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Fados de Coimbra encerra reedição dos álbuns que José Afonso gravou para a Orfeu

Chega agora às plataformas digitais e às lojas, em CD e vinil, o décimo primeiro e último álbum que José Afonso gravou para a Orfeu: Fados de Coimbra e Outras Canções.

Capas originais do EP Baladas de Coimbra (1962) e do LP que agora se reedita, Fados de Coimbra e Outras Canções (1981)

Completa-se este sexta-feira a reedição definitiva da obra de José Afonso gravada para a Orfeu: onze álbuns, desde 1968 até 1981. O que agora chega às plataformas digitais e às lojas é Fados de Coimbra e Outras Canções, de 1981 e onde José Afonso é acompanhado por Octávio Sérgio (guitarra) e Durval Moreirinhas (viola), tendo num dos temas (Vira de Coimbra) a participação de Janita Salomé (viola) e Júlio Pereira (cavaquinho). A capa é de José Santa-Bárbara.

Pedro Afonso, filho de José Afonso (1929-1987), recorda as origens do álbum que agora se reedita: “Este disco foi gravado em resposta a um pedido de pessoas ligadas à Orfeu. Lembro-me de terem ido lá a casa falar com o meu pai, precisamente para o desafiar a fazer um disco que revisitasse o repertório dos fados de Coimbra. Naquela altura começava a haver um certo revivalismo do fado de Coimbra, até porque estávamos no início dos anos 80, em profunda ressaca da ressaca [da revolução e do PREC], no país do FMI, etc. Ora o meu pai tinha feito aqueles três álbuns pós-25 de Abril [Com as Minhas Tamanquinhas, Enquanto Há Força e Fura Fura], todos eles refletindo as suas experiências e um certo pensamento crítico em relação ao país e ao mundo, e se calhar a Orfeu pode ter pensado que era altura de mudar de tom.”

José Afonso, segundo Pedro, ficou um bocado reticente, mas terá acabado por achar que fazia sentido. “O meu pai nunca renegou o seu percurso, as suas influências e o seu passado. E era uma forma de mostrar que não tinha pejo nem problemas nenhuns em assumir todas essas influências, que vêm por via familiar, sobretudo do seu tio (meu tio-avô) Filomeno, com quem ele viveu em mais de um período e que era uma pessoa que gostava muito de música e do fado de Coimbra. E há a sua vivência estudantil e pós-estudantil, na Tuna, no Orfeon Académico.”

José Afonso, que muito prezava o trabalho do poeta-cantor Edmundo Bettencourt (autor, aliás, de quatro letras das canções do disco), tinha ainda outro trunfo, diz Pedro: “Há uma questão profunda, que para mim é talvez a mais importante: mesmo dentro do fado de Coimbra, o meu pai não conseguiu deixar de inovar, indo beber ao que achava mais interessante, pela inovação. Uma posição anti-‘coimbrinha’, digamos assim. Também por isso, ele deve ter achado que valia a pena revisitar esse repertório, numa ponte com o cancioneiro mais popular.”

As novas masterizações, num processo supervisionado pela família do cantor, têm estado a ser feitas pelo engenheiro de som alemão Florian Siller, dos estúdios Soundgarden, em Hamburgo, que quis trabalhar álbum por álbum, de modo a poder dar um tratamento individual a cada disco, respeitando a forma como tinham sido originalmente gravados em cada ano. Nuno Saraiva, responsável pelo selo Mais 5, que tem assegurado estas edições, diz que este “não foi o disco mais fácil para o Florian masterizar. E tanto ele como o Pedro Afonso e eu tivemos de decidir uma coisa que tinha sido sempre óbvia nos dez discos anteriores: restaurar a qualidade e a dinâmica das gravações e preservar o intuito original. Porém, com este, tivemos de decidir se iríamos um bocadinho mais além disso, para reforçar alguns graves e dar a estes masters um corpo que sentimos que faltava. É, de certo modo, uma carta fora do baralho em relação aos outros dez, e fecha este ciclo editorial daquilo que a Mais 5 recuperou das edições da Orfeu.”

Reeditar tudo, “sem exceção”

Se Fados de Coimbra e Outras Canções fecha o ciclo Orfeu, não encerra a reedição integral da obra discográfica de José Afonso, ficando a faltar discos anteriores (vários EP e o LP Baladas e Canções, de 1964) e posteriores (Ao Vivo no Coliseu, 1983; Como se Fora Seu Filho, 1983; e Galinhas do Mato, 1985). Sobre isto, Pedro Afonso diz apenas que o processo “está em marcha”, sem datas nem sequências de edição: “A família está empenhada em editar toda a discografia de José Afonso, sem exceção. É um processo longo, exigente e que tem de ser feito com uma ambição de qualidade superior. Tem havido um grande rigor e não podemos baixar a fasquia.”

 

José Afonso DR

Iniciada em outubro 2021 com Cantares do Andarilho (1968), o primeiro álbum de José Afonso gravado para a Orfeu, a reedição prosseguiu nesse mesmo ano com Contos Velhos Rumos Novos (1969), em outubro, e Traz Outro Amigo Também (1970), em novembro. Em 2022 foram reeditados mais cinco álbuns: Cantigas do maio (1971), em abril; Eu Vou ser Como a Toupeira (1972), em maio; Venham Mais Cinco (1973), em junho; Coro dos Tribunais (1974) em setembro; e Com as Minhas Tamanquinhas (1976), em novembro. E em 2023, em maio, foram lançados mais dois, em simultâneo: Enquanto Há Força (1978), e Fura Fura (1979).

Nas plataformas digitais e em formato físico (CD e vinil, LP) a partir desta sexta-feira, o disco Fados de Coimbra e Outras Canções terá uma sessão pública de lançamento no dia 10 de Novembro, em Coimbra, no Café Santa Cruz, com convidados e transmissão radiofónica.


por Nuno Pacheco in Público | 19 de outubro de 2023
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público

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