gente hipócrita e arrivista, é feito este “Jorge Patego ou o marido humilhado”. Só na aparência há vítimas entre gente que vive das aparências.

Com cenografia adaptada do cenário desenhado por José Serrão para a “Mandrágora”, de Niccolò Machiavelli, luz de Hâmbar de Sousa e desenho de som de Francisco Leal, “Jorge Patego ou o marido humilhado” conta com interpretação de Fábio Costa (Jorge Patego), Mafalda Taveira (Angélica), José Carlos Faria (Senhor Vilar de Tolos), Isabel Lopes (Senhora de Vilar de Tolos), Hâmbar de Sousa (Clitandro), Beatriz Antunes (Claudina), Nuno Miguens Machado (Manhoso) e Tiago Moreira (Perdigoto).

De 10 a 14 de julho, no Largo Rainha Dona Leonor, junto ao Hospital Termal, sempre às 21h30. Entrada livre por ordem de chegada.
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