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O Lapo da Bica é um 3-em-1 que alimenta a intervenção cultural
É um café? É um atelier? É uma sala de espectáculos? Aqui, fundem-se arte e gastronomia, servem-se cocktails como o Antídoto Contra o Medo da Opinião Pública. “Quisemos criar um espaço para a comunidade, não só para o turista”, garante-se no Lapo.
Sábado à noite no bairro da Bica, em Lisboa, nas ruas apertadas vagueiam turistas. É na Marechal Saldanha que está o discreto Lapo. Pela fachada, poderia parecer uma simples loja para turistas, mas lá dentro está a tríade original onde a arte e a gastronomia se fundem: Café, Provador e Atelier.
A porta aberta para as escadas desafia a curiosidade e convida à entrada. Lá em cima está à espera o Café do Lapo. Bruna e António Guerreiro, fundadores e proprietários do espaço, recebem-nos com um sorriso de boas-vindas e explicam que aqui, além de se servirem refeições, se vive cultura. A exposição de Thomaz Ribeiro Bondioli nas paredes confirma.
Se na rua eram os turistas em maioria, aqui dentro ouve-se sobretudo português. “Quisemos criar um espaço para a comunidade, não só para o turista”, explica Bruna Guerreiro. Aliás, antes da abertura do Lapo, em Julho deste ano, os vizinhos foram convidados a conhecer o espaço. “Muitos espaços abrem e não pensam no bairro. Falta criar comunidade”, acrescenta a proprietária do espaço.No Café do Lapo servem-se refeições descontraídas com inspiração alentejana. Os comensais sentam-se nas antigas masseiras da padaria, que anteriormente habitou aqui. Na sala principal está um piano, onde todos são convidados a tocar, e um gira-discos. Aqui acontecem também tertúlias culturais, apresentações de livros ou pequenos concertos, acompanhados pelos cocktails da casa.
A literatura é também parte fundamental do projecto de Bruna e António Guerreiro. A parede principal do Café está forrada a livros, alguns oferecidos por visitantes, outros escolhidos a dedo com a curadoria de ambos ao longo dos três anos em que o projecto foi pensado. “Estivemos um ano e meio em obras e aproveitámos o tempo para criar ideias”, explica o jovem casal.
Antídotos para todos os males
Quando criaram o Lapo, o bar não fazia parte dos planos do casal. Foi por influência do irmão de António, grande amante de cocktails, que se aventuraram nessa estrada. Cada cocktail foi pensado ao pormenor e baptizado de antídoto.
Encontram-se deliciosos antídotos para todos os males. O Antídoto contra o Medo da Opinião Pública (com medronho, sumo de limão, xarope de gengibre e angustura) e o Antídoto contra a Inveja (aguardente da Lourinhã, sumo de limão, xarope de açúcar e angustura) são os preferidos do casal Guerreiro.
Descemos as escadas para conhecer o Atelier Lapo, onde se podem adquirir as peças criadas com as ilustrações de Bruna Guerreiro. Na montra, além de azulejos com ilustrações, estão as esculturas da Arte da Terra, uma empresa do Gerês, com quem o casal colabora.
As t-shirts feitas em Portugal são o grande sucesso do atelier. As frases estampadas são expressões portuguesas com um toque de ironia. Bruna Guerreiro garante que o português rapidamente entende as expressões, capazes de despertar também a curiosidade do turista. “Café à político: sem princípio” e “Sr. Doutor” são duas das mais vendidas. A t-shirt estampada com Fernando Pessoa é a que os turistas mais compram, mesmo que desconheçam o poeta português.
Cultura e gastronomia à prova
No atelier destaca-se a néon vermelho a palavra Sala-Provador. Aparentemente, trata-se do provador da loja. No interior abre-se uma porta que revela a sala secreta. Talvez seja a falta de iluminação e o silêncio, mas na Sala-Provador respira-se mistério.
Ao entrar, é impossível ficar indiferente ao palco em posição de destaque. De quarta-feira a domingo, acontecem apresentações das mais variadas artes de espectáculos. O objectivo é sempre o mesmo: dar a conhecer artistas desconhecidos. “Não queremos proporcionar entretenimento, mas sim levantar questões, sem dar respostas”, garante Bruna Ferreira.
Performances, dança, teatro e comédia são algumas das artes recorrentes na Sala-Provador, que procura sempre a rotação de artistas. O ambiente na sala é intimista, dada a proximidade entre os artistas e plateia. No final de cada espectáculo, o público é convidado ao diálogo com o artista, explica Ana Câmara, directora artística do projecto, à Fugas.
A cozinha alentejana do chef João Pronto acompanha a intervenção cultural de Bruna e António Guerreiro. A acompanhar o espectáculo é servido um menu de degustação, composto por entrada, dois pratos e sobremesa.
por Inês Duarte de Freitas, in Fugas | 7 de novembro de 2019
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público