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Com arranjos sofisiticados e abordando a vivência da mulher imigrante na Europa, Dandara Modesto lança o álbum Estrangeira

O segundo álbum da artista brasileira radicada em Zurique começou a ser desenvolvido há seis anos e chega ao público com potência através de um olhar decolonial questionador, mas sem perder a sensibilidade e a poesia.


No dia 2 de dezembro, a cantora, compositora, intérprete, performer e produtora musical Dandara Modesto apresenta para o público o segundo álbum de sua carreira, Estrangeira, através do selo Musicardiaca. Com arranjos sofisticados, potência e sensualidade, ao longo das seis faixas, a artista brasileira radicada em Zurique (Suíça) discorre sobre o corpo feminino não branco em trânsito pela Europa e as consequências da interação e autopercepção através dessas outras culturas.

A jornada de construção e desenvolvimento da obra começou há seis anos, quando Modesto foi a Munique (Alemanha) fazer uma residência artística e começou a ter consciência sobre como o seu corpo não branco era percebido em território europeu. “A viagem a Munique foi a primeira experiência de deslocamento que eu tive consciência e também foram ali os primeiros momentos que eu entendi que havia conflito de códigos e normas, que meu corpo significava algo que eu não conseguia entender, que meu corpo era entendido de uma maneira que eu não entendia como era entendido. E gerava reações violentas”, explica Dandara“E aí se inicia o processo de pesquisa artística a partir desse estranhamento, de ser esse corpo estranho. Entender esses símbolos todos, que vêm a partir de fenótipos de códigos físicos meus, que geram uma outra perceção da minha identidade que eu não tinha. Somado à ideia de me deslocar do meu local de origem, de me tornar imigrante e olhar para esse meu lugar de fora, e me conectar ainda mais com as minhas raízes, com aquilo que forma a minha identidade e que vem do Brasil”.

A artista define o som como pop alternativo porque traz muitos elementos e filtros, com camadas eletrônicas. “Eu acho que esse álbum tem algo de pesadinho, ele não é muito leve e o som é meio esquisitão assim. Estrangeira tem uma coisa meio deslocada no tempo-espaço”, conceitua. Com presença de sopros, percussão, acordeon e baixo acústico, os arranjos são refinados e potencializam a voz doce, forte e lúbrica de Dandara.

“Estrangeira”, a faixa título, abre o álbum sem pedir licença com um samba moderno. Em seguida, “Caixa Preta'', voluptuosa canção com participação de Duda Brack. Com uma pegada rock’n’roll, “Hello” vem em seguida. Escrita há 8 anos, em ocasião da construção da hidrelétrica de Belo Monte, “Altanamira” ainda é atual e faz um ode aos povos originários do Brasil. Em “Para um Amor em Paris”, single previamente apresentado para o público, Dandara rejeita o lugar de mulher imigrante dos trópicos sexualizada, embora ainda haja desejo na relação. Fechando Estrangeira, “Grafite” resume o tema do álbum ao falar sobre a construção da identidade a partir do olhar do outro.

OUÇA ESTRANGEIRA AQUI

FAIXA A FAIXA POR DANDARA MODESTO

1. Estrangeira
A canção título que sintetiza a obra. “Minha voz é toda bagagem. Sem bandeiras pra carregar, estrangeira em qualquer lugar” há uma certa contradição aqui, que eu adoro, porque na voz carrego as raízes que me conectam com o que sou e de onde vim. Na produção tem um samba duro meio ‘femme-jamesbondeano’ que liga a zona norte de São Paulo com Zurique.

2. Caixa Preta
Gostosinha que traz a potência e o mistério que habita o corpo. Em um feat. delicioso com a maravilhosa Duda Brack. O arranjo de sopros de Andrew Moraes traz uma elegância lânguida. 

3. Hello
É uma canção cutucada de auto-reflexão e responsabilidade. Um convite pra se olhar por dentro e se ver naquilo que precisamos mudar, naquilo que apontamos nos outros, na nossa hipocrisia incoerente. Uma rockalhada. 

