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Casa onde viveu a fadista Mísia torna-se espaço para artistas emergentes

Iniciativa da Kees Eijrond Foundation (KEF) e dos herdeiros da cantora falecida em julho mantém apartamento preservado e com residências artísticas, exibições e visitas guiadas.

Casa onde viveu Mísia em Lisboa © Reinaldo Rodrigues

As plantas bem cuidadas e os quadros, livros e demais referências artísticas da casa onde viveu a cantora Mísia (1959 - 1924) nas últimas décadas indicam que a fadista, falecida no passado mês de julho em Lisboa, pode regressar das compras a qualquer momento.

Em iniciativa liderada pela Kees Eijrond Foundation (KEF) e pelo amigo próximo e herdeiro de Mísia, Sebastian Filgueiras, o apartamento localizado na Baixa de Lisboa teve sua estrutura mantida para realizar um desejo antigo da fadista: manter o espaço vivo como ambiente de criação artística.

“A fundação adquiriu a casa da Mísia e decidiu transforma-la num espaço de criação artística com três vertentes: teremos residências com artistas de Lisboa, exibições de outros que estejam de passagem pela cidade e queiram apresentar o trabalho. Um outro desejo nosso é que a casa seja aberta ao público. A ideia é manter vivo o legado da Mísia”, anunciou Mirna Queiroz, Diretora Artística da KEF.

Segundo Mirna, a configuração da casa não sofreu nenhuma alteração, de forma a que o seu uso continue a ser residencial, algo “raro”, nas palavras da diretora, tendo em vista que a casa poderia entrar no mercado e ser comercializada. Embora a estrutura seja a mesma, Sebastian Filgueiras garantiu que alguns itens raros da fadista serão negociados ou doados a instituições.

“Há uma parte muito simbólica e representativa do mundo da Mísia, que foram seus vestidos de palco, joias, chapéus, penas, o seu xaile, tudo que se tornou característico da sua personagem e que ela convidava outros artistas a fazer serão leiloados. Haverá um leilão, possivelmente no início de novembro. Foi algo que surgiu a pedido de muitos fãs que queriam ficar com alguma recordação dela”, disse, indicando outras peças foram doadas a museus, fazendo a vontade da própria Mísia ainda em vida. Um vestido será entregue ao Museu do Fado e outros dois já estão na posse do MUDE - Museu do Design.

Para o amigo próximo da fadista, a decisão da KEF, que arcará com um orçamento anual para as residências e gestão da casa, é mais do que acertada: “A casa tem um potencial muito bom enquanto património artístico e histórico e a preservação do ambiente faz com que a personalidade de Mísia esteja lá. Ela era muito eclética e através dos livros de moda, cinema, fotografia e outras paixões que estão na casa, podemos descobrir um pouco de onde vinha a inspiração criativa para os fados dela”, completou Sebastian.

De momento, a casa de Mísia já conta com o primeiro residente, o americano-jamaicano radicado em Lisboa, David J. Amado. Artista da área da dança e performance, Amado transita entre a intelectualidade e o gueto queer no seu projeto baseado em poemas da língua portuguesa. Segundo Mirna, o artista está fascinado com o “micro-universo" de Mísia.

“Ele está mergulhado nos livros dela e mal consegue se concentrar no projeto”, brincou, antes de completar: “Acho muito interessante ver um artista de tão longe se mostrar tão conectado com aquele universo”.

As residências artísticas na casa de Mísia têm duração de duas semanas para os artistas que vivem em Portugal e uma semana para os que estão de passagem por Lisboa. Após a experiência de David J. Amato, os próximos dois artistas que terão a oportunidade de trabalhar no local serão o brasileiro Bruno Ribeiro e a portuguesa Francisca Neves.

Com base nos Países Baixos, a KEF, segundo Mirna, tem dentre suas missões promover o património cultural português. Antes deste projeto focado na memória de Mísia, a fundação já havia criado em parceria com a Fundação Calouste Gulbenkian o Salavisa European Dance Award, em homenagem ao bailarino e coreógrafo luso Jorge Salavisa (1939 - 2020).

Considerada inovadora no género do fado, a fadista Mísia faleceu a 27 de julho de 2024, após lutar contra um cancro.


por Nuno Tibiriçá in Diário de Notícias | 8 de outubro de 2024
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Diário de Notícias
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