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Eugénio de Andrade, poeta da "firmeza e exatidão da palavra"

Eugénio de Andrade é “uma das figuras mais relevantes no panorama artístico de Portugal”, pela “alta qualidade da escrita” e pela “firmeza e exatidão da palavra”, segundo Federico Bertolazzi, um dos organizadores das comemorações do centenário do escritor.

LUSA © EPA / Guilherme Venancio

Professor de literatura portuguesa da Universidade "Tor Vergata", de Roma, e um dos membros da Comissão Organizadora do Centenário do Nascimento de Eugénio de Andrade, que se assinala hoje, dia 19 de janeiro, Federico Bertolazzi disse à agência Lusa que "a importância" do autor de "Rente ao Dizer" se impõe, pela "alta qualidade da sua escrita, quer em poesia quer em prosa”.

E impõe-se também internacionalmente, com uma difusão da obra “constante”, como mostram “as mais recentes traduções, ‘Ostinato Rigore’ para italiano, de 2019, e ‘Os sulcos da sede’, para inglês, nos Estados Unidos, de 2022”.

No que respeita ao mercado editorial português, Federico Bertolazzi destaca a coleção da editora Assírio e Alvim, na qual a obra de Eugénio de Andrade tem sido publicada, considerando-a “de grande importância”, pois além de disponibilizar a obra do poeta, integra “cada livro com novas leituras críticas que compõem um retrato multifacetado à luz da reflexão de intérpretes que testemunham da atualidade constante desta obra”.

Questionada pela Lusa sobre eventuais publicações de Eugénio de Andrade no âmbito do centenário, a editora esclareceu que “tudo o que existia está publicado e disponível”.

“O que faltava – a Prosa – foi editado no ano passado”, acrescentou.

Descrevendo a linguagem literária de Eugénio de Andrade, Federico Bertolazzi afirma que o poeta “fala em termos ao mesmo tempo claros e profundos da realidade em que o homem contemporâneo muitas vezes se desencontra”.

“A firmeza e a exatidão da sua palavra são a nossa riqueza”, defendeu o também diretor científico da Cátedra Agustina Bessa-Luís na mesma universidade, considerando que “qualquer atividade que contribua para o conhecimento e para a difusão da obra de Eugénio de Andrade é fundamental”.

Foi nesse contexto que se constituiu uma comissão responsável por promover iniciativas que celebrem dignamente o centenário do nascimento do poeta e que contam com uma forte presença no Porto.

Hoje, inaugura-se uma exposição de arte contemporânea em homenagem a Eugénio de Andrade na Cooperativa Árvore, e, pelas 21:00, terá lugar na Casa da Música um concerto dedicado ao poeta, dois eventos que contam com o apoio da Câmara Municipal do Porto, descreveu.

Outra iniciativa organizada pela comissão é um Congresso internacional sobre Eugénio de Andrade, que decorrerá nos dias 11, 12 e 13 de outubro na Fundação Calouste Gulbenkian e na Biblioteca Nacional de Portugal, em Lisboa, disse o responsável.

Estão previstas ainda três conferências, no Porto, em datas a definir, e um colóquio internacional, em colaboração com a Associazione italiana di studi portoghesi e brasiliani (AISPEB).

A programação completa pode ser consultada em centenarioeugeniodeandrade.pt.

Eugénio de Andrade, pseudónimo de José Fontinhas, nasceu em 1923, no Fundão, e morreu no Porto em 2005, aos 82 anos.

Aos dez anos mudou-se para Lisboa, devido à separação dos pais, e três anos depois escreveu os seus primeiros poemas.

Em 1938, aos 15 anos, enviou alguns desses poemas a António Botto que, gostando do que leu, o quis conhecer, encorajando-lhe a veia literária.

Em 1943 mudou-se para Coimbra, cidade onde conviveu com Miguel Torga e Eduardo Lourenço.

Tornou-se funcionário público em 1947, atividade que exerceu durante 35 anos, tendo sido transferido em 1950 para o Porto, onde fixou residência durante mais de quatro décadas, até se mudar para o edifício da extinta Fundação Eugénio de Andrade, na Foz do Douro.

Ao longo da vida fez diversas viagens e foi convidado a participar em vários eventos, tendo travado amizades com personalidades da cultura portuguesa e estrangeira, como Joel Serrão, Carlos Oliveira, Eduardo Lourenço, Joaquim Namorado, Sophia de Mello Breyner Andresen, Agustina Bessa-Luís, Teixeira de Pascoaes, Vitorino Nemésio, Jorge de Sena, Mário Cesariny, Ángel Crespo, Marguerite Yourcenar, Herberto Helder e Óscar Lopes, entre outros.

Apesar do seu prestígio nacional e internacional, Eugénio de Andrade sempre viveu distanciado da vida social, literária ou mundana, tendo o próprio justificado as suas raras aparições públicas com “essa debilidade do coração que é a amizade”.

A sua extensa produção literária granjeou-lhe vários prémios e distinções, entre os quais o Premio Camões, em 2001, mas também o Prémio da Associação Internacional de Críticos Literários (1986), o Prémio D. Dinis da Fundação Casa de Mateus (1988) e o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores (1989).

Em 2017, a Assírio e Alvim publicou uma obra que reúne toda a poesia de Eugénio de Andrade, a partir da última edição revista em vida pelo autor e com prefácio de José Tolentino Mendonça.

Além de vasta obra poética, Eugénio de Andrade publicou alguns livros em prosa, designadamente “Os afluentes do silêncio”, “História de égua branca”, com ilustrações de Manuela Bacelar, “Rosto precário” e “À sombra da memória”.

Fez também traduções de Federico García Lorca, de Iannis Ritsos, das “Cartas Portuguesas (atribuídas a Mariana Alcoforado)” e de “Poemas e fragmentos de Safo”.

Eugénio de Andrade encontra-se sepultado no Cemitério do Prado do Repouso, no Porto, tendo a sua campa sido desenhada pelo arquiteto e seu amigo Siza Vieira, incluindo a inscrição dos versos do seu livro “As Mãos e os Frutos”.

 


Fonte: Lusa | 19 de janeiro de 2023

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