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Visões Paralelas: o Museu do Prado reúne agora o que sempre separou

A grande pinacoteca espanhola celebra o seu bicentenário com uma seleção de obras-chave da história da pintura holandesa e espanhola do século XVII, nacionalismos à parte.

Lado a lado, o Retrato de Francisco Pacheco, de Velázquez, e o Retrato de um Ourives, de Werner van den Valckert Museu do Prado, Madrid


Para celebrar o seu bicentenário, o Museu do Prado, em Madrid, está a recuar aos tempos em que Espanha e Holanda eram um só domínio com a exposição Velázquez, Rembrandt e Vermeer. Visões Paralelas – uma ambiciosa seleção de 72 obras de artistas espanhóis e holandeses do século XVII, com a colaboração do Rijksmuseum de Amsterdão e de mais 15 instituições, incluindo a National Gallery de Londres, o Metropolitan Museum of Art em Nova Iorque e o Mauritshuis de Haia.

É raro, nas grandes pinacotecas ocidentais, ver-se pintura da época moderna de diferentes nacionalidades partilhar o mesmo espaço. Dita a tradição a sua rigorosa segmentação por salas, como se as obras apenas soubessem comunicar entre si na língua de quem as fez. A aproximação das pinturas espanhola e dos Países Baixos é por isso, para o Prado, um sonho concretizado, que começou a tomar forma em Madrid há 16 anos, depois da exposição Vermeer e o Interior Holandês, onde uma das mais famosas composições do pintor, A Arte da Pintura, partilhou a mesma sala com As Meninas de Velázquez. A milhares de quilómetros de distância, separados pela geografia e pela História, coincidiam numa sensibilidade e numa técnica semelhantes: uma estética desligada de idealismos e uma especial atenção à verdadeira aparência das coisas.

Inaugurada a 25 de junho deste ano, a inédita estadia de obras como Os Síndicos de Rembrandt na capital do país vizinho perdura até 29 de setembro. O Museu do Prado torna possível ver lado a lado obras de Velázquez, Rembrandt ou Vermeer (e uma dúzia de outros – El Greco, Zurbarán, Both, Brugghen – que não couberam no título), fugindo aos nacionalismos que enraizaram estes artistas nas respetivas escolas de pintura. Os estudos de arte feitos durante os séculos XIX e XX procuraram estabelecer a ideia de que cada nação ocidental tinha a sua escola, única e distinta no palco europeu. A história sangrenta da Espanha e dos Países Baixos no século XVII ajudou a construir uma visão por vezes oposta da arte de ambos os países.

Foi em 1556 que o rei Filipe II de Espanha (Filipe I de Portugal) herdou do pai, o Sacro-Imperador Carlos V, uma grande parte das vastas possessões da família Habsburgo, incluindo as 17 províncias que hoje constituem os Países Baixos, a Bélgica e o Luxemburgo. Católico devoto e autoproclamado líder da Contra-Reforma, o rei das coroas ibéricas ocupou muito do seu reinado a lutar contra o avanço do protestantismo, política que levou as províncias protestantes dos Países Baixos à rebelião, no que se chamou postumamente a Guerra dos 80 anos, ou a Guerra da Independência.

A génese dos Países Baixos como nação independente levou à criação de uma historiografia que evidenciava a sua individualidade cultural. Mas antes do sangue e da guerra, os territórios da Holanda e da Espanha eram um só domínio, sob a soberania de Carlos V da casa Habsburgo. Visões Paralelas é também um convite para nos deixarmos enganar; parte da exposição é dedicada aos icónicos retratos de homens de negro e golilha branca, que só a cartela do quadro nos dirá se são holandeses ou espanhóis. Ambos os países adotaram, em rejeição da superficialidade, a moda sóbria de origem borgonhesa e a tornaram sua.

“Não se sugere aqui que não existem diferenças entre as nações”, esclarece o curador da exposição, Alejandro Vergara, ao diário espanhol ABC. “O que se diz é que [essas diferenças] foram muito exageradas (...). Agora, olhamos para a pintura com o desejo de encontrar em cada quadro a expressão da essência do país de onde vem o seu pintor”, acrescenta. Replicando as pinceladas soltas de Ticiano e outros da escola de Veneza ou usando os mesmos temas e modelos para a criação das suas fantasias realistas, os pintores espanhóis e holandeses assemelham-se em múltiplos aspetos. As suas semelhanças devem valer (pelo menos) a mesma atenção que tem sido prestada àquilo que os distingue. Visões Paralelas desafia as barreiras criadas pela História ao mostrar os artistas como figuras que extravasam escolas e nações, comunicando através da pintura numa linguagem comum europeia. 


por Tomás Marques Pereira e edição de Inês Nadais in Público | 2 de agosto de 2019
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público

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