"É de Cultura como instrumento para a felicidade, como arma para o civismo, como via para o entendimento dos povos que vos quero falar"

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Quarenta anos de poesia de Adolfo Luxúria Canibal reunidos em livro

Chega às livrarias o oitavo volume de elogio da sombra, a coleção de poesia coordenada por Valter Hugo Mãe. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978 – 2018) é o título desta antologia poética de Adolfo Luxúria Canibal, fundador e carismático vocalista da banda rock Mão Morta.


Não é possível a cultura portuguesa recente passar ao lado da poesia que aqui se reúne,
escreve o coordenador da coleção no texto que acompanha esta obra. Entre amores abissais e políticas grotescas, alucinações de teor mais ou menos farmacêutico ou cidades cheias de passado, a poética de Adolfo Luxúria Canibal é a contemporaneidade completa, uma avidez, com seu modo próprio de se assumir e denunciar ao mesmo tempo. Sem culpa. Apenas força.

Os 40 anos de poesia e rastilho de contracultura reunidos em No rasto dos duendes eléctricos são ainda enquadrados num capítulo intitulado A inocência é ilegítima, que transcreve uma conversa entre Valter Hugo Mãe e Adolfo Luxúria Canibal.

Sobre o Livro
O rock é sobretudo contracultura, oposição à padronização ou higienização social. Na sua mais elementar definição, o rock está como um convite à liberdade, defendendo a oportunidade para a informalidade e para a mais desabrida emoção. Há um arrebatamento esperado no seu som, uma entrega que pressupõe a reeducação para a dimensão sensorial, profundamente animal, sem pudor ou crime.

O trabalho de Adolfo Luxúria Canibal é um dos mais cultos no panorama do rock português. Exímio à frente dos Mão Morta, o seu carisma justifica parte da contínua vigência da sua grande banda, carisma que adensa com letras frontais, sempre colocadas como golpe perante um mundo de seduções, vícios e falhas virtudes.

Não há um moralismo bacoco. O que diz é do foro da denúncia e é também afeição ao perigo, porque não se tem como exemplar, tem-se como livre.

Não é possível a cultura portuguesa recente passar ao lado da poesia que aqui se reúne. Em algum momento, todos fomos expostos à sua acidez perspicaz, pertinente, perante o pouquinho que tende a ser o mundo das pessoas. Entre amores abissais e políticas grotescas, alucinações de teor mais ou menos farmacêutico ou cidades cheias de passado, a poética de Adolfo Luxúria Canibal é a contemporaneidade completa, uma avidez, com seu modo próprio de se assumir e denunciar ao mesmo tempo. Sem culpa. Apenas força. Poderia dizer, inteligência.

por Valter Hugo Mãe 

ARRASTANDO O SEU CADÁVER
É demencial Não há palavras que consigam dizer o horror
Vi um pobre homem agarrado ao que restava da sua mulher
Errando pela baixa
Os olhos fixos num horizonte perdido
Sem uma palavra Sem um som
Arrastando a carcaça desfigurada
Por entre o trânsito do fim da tarde
Passei sem conseguir dizer nada
Ninguém dizia nada O silêncio
Acompanhava o olhar vazio A dor
A vaguear por entre as ruínas e o trânsito do fim da tarde
As pessoas apressavam-se por causa do cair da noite
E o pobre homem seguia um destino sem rumo
Arrastando o seu cadáver 

Sobre o Autor

Adolfo Luxúria Canibal
Adolfo Luxúria Canibal é o pseudónimo de Adolfo Morais de Macedo. Licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa, foi advogado e é consultor jurídico.
Fundador do grupo rock Mão Morta, de que é vocalista e letrista, criou espectáculos de spoken word, em nome próprio ou como Estilhaços, e integrou o colectivo de música electrónica Mécanosphère, tendo mais de três dezenas de discos editados, e outros tantos como convidado de artistas nacionais e estrangeiros, na qualidade de vocalista ou letrista. Dinamizou espectáculos de comunidade, como os musicais Então Ficamos… ou Chão, e concebeu performances várias, com destaque para a neuro-áudio-visual Câmara Neuronal, realizada a partir dos sinais eléctricos emitidos pelo cérebro, ou a da instalação The Wall of Pleasure, inaugurada na Rooster Gallery em Nova Iorque. Participou como actor na série para televisão O Dragão de Fumo e em algumas curtas-metragens ou em peças de teatro como Eis o Homem!, da companhia Mundo Razoável. Concebeu ainda com João Onofre o filme de videoarte S/título (¿¿¿ ¿¿¿¿¿), para o festival Curtas de Vila do Conde, e com Inês Jacques, o espectáculo de dança No Fim Era o Frio, para o festival Guidance. Publicou, entre outros, os livros Rock & Roll, Estilhaços, Todas as Ruas do Mundo, Garatujos do Minho e o livro-objecto Desenho Diacrónico, com Fernando Lemos. 
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