4. Altanamira
Uma canção que reverencia os povos indígenas originários do Brasil, trazendo o conflito da construção da hidrelétrica de Belo Monte como mote. Escrita há 8 anos, infelizmente ainda é muito atual. O trocadilho “Altanamira” expõe a violência que povos indígenas estão expostos em seus territórios. Máximo respeito e visibilidade aos Kayapó, Xipaya, Kuruaya, Juruna, Xikrin do Cateté, Trincheira-Bacajá. No álbum essa canção reverbera lugares de origem, de território e de luta pela existência. 

5. Para um Amor em Paris
Ela trata sobre a objetificação desse corpo feminino não-branco e a sua sexualização e o uso do entendimento desse corpo sempre a partir do ponto tropical (‘mon amour/ como um drink vermelho e tropical/ mon amour/ me entrego de bandeja…’). Na última parte da música, quando muda o arranjo e as coisas ficam mais tensas, é um certo rebelar-se desse corpo que cansa de ser objeto e chega até em uma explosão quase violenta. Quero viver outra coisa, mas ao mesmo tempo ‘ne me quitte pas’, não me esqueça, estou aqui. E, no fim, essa é a relação de uma pessoa que está lidando com todos esses elementos complexos e pesados, mas que tenta uma conexão, apesar desse rompante. É uma canção de amor, apesar de tudo. Mas um amor tronxo. Eu diria que é mais uma ‘canção de paixão’. 

6. Grafite
Uma canção que orbita a obra. Uma conversa de si consigo mesma, um exercício de alcance daquilo que se deseja ser e nunca se é. O eu, a construção da identidade/indivíduo como essa busca infinita. Uma canção de (des)amor ao ego e às transformações do eu. A outrificação do eu.

FICHA TÉCNICA
Produção: Paulo Monarco, exceto “Grafite”,  produzida por Raul Misturada, e “Para um amor em Paris”, produzida por Bianca Godoi e Dandara Modesto.

Estrangeira
Composição: Bruno Batista, Dandara Modesto, Paulo Monarco
Voz: Dandara Modesto
Bateria e percussões: Jota Erre
Baixo: Serginho Carvalho
Guitarra: Paulo Monarco
Trompetes: Nahor Gomes
Clarinete: Andrew Moraes

Caixa Preta
Composição: Dandara Modesto, Bruno Batista, Paulo Monarco, Demetrius Lulo
Voz: Dandara Modesto
Voz: Duda Brack
Guitarra: Paulo Monarco
Bateria: Ricardo de Pina
Baixo acústico: Marcelo Maia
Percussão: Sergio Pato
Arranjo de sopros e flauta: Andrew Moraes
Trombone: Alaécio Martins
Trompete: Fábio Cerqueira 

Hello
Composição: Guigga, Marcos Marinho
Voz: Dandara Modesto
Guitarra: Paulo Monarco
Guitarra: Mauricio Caruso
Baixo: Fabio Sameshima
Bateria: Jota Erre

Altanamira
Composição: Rafa Barreto
Voz: Dandara Modesto
Guitarra: Paulo Monarco
Baixo: Fabio Sameshima
Bateria: Jota Erre 

Para um amor em Paris
Composição: Bruno Batista
Voz: Dandara Modesto
Acordeon: Anatole Munster
Baixo: Ricardo Dias Gomes
Guitarra: Paulo Monarco
MPC: Juninho Ibituruna
Percussões: Jota Erre 

Grafite
Composição: Celso Viáfora
Voz: Dandara Modesto
Piano: Alejandro Vargas
Efeitos: Raul Misturada 

SOBRE DANDARA MODESTO
Dandara Modesto é artista do palco: cantora, intérprete, performer e produtora musical brasileira radicada em Zurique/Suíça. Poética, potente e tropical, reflete na sua voz uma música brasileira contemporânea com raízes na tradição da canção brasileira e dos ritmos afro-brasileiros populares. Celebrada e respeitada no meio musical, colaborou com vários projetos transdisciplinares de música, dança, teatro, artes visuais e performance no Brasil e na Europa. Já se apresentou em grandes palcos do mundo como o Auditório Ibirapuera (BR), a Blackbox Gasteig (DE) e o Moods (CH). O seu álbum de estreia, Dois Tempos de Um Lugar, em parceria com Paulo Monarco, foi lançado em 2016. No seu mais recente álbum Estrangeira (2022), Dandara canta sobre o corpo feminino em trânsito, migração, o poder da alteridade e a ancestralidade.

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