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"O Ano da Morte de Ricardo Reis" chega ao cinema. "É um aviso enorme sobre a humanidade"

Estreia a 1 de outubro, o novo filme de João Botelho, "O Ano da Morte de Ricardo Reis", adaptado a partir da obra de José Saramago. O realizador assume que foi “um grande risco” pegar na obra do Prémio Nobel da Literatura.

Foto: Ar de Filmes


“Corte e cole, que é o que eu faço!”, foi assim que terminou a entrevista que João Botelho deu à Renascença sobre o seu novo filme. “O Ano da Morte de Ricardo Reis” já teve a sua antestreia, mas só chega às salas de cinema, ao grande público, a 1 de outubro. O realizador assume que pegar no romance homónimo do Nobel da Literatura José Saramago foi “perigoso”.

“Quando se pega num grande texto, é perigoso. O cinema não é literatura. É outra coisa. Para mim, a literatura tem de ser uma matéria que se respeita”, explica o realizador.

Filmado a preto e branco, a película tem como protagonistas o ator brasileiro Chico Diaz, que assume a personagem de Ricardo Reis, e o português Luís Lima Barreto, como Fernando Pessoa. “O Ano da Morte de Ricardo Reis” marca um regresso do realizador João Botelho ao universo do poeta dos heterónimos que, confessa, o acompanha muitos anos.

Segundo Botelho, “Saramago escreveu um romance prodigioso, com uma oralidade diferente”.

Num filme onde, por vezes, algumas falas são em verso, as personagens principais, de acordo com a leitura do realizador, não são Pessoa ou Ricardo Reis. “O personagem principal é o confronto entre o criador e a criatura”, ou seja, o diálogo entre o poeta de “A Mensagem” e um dos seus heterónimos.

João Botelho destaca também, como epicentro da ação do filme, o ano de 1936. “É o ano de todos os perigos. É o início do fascismo em Itália, do nazismo, da guerra civil de Espanha, do fascismo português”. No olhar critico do cineasta, há um paralelismo com os dias de hoje, “com os Bolsonaros, os Trumps, os Erdogans”. Para Botelho, “tudo isto é um aviso enorme para a Humanidade. O mal começa a triunfar”.


Na entrevista ao telefone, enquanto João Botelho estava no Chiado, o realizador explica-nos que pretende “inquietar” quem vê o seu cinema, para que “as pessoas mudem”.

Na sua definição, o cinema “não é o que se passa, mas como se filma”, daí ter optado por uma estética a preto e branco, num jogo de luz e sombra.

Em “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, Botelho quis regressar à essência da sétima arte. “Os otimistas surgem na luz, os pessimistas na sombra”, explica o realizador sobre a forma como rodou esta longa metragem. Ele, que admite não ter alterado nada no texto de Saramago, diz que neste filme “há um regresso a uma certa inocência do cinema, em que as pessoas viam e ouviam. O cinema não é para saltar lá para dentro. É para estar atento”.

Tal como o livro, o filme reconstitui os nove meses depois da morte de Fernando Pessoa. “É um período igual ao da gestação”, sublinha Botelho, em que o poeta surge como um fantasma ao seu heterónimo Ricardo Reis.

Depois de ter feito “O Filme do Desassossego”, “Os Maias” e a “Peregrinação”, o realizador opta agora por Saramago e convocou além de Luís Lima Barreto e Chico Diaz, as atrizes Catarina Wallenstein e Victória Guerra para os principais papeis femininos.

A banda sonora original é assinada por Daniel Bernardes. Nas palavras de João Botelho, “é uma música original, para pontuar e arrastar as pessoas para aquele precipício da inquietação”.

No olhar do realizador “o cinema não deve consolar, deve inquietar as pessoas. Deve pôr problemas e não deve resolvê-los”. Para Botelho, a música ajuda a criar esse ambiente.

Além do filme, estará patente uma exposição no CCB com os materiais gráficos do filme e com o material utilizado por José Saramago para as pesquisas para o romance, como as anotações tiradas na agenda a partir das pesquisas feitas na Biblioteca Nacional, e réplicas dos jornais da época.

A estreia internacional será no Festival de Sevilha, e está já marcada a sua participação na Mostra de Cinema de São Paulo. Dentro de um ano vai dar origem a uma série de cinco episódios, a exibir pela RTP.

A adaptação de "O Ano da Morte de Ricardo Reis" teve um custo de 1,5 milhões de euros, e contou com o apoio do Instituto do Cinema e do Audiovisual, do Ministério da Cultura, da Câmara Municipal de Lisboa, do Turismo de Portugal e da RTP.


por Maria João Costa in Renascença | 22 de setembro de 2020
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Rádio Renascença

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