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Pompeia reabriu ao público e um atelier portuense desenhou os seus novos museus
Com a reinauguração do Antiquarium, o parque arqueológico italiano prossegue o seu programa de renovação do olhar sobre a Antiguidade. Os museus de Castellamare di Stabia e do Quotidiano são dois outros projetos com a assinatura do COR Arquitetos.
Depois de dois confinamentos provocados pela pandemia da covid-19, o Governo de Itália decidiu a reabertura dos museus do país no passado dia 18 de Janeiro. À imagem do que vem acontecendo noutros países da Europa, a medida foi adaptada ao mapa de incidência do vírus, tendo sido autorizadas a retomar agora as suas actividades apenas as instituições implantadas nas regiões “amarelas” (sendo o laranja e o vermelho as cores seguintes do alarme sanitário).
Entre os sítios que reabriram esta segunda-feira estão o Coliseu de Roma e o Parque Arqueológico de Pompeia. E, aqui, o acontecimento do dia foi a reabertura do Antiquarium, o museu que desde o último quartel do século XIX, e de forma intermitente, vem funcionando como espaço de exposição dos sucessivos achados que narram a história da cidade que a erupção do Vesúvio no ano 79 transformou num cemitério de lava e cinza.
Uma nota curiosa está no facto de o projecto de restauro e modernização do Museu Antiquarium ter assinatura de um atelier portuense – o COR Arquitectos (do italiano Roberto Cremascoli, do luso-brasileiro Edison Okumura e da portuguesa Marta Rodrigues), com a também italiana Flavia Chiavaroli. A mesma equipa, com escritório instalado na Rua de Santa Catarina, projectou já também o Museu Arqueológico Libero d’Orsi, no Palácio Real de Quisisana, em Castellamare di Stabia, no litoral da Campânia, a cerca de seis quilómetros de Pompeia, que foi inaugurado em Setembro de 2020 e integra o percurso de visita ao parque arqueológico; e está já a projectar o Museu do Quotidiano do Fórum de Pompeia, que deverá entrar em obra ainda este ano, com inauguração prevista para 2022.
O cicerone de Viagem a Itália
O Museu Antiquarium foi inaugurado em 1873 pelo arqueólogo Giuseppe Fiorelli (1823-1896), que aí instalou uma primeira mostra dos achados feitos em meados do século anterior em Pompeia e Herculano pelo engenheiro militar do rei de Nápoles Carlos III, o espanhol Roque Joaquin de Alcubierre. Em 1926, o museu foi ampliado pelo arqueólogo Amedeo Maiuri (1886-1963), o mesmo que se ocupou da sua recuperação no final da Segunda Guerra Mundial, quando o Antiquarium foi destruído pelas bombas – e que, em 1954, surge a guiar Ingrid Bergman e George Sanders pelas ruínas, no filme de Roberto Rossellini Viagem a Itália.
De novo encerrado em 1980, na sequência do terramoto que afectou a região, o Antiquarium reabriu em 2016, mas é agora que verdadeiramente entra na sua “terceira vida”, como foi referido na cerimónia da inauguração. “Pompeia, finalmente, tem um museu, e é único”, disse na semana passada à agência Ansa Massimo Osanna, o grande responsável pelo Parque Arqueológico de Pompeia nos últimos anos, e que actualmente dirige os museus nacionais de Itália.
A actual directora do Antiquarium, a arqueóloga Luana Toniolo, explicou à agência italiana de notícias que o museu permite agora mostrar “muitas peças icónicas” que já foram expostas por todo o mundo, mas que, por razões de segurança, “não estavam de facto disponíveis para os visitantes de Pompeia”.
Com entrada pela Praça Esedra, uma das duas que dão acesso ao parque, o museu expõe em seis núcleos distribuídos por 11 salas jóias e amuletos, pinturas, frescos e inscrições da Casa do Jardim, por exemplo. Mas também os objectos de uso quotidiano e os achados fantásticos desvendados nas escavações mais recentes, entre os quais se incluem os moldes (“ocos”) de dois homens (um homem e a sua escrava, admitem os arqueólogos), ou um restaurante tipo “fast food”, e que fecham o circuito expositivo.
“O nosso projecto teve a preocupação de demolir e limpar todas as marcas da utilização mais recente do museu e ir resgatar o ‘osso’ do projecto de Maiuri e da sua interpretação do edifício do século XIX”, explica ao PÚBLICO Roberto Cremascoli, realçando o facto de o Antiquarium pretender tornar-se “um museu permanente”.
Sítios mágicos
A partir dele, o visitante do Parque Arqueológico de Pompeia pode, com o mesmo bilhete, aceder ao museu em Castellamare di Stabia, que conta a história arqueológica das “vilas”, as casas dos nobres romanos que escolheram o litoral desta região para os seus tempos de vilegiatura.
Em curso, o atelier COR tem ainda o projecto do Museu do Quotidiano (título provisório), a instalar também no perímetro de Pompeia, no Fórum, e que irá acolher e “acrescentar os novos achados ao arquivo-depósito gigante que foi organizado por Amedeo Maiuri nos anos 50”, diz o arquitecto italiano radicado no Porto.
“É um privilégio para um estúdio tão pequenino como o nosso estar a trabalhar em sítios tão mágicos como estes”, congratula-se Roberto Cremascoli, acrescentando que o seu atelier foi também convidado pelo Ministério da Cultura português a desenhar a exposição Pompeia, Uma Ideia Europeia, que o Museu Nacional de Arqueologia e o Palácio Nacional da Ajuda tinham previsto que abriria em Lisboa, no início deste ano, a Presidência Portuguesa do Conselho Europeu, mas que teve de ser adiada por causa da pandemia.
Na sua carteira de encomendas para Itália, o COR tem ainda o projecto do arranjo exterior do percurso de um quilómetro do sítio arqueológico de Canosa de Puglia, no leste da península homónima, que acumula uma história estratificada em várias camadas geológicas. E ainda o pequeno Museu do Fórum Romano, frente ao Coliseu de Roma. Com inauguração agendada para o próximo mês de Outubro, este equipamento, dedicado a homenagear o arqueólogo Giacomo Boni (1859-1925), que dirigiu as escavações neste sítio arqueológico da capital italiana, visa contar a história da cidade desde as suas origens até ao final do Império Romano.
por Sérgio C. Andrade, in Público | 25 de janeiro de 2021
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público