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Lídia Jorge recebe Prémio Crónica e Dispersos Literários APE/CML
Lídia Jorge recebeu a 15 de maio o Grande Prémio de Crónica e Dispersos Literários Associação Portuguesa de Escritores/Câmara Municipal de Loulé que este ano distinguiu a obra “Em Todos Sentidos”.
Numa cerimónia que decorreu na Sala da Assembleia Municipal de Loulé, no encerramento do programa comemorativo da Semana do Município de Loulé, foi com comoção que a escritora, natural de Boliqueime, veio ao concelho que a viu nascer para ser distinguida por mais um trabalho que figura na sua vasta obra, reconhecida nacional e internacionalmente: “Não é explicável a emoção que sinto por receber, neste momento e nesta cidade, este prémio!”.
“Em Todos os Sentidos” nasceu do convite lançado à autora pelo diretor da Antena 2, João Almeida, para escrever crónicas, pessoais e não demasiadamente ligadas a acontecimentos, que pudessem ser lidas pela própria nesta rádio pública. Durante o ano de 2019, semanalmente, Lídia Jorge deu voz aos textos, num ambiente criado também pelo som do trompete de Chet Baker em “Almost Blue”. Em 2020, ano em que “O Dia dos Prodígios” assinalava o seu 40º aniversário, preferiu a autora que “em vez de uma edição de capa rica dessa obra, se fizesse antes um livro novo de capa pobre”. E é assim que surge “Em Todos os Sentidos”, com essas 41 crónicas radiofónicas transpostas para o papel, reunidas nesta obra premiada.
Com explicou Carina Infante do Carmo, que ao lado José Carlos Seabra Pereira e José Moutinho integrou o júri do prémio, nesta obra Lídia Jorge “teoriza a forma da crónica a partir da sua experiência de contista”. Aqui temos “a fragmentariedade precária da escrita cronista e a mão segura que escreve e conduz com argúcia o pensamento a um lugar iluminado”.
Crónica, um género muitas vezes considerado menor pela sua brevidade e hibridez, elementos aos quais a própria autora faz uma alusão nesta obra: “Pelo que a crónica não constitui um género, é apenas uma espécie de homenagem ao deus que faz escorregar os grãos de areia, mirando-nos de soslaio. Como não podemos vencer o Tempo, escrevemos textos que o desafiam a que chamamos crónicas”. Um género que, segundo a premiada, ao lado do conto e do poema, “são hoje os modelos literários que melhor se inserem no fluxo da comunicação do nosso presente e, por isso, as formas que mais facilmente se popularizam entre os leitores”.
São várias as temáticas abordadas nestas páginas, “a força do Positivismo do início deste século, do horizonte sem limites da astrofísica, o poder avassalador do universo digital, a ecologia, sobretudo quando disforme, o animalismo quando caricato, a arte da política quando defende o sagrado egoísmo das nações e o nacionalismo que se transforma em vicio redutor”. Temas como “tribalismo, racismo e a necessidade de um novo feminismo” estão também presentes.
E se é o mundo, os lugares por onde viajou e as pessoas que foi encontrando que aqui estão, a sua terra natal e as suas gentes também fazem parte de “Em Todos os Sentidos”.
“É um livro que tem muito da zona, que projeta muito aquilo que é a paisagem, os problemas da própria terra, mas sobretudo o meu amor pela terra”, frisou Lídia Jorge. As paisagens algarvias, as memórias de alguns hábitos do passado, Loulé e a vida noturna dos seus jovens, “com os seus sonhos e fugas imaginárias” ou personagens como Maria Inácia, uma defensora inabalável do órgão da Igreja de Boliqueime, transportam o leitor para as raízes da escritora.
Refira-se que Lídia Jorge passa agora a integrar a lista de consagrados escritores que já conquistaram o Grande Prémio de Crónica e Dispersos Literários Associação Portuguesa de Escritores/Câmara Municipal de Loulé, entre os quais estão José Tolentino Mendonça, com “Que coisa são as nuvens”, em 2016, Rui Cardoso Martins, com “Levante-se o Réu”, em 2017, Mário Cláudio, com “A Alma Vagueante”, em 2018, Pedro Mexia, com “Lá Fora”, em 2019, e Mário de Carvalho, com “O que eu ouvi na barrica das maçãs”, em 2020.
Um prémio que tem crescido e que, como realçou o presidente da Associação Portuguesa de Escritores, José Manuel Mendes, “consolidou o prestígio junto de todos aqueles que constituem o arquipélago das letras”. “Desde a primeira hora em que ele nasceu, que se afirmou como preenchendo um lugar fundamental. E de então para cá tem vindo a comprovar-se a todos os níveis a sua importância. Há um maior número de livros de crónicas a saírem, há autores de livros de crónicas que veem, de edição para edição, os seus livros a chegar às mãos dos leitores”, disse.
Uma opinião partilhada pelo parceiro neste projeto, o autarca Vítor Aleixo, que realçou o facto de o prestígio dos vencedores deste galardão ter contribuído também para elevar o nome do concelho.
A política de apoio ao livro e à literatura tem estado na agenda do Município de Loulé, através de uma série de ações que Vítor Aleixo enunciou nesta sessão: a publicação e apoio à edição de mais de uma centena de livros nos últimos sete anos e que figuraram recentemente numa exposição na Biblioteca Municipal; a publicação do “Cancioneiro Popular do Concelho de Loulé”, que dá voz aos poetas populares; a celebração do Dia da Língua Portuguesa com o lançamento de uma antologia poética compilada pelo escritor António Carlos Cortez; a publicação da obra poética não editada de Casimiro de Brito; a reedição da revista “Prisma de Cristal” (em fac-simile), aquele que foi um suplemento do jornal “A Voz de Loulé” e um marco do movimento da poesia contemporânea.
O autarca deixou ainda palavras de agradecimento à vencedora do prémio pelo papel que tem tido ao elevar a sua terra: “Mulher implicada, com um pensamento claro e acutilante sobre o nosso tempo, uma humanista, uma livre pensadora, uma pessoa que nos inspira a ser melhores e nos coloca a pensar e a refletir sobre o que fazemos, como fazemos e para que fazemos. Pelo que é e porque com a sua ação literária tem levado o nome de Loulé ao mundo, sendo conhecida e reconhecida pela sua escrita, colocando, assim, Loulé no mapa do berço dos grandes escritores mundiais”.