"É de Cultura como instrumento para a felicidade, como arma para o civismo, como via para o entendimento dos povos que vos quero falar"

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António Cabrita na elogio da sombra

Um díptico (e meio) de longo fôlego entre Moçambique e as sombras do mundo flutuante.


A Porto Editora publica Tristia (um díptico e meio), de António Cabrita. Esta é a décima sexta obra a integrar a elogio da sombra, coleção de poesia coordenada por Valter Hugo Mãe.

"Tristia pode ser a obra suprema da impressionante poesia de António Cabrita". Composto por As Feridas de Heitor (2005-2014), um "caderno de reportagens" de pulsão diarística, que se transforma na unidade aqui publicada ao receber uma vintena de poemas de Piripiri Suite. O ciclo aberto com esta obra é encerrado com A Flor de Edo, que reúne poemas escritos entre 2014 e 2017 e fecha também este volume. No interlúdio deste díptico encontra-se ainda Quíron, longo poema, meditação entre ruínas, "intervalo, para o breve lampejo dum gato que misteriosamente se alçou ao terceiro andar e passeou no parapeito da janela do meu quarto o seu perfurado rosto de prodígios."

Para Valter Hugo Mãe, curador da coleção "este livro confirma uma e outra vez que estamos perante um dos mais elevados lugares da poesia actual. Por sua mestiçagem sem trégua, por sua liberdade, aqui está uma bandeira fundamental da poética da língua portuguesa."

(…)
É que o corpo se cansou de ser enigma e preferes preservar
o tanto que resta fora de ti. Aparições onde descansas do estampido
das coisas inexpressas, do balanço das memórias numa cabeça
[a prazo.
Os anos já aturdem talvez porque a vida seja a soma
do que repelimos e aprecias a floração propícia ao desapego, o
[vazio
estilhaçar das clarabóias interiores. E fluem velhos lenhos para
[novas chamas,
meditas no desastre da tua vida sem que a dor te abafe
nas recônditas veredas do mistério. Ou na beleza que não nasce
do sublime e antes se intensifica na hospitalidade da renúncia.
[Fiapos
que a presença dela dilui. Vem do duche, nua, dourada pela luz
que em ti declina e então pedes, Anda deixa-me cheirar-te.
[E ela coloca
as pernas à roda do teu pescoço e a sua vulva sobre o teu rosto.
Encaixa. Como um país nas suas linhas telefónicas.

SOBRE O LIVRO
Tristia [um díptico e meio]
A eloquência de António Cabrita faz-se de uma constante impertinência. É rotunda a perturbação que certa coloquialidade bruta, não polida, acarreta ao luxo do pensamento, à extensão vocabular e ao inesperado da imaginação. Caracterizado por uma brilhante, cada vez mais isolada, sofisticação e riqueza de referências e imagética, há também algo ostensivamente mundano no modo de Cabrita que ironiza a tentação erudita e reclama uma fascinante coisa de rua, boémia, informal, de contracultura, combatendo sempre o mais confiável ou expectável, o papel do comportado ou perfeitamente definido.
"Tristia" pode ser a obra suprema da impressionante poesia de António Cabrita. Poemário de longo fôlego, e a capacidade para longas orações já é outra das suas naturezas, este livro confirma uma e outra vez que estamos perante um dos mais elevados lugares da poesia actual. Por sua mestiçagem sem trégua, por sua liberdade, aqui está uma bandeira fundamental da poética da língua portuguesa.
por Valter Hugo Mãe

Título: Tristia [um díptico e meio]
Autor: António Cabrita
Páginas: 356
PVP: 19,90€
Coleção: elogio da sombra
Ver primeiras páginas

SOBRE O AUTOR
António Cabrita

Nasceu em 1959 e tem vinte e tal livros publicados, em Portugal, Brasil (três livros de ficção) e Moçambique (livros de fábulas, poesia e ensaio). Foi jornalista durante 23 anos e editor (Fim de Século e Íman Edições). Em 2005 emigrou para Moçambique onde, neste momento, é professor de Dramaturgia e cronista no semanário Savana. Tem também uma coluna no jornal Hoje Macau. Escreveu inúmeros filmes. De entre os seus livros destacam-se: Inferno, 2001, três guiões sobre Camilo Castelo Branco, escritos em parceria com Maria Velho da Costa, Bagagem não Reclamada, Anatomia Comparada dos Animais Selvagens (Prémio PEN Clube 2018) e a kodak faliu. também o dick, o cão da minha infância, 2020, poesia; A Maldição de Ondina, 2013 (finalista do Prémio Literário Casino da Póvoa - C. M. Póvoa de Varzim 2013), Éter, 2015 (finalista do Prémio PEN Clube 2016), A Paixão segundo João de Deus, 2019, e Fotografar contra a luz, 2020, romances. Como tradutor, realça-se a sua antologia de poesia hispânica, As Causas Perdidas, 2020.

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