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Joaquim Romero de Magalhães é agora o patrono do Arquivo Municipal de Loulé

Historiador, investigador, professor universitário, bibliografo, devoto à família e orgulhoso das suas raízes, Joaquim Romero Magalhães faria no passado domingo, 18 de abril, 79 anos.


Para assinalar a data e homenagear este louletano falecido em 2018, personalidade que tanto contribuiu para o conhecimento da cultura e história local, a Câmara Municipal de Loulé promoveu nesse mesmo dia a cerimónia de atribuição do seu nome ao Arquivo Municipal de Loulé.

O emblemático espaço que guarda importante documentação da memória coletiva, de grande relevância para o estudo da História de Loulé, do Algarve e de Portugal, com destaque para mais antigas Atas de Vereação conhecidas do país (1384), classificadas como Tesouro Nacional, irá agora ostentar o nome de um dos principais impulsionadores deste espaço e das atividades a ele ligadas, como a Revista Al-Ulya. Com um forte contributo para a divulgação e estudo da documentação histórica aqui existente ao longo de toda a sua vida, foi pioneiro ao frequentar este Arquivo durante o período em que desenvolveu a sua tese de licenciatura, defendida em 1967 na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, e editada em 1970: “Estudo da História Económica e Social do Algarve no século XVI”.

Esta é, de resto, mais uma homenagem, a par da instituição do Prémio Joaquim Romero Magalhães, que visa distinguir investigadores na área do património histórico-cultural do concelho de Loulé, em novembro de 2018, quando a Revista completou 25 anos de existência.

No domingo, dois académicos, colegas, amigos, e para quem Joaquim Romero de Magalhães foi também um mestre, juntaram-se a esta cerimónia para falar do homem, da sua obra, do seu legado e do contributo que deu à historiografia portuguesa. Da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, - “a escola onde o nosso Professor fez toda a sua longa e brilhante carreira académica (entre 1973 e 2012)” -, veio o Diretor, Álvaro Garrido, que fez uma passagem pelos momentos mais importantes do percurso e do trabalho de Romero Magalhães, que culminou com a atribuição do título de Doutor Honoris Causa, pela Universidade do Algarve, dias antes do seu desaparecimento.

“Algarvio de gema, louletano com imensa honra, Joaquim Romero Magalhães merece muito a homenagem que hoje lhe é concedida”, considerou este colega que enalteceu a sua “obra extensa e muito reconhecida, em Portugal, no Brasil, em Espanha e nos meios académicos de muitos outros países, o seu gosto pela História da época moderna e o seu papel de crescimento e afirmação da História económica e social no espaço académico português (e não só)”.

Destaque para a sua tese de licenciatura, “um trabalho ousado, que agitou as águas mornas da historiografia portuguesa”, nas palavras de Álvaro Garrido, ou como frisou Luís Miguel Duarte, da Universidade do Porto, “um livro perfeito, sem qualquer ruga”.

“Romero Magalhães conjugava a erudição histórica com um estilo narrativo, quase literário, e uma ironia mordaz. Entendia a História como um ofício de escrita, centrado na explicação, mas sem conceder a ornamentos teóricos. Sempre entendeu que a pesquisa de documentos e das demais fontes históricas obrigam o historiador a construir uma ética de arquivo e a fazer uso desses traços do passado numa dupla perspetiva: enquanto instrumento probatório e enquanto exercício de imaginação narrativa verosímil. Ou seja, primeiro a publicação de fontes, depois o estudo, a análise e a síntese de informação escrita”, sintetizou Álvaro Garrido sublinhando o enorme significado da ligação do seu nome ao Arquivo de Loulé.

“Entendia o arquivo e o arquivista como agentes de mediação. Combinava a mestria arquivística com uma tremenda intuição de análise sobre os contextos de ação humana e sobre a contingência dos processos históricos”, considerou ainda.

