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100 guitarras a tocarem juntas para os 100 anos de Amália
As celebrações do centenário de Amália começam neste primeiro dia de julho com um espetáculo inédito: 100 guitarristas a tocar os seus fados. Hoje online, amanhã na RTP.
É uma abertura simbólica, a que foi escolhida para assinalar o início do programa oficial de comemorações do centenário de Amália Rodrigues: 100 guitarristas a tocar os seus fados. A gravação foi feita nos Paços do Concelho, a sede histórica da Câmara Municipal de Lisboa, onde se reuniram todos os guitarristas participantes com observação das distâncias impostas pela pandemia, e o resultado é transmitido esta quarta-feira, pelas 12h, nas plataformas digitais do Museu do Fado e da CML, e amanhã, quinta-feira, na RTP1, pelas 22h30.
A génese deste projeto remonta a 23 de abril de 2019, quando foram inauguradas as oficinas de guitarra no Museu do Fado. Nesse dia, juntaram-se 60 guitarristas e ali tocaram todos juntos. Pedro de Castro, um dos presentes, a quem coube coordenar o encontro, recorda esse dia ao PÚBLICO: “O Presidente da Câmara [de Lisboa, Fernando Medina] estava lá, achou imensa graça e lançou logo o desafio de fazer aquilo na câmara. A Sara Pereira [diretora do Museu do Fado] e eu ficámos com alguma vontade de pegar nesta ideia, aproveitando a abertura dele, e fazer qualquer coisa.” A ligação às celebrações de Amália acabou por surgir como hipótese natural, mais tarde. “Pensámos: centenário da Amália, 100 anos, era capaz de fazer sentido ter aqui 100 guitarristas a tocar para ela.”
Efeito da pandemia
A gravação foi feita em plena pandemia da covid-19, condicionada por ela, mas também só foi possível devido à paralisação dos concertos. “Sem esta pandemia horrível, este concerto nunca existiria”, diz Pedro de Castro, “porque era impossível reunir 100 músicos daquele calibre, porque muitos estariam em viagem, pelo país ou pelo estrangeiro, a trabalhar. Isto é uma coisa que nunca aconteceu e que esperamos que não volte a acontecer.”
Tocam, “todos ao mesmo tempo”, Amália, de Frederico Valério. “Enviei uma gravação da música a todos, porque fizemos isto a nível nacional. Convidei guitarristas do Porto, de Coimbra, não só os de Lisboa, porque o fado e Amália têm dimensão nacional. Depois, dividimo-nos em 12 grupos para revisitar os seus temas mais famosos. E eu, enquanto responsável pela direção musical, o que fiz foi juntar pessoas com pessoas e organizar os temas para fazer uma viagem o mais completa possível ao repertório dela.”
Com alguns pormenores: “Por exemplo, num dos grupos estão o António Parreira, o Paulo Parreira e o Ricardo Parreira, três gerações de guitarristas. Depois, há um ensemble de oito músicos de Coimbra que tocam o Coimbra. Noutro grupo, o Luís Guerreiro, o Bernardo Couto, o Gaspar Varela [bisneto de Celeste Rodrigues, irmã de Amália] e eu gravámos uma homenagem ao Carlos Gonçalves, porque infelizmente ele faleceu durante esta pandemia (numa altura em que ninguém o pôde homenagear, ninguém se pôde despedir dele) e foi o responsável por uma boa parte do repertório icónico da Amália. E há outras surpresas: por exemplo, juntámos o Banza com o Custódio Castelo e um aluno dele, o Bruno Chaveiro.”
Documento histórico
A reunião de todos estes músicos (com guitarras, violas, violas-baixo e até contrabaixos) foi, para eles, um desafio. “Consegui incutir este espírito: atenção, isto é para a gente se divertir, mas é também um documento histórico. Portanto, não descuremos nos arranjos, isto não é só uma homenagem, é um documento que fica.”
A transmissão, depois da montagem das gravações, deverá começar com Joel Pina, o histórico viola-baixo que acompanhou Amália durante quase três décadas. Pedro de Castro recorda como foi gravá-lo sozinho. “Perguntei-lhe se queria tocar o Amália, e ele começou a tocar a melodia no baixo. E eu nem tirei a guitarra do estojo. Ele tocou sozinho o tema. O Joel, aliás, é o único que vai falar. E é ele que faz a transição para os 100.” Que são mesmo 100 porque faltou um da lista, ficando 99 mais Joel Pina, que fez 100 anos em fevereiro.”
Para Sara Pereira, diretora do Museu do Fado, “fazia sentido arrancar a comemoração com um projeto coletivo.” E isso foi conseguido aqui: “É um programa inédito, com músicos de várias gerações, só possível pelos piores motivos (por muitos deles estarem, devido à pandemia, sem atividade), mas que é um acontecimento único e um testemunho coletivo à grande voz do século XX. Ao legado universal de Amália e àquela que, apesar de todo o mediatismo, é a nossa grande referência e continua próxima de todos nós.”
por Nuno Pacheco in Público | 1 de julho de 2020
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público