Uma Peça | Um Museu
Santo Agostinho
Adquirido na década de 1880-90 pelo colecionador Henry Burnay no mercado antiquário de Paris, o Santo Agostinho é um dos painéis que originalmente constituíram o políptico pintado por Piero della Francesca para a igreja dos Eremitas de Santo Agostinho em Borgo Sansepolcro (Itália).
Uma peça do Museu Nacional de Arte Antiga.
Santo Agostinho
Piero della Francesca (c.1420-1490)
c.1465
Têmpera sobre madeira de choupo
Aquisição (leilão da Colecção Burnay), 1936
Inv. 1785 Pint
O retábulo teria ao centro uma representação da Virgem entronizada com o Menino (painel desaparecido) ladeada por quatro pinturas de idêntico formato hoje dispersas por vários museus: à esquerda, situava-se este Santo Agostinho e o S. Miguel da National Gallery, Londres; do lado direito, inscreviam-se o S. João Evangelista da Frick Collection, New York, e o S. Nicolau Tolentino do Museu Poldi Pezzoli, Milão. Segundo as propostas de reconstituição mais coerentes, o políptico apresentaria também uma predela composta por vários painéis de pequenas dimensões. Porém, desse elemento retabular apenas subsistem quatro pinturas: Crucificação, Santa Mónica e Santo Agostiniano, todas na Frick Collection, e Santa Apolónia, da National Gallery de Washington.
O Santo Agostinho é uma excecional demonstração da genialidade de Piero, seja pela profunda e solene monumentalidade da figura do Doutor da Igreja e pela extraordinária simplicidade da construção do espaço pictórico, seja pelo magistral virtuosismo de certos pormenores da composição, como a transparente estrutura da vara de cristal do báculo, signo da autoridade episcopal. Seja, ainda, pelos episódios bíblicos que decoram o sebasto do pluvial - uma sequência historiada que abarca a Infância e a Paixão de Cristo -, em que a execução pictural de cada uma das cenas se adapta ao movimento do tecido, sugerindo a natureza têxtil dessas imagens ao negar-lhes uma extrema e límpida definição ótica.No firmal da capa inscreve-se a Ressurreição e, vértice superior da própria figura, a mitra acolhe, por fim, uma imagem de Cristo Triunfante e Ressurreto. O paramento de Santo Agostinho constitui, assim, uma súmula doutrinal por imagens, uma espécie de compêndio aberto que faz de contraponto ao livro fechado que o santo enverga.
A moldura da obra, embora adotando um vocabulário classicista, não é original. Foi aplicada à pintura depois da sua incorporação no museu.