Num registo mais pessoal, Luís Miguel Duarte, da Universidade do Porto, também ele com um assinalável percurso de investigação histórico-cultural de Loulé, falou de Romero Magalhães como: “a pessoa que depois dos meus pais mais marcou a minha vida”. Recordou o seu primeiro contacto com o homenageado, nos tempos do Liceu D. Manuel, no Porto, em que o louletano foi seu professor de História, da amizade que aí nasceu e do apelo para a História após uma breve passagem pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, precisamente por influência de Joaquim Romero Magalhães. Seguiu, assim, os passos do “mestre”, tanto na formação como no percurso de docente, no caso na Universidade do Porto.

“Rapidamente se formou no Porto, na Faculdade de Letras, uma legião de jovens alunos que foram alunos dele, e seus admiradores. Deixou muitos órfãos entre os meus alunos que passaram a ser dele também”, disse Luís Miguel Duarte, realçando o professor de vocação e não esqueceu uma das últimas lições que dele recebeu, apontada num guardanapo de papel do Café Calcinha, aquando de uma passagem pela cidade de Loulé. Relembrou igualmente as “qualidades intelectuais e humanas invulgares, conversador excelente, um amigo muito leal com um coração enorme, um homem que era grande demais e inteligente demais para ser paroquial e pequenino, mas que sempre foi algarvio e nunca deixou de o afirmar”.

“Este Arquivo já era único, com a riqueza dos seus fundos e pela dedicação dos seus funcionários e responsáveis. Com um novo nome transforma-se num local cimeiro da História e da Cultura portuguesas e transforma-se num lugar mágico para mim”, concluiu.

Visivelmente emocionada, Luísa Romero Magalhães, esposa e companheira de mais de 50 anos, recordou “o homem bom que procurava viver com dignidade e com ética” e a família que o inspirou nesse propósito. “Um dos avós, João da Rocha Magalhães, do Porto, partidário de Afonso Costa. E o outro, Santiago Formosinho Romero, de Loulé, partidário de Mendes Cabeçadas. O pai, Joaquim Magalhães, foi um divulgador cultural e muito contribuiu para a divulgação do poeta Aleixo. Era o seu ‘secretário’. A mãe, Célia Vasques Formosinho Romero, nasceu em Loulé, foi pianista e professora de piano, amiga e colega da pianista louletana Maria Campina”.

Influências familiares terão também estado na origem dos seus ideais ligados à República e sobre os quais se debruçou em “Vem aí a República – 1906/10”, editado em 2009. No plano cívico, era “um homem interveniente e comprometido com o socialismo democrático e com a ética republicana. Acreditava muito na construção europeia e nas suas instituições, incluindo a construção paulatina de uma Europa federal”.

No encerramento desta cerimónia, o autarca Vítor Aleixo, salientou o propósito do Município na realização de iniciativas como esta homenagem: “Valorizar a nossa raiz e exaltar os nossos melhores exemplos, onde incluímos naturalmente na primeira linha o Professor Joaquim Romero Magalhães, cultivar a autoestima dos louletanos, num mundo onde tudo se igualiza, tudo se superficializa”.

O presidente da Câmara Municipal de Loulé destacou a “dimensão de homem universalista” do homenageado, um paralelismo com a própria ação da Autarquia que lidera. “Em Loulé cultivamos e educamos o amor dos jovens louletanos à sua terra mas sempre numa atitude de grande abertura aos valores da universalidade”, afirmou.

Quanto ao trabalho realizado ao nível da valorização do património e da memória da identidade local, a par das ações municipais como a criação deste edifício do Arquivo, com “uma viagem” que começou no ano de 1999, num protocolo celebrado ao abrigo do Programa PARAM; da criação do Prémio Joaquim Romero de Magalhães; da “descoberta” das Atas de 1384; ou do lançamento do “Cancioneiro Popular do Concelho de Loulé”, que decorrerá na próxima semana, Vítor Aleixo realçou o papel dos “louletanos que têm sido bons guardiões ao longo dos séculos”.

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