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Há um novo “percurso feminista” pela Coleção Moderna da Gulbenkian

Há 130 novas obras para ver na exposição permanente, e entre o olhar de Amadeo ou de Almada sobre as mulheres, 47 artistas femininas estão representadas. Nos últimos dois anos, 18 novas artistas passaram a integrar a coleção.

[Foto: Andreia Carvalho] [Foto: Andreia Carvalho] [Foto: Andreia Carvalho] [Foto: Andreia Carvalho] Escultura de Jorge Vieira [Foto: Andreia Carvalho] Bordados e desenhos de Maria Antónia Siza [Foto: Andreia Carvalho] Obra de Ana Vieira [Foto: Andreia Carvalho]


“Estamos a tentar normalizar a presença das mulheres”, diz a diretora Penelope Curtis. 

O que é reorganizar a exposição permanente da Coleção Moderna da Gulbenkian sob o prisma da mulher? É mostrar mais obras de artistas mulheres, algumas pela primeira vez, mas também novas aquisições (por exemplo de Ângela Ferreira ou Pedro Cabrita Reis), dar a descobrir nomes por ali inéditos até agora e revisitar representações do género feminino por autores essenciais como Amadeo ou Almada Negreiros. Mas é sobretudo um convite. “Fazer um percurso feminista é uma maneira de chamar o público”, diz a directora do Museu Gulbenkian, Penelope Curtis, e “mostrar a coleção de forma mais activa” – uma colecção que, nos últimos dois anos, passou a contar com 18 novas mulheres artistas no seu rol.

A partir desta sexta-feira, os visitantes da Gulbenkian vão encontrar novos ares, e novas protagonistas, na casa da Coleção Moderna. Logo à entrada, Grada Kilomba dá as boas-vindas com Illusions Vol.I, Narcissus and Echo (2017): será a primeira das 47 artistas mulheres alinhadas neste novo percurso expositivo que mostra mais de 420 obras, maioritariamente produzidas por artistas masculinos. O presente rearranjo da exposição permanente, que desde 2017 se vem “rearrumado” periodicamente, segue um prisma de género mas também um prisma geográfico – com a arte africana, através de obras raramente mostradas de Malangatana ou Bertina Lopes, a reemergir.

A instalação vídeo de Grada Kilomba é uma das novas aquisições do museu, entre as quais se inclui também o desenho Sem Título da série Diamantes (2018), de Ângela Ferreira, a mais recente de todas as compras. Desse leque fazem ainda parte Natureza-Morta (1981), de Maria Beatriz, Conversa (quadro geral e exemplo) (1980), de Álvaro Lapa, ambas compradas em 2016 mas mostradas agora pela primeira vez, as fotografias de Kiluanji Kia Henda Natureza Quase Morta (2009) e Compacted Distance (2014), a escultura Círculo de Luz (2018), de Pedro Cabrita Reis, ou duas esculturas em terracota (1956) de Jorge Vieira. 

O novo percurso mostra também peças veteranas da coleção, mas que nunca foram expostas, como Morreu Ivan Ilich (1986), de Isabel Augusta, ou a escultura com néon Lapis Cognitionis (1987), de Clara Menéres. E se na arte, como no mundo, é tão discutido o “male gaze” que cristaliza toda uma carga política e de género, na Gulbenkian ele vê-se ao espelho: tanto há 24 obras que aproveitam a nova proposta de percurso expositivo para mostrar representações de mulheres por alguns dos nomes centrais do acervo (desenhos de Amadeo de Souza-Cardoso e Almada Negreiros, ou o óleo Esperando, de Eduardo Viana, que figura três gerações no feminino), quanto é possível ver as caricaturas de Ofélia Marques, dedicadas a importantes figuras dos anos 1920 e 30 como o próprio Almada Negreiros ou José Abel Manta.

Entretanto, surge um delicado núcleo centrado em Maria Antónia Siza (1940-1973), esclarecendo os processos que estão por trás destas alterações no percurso. “Estas mudanças começaram em março com esta sala, após uma doação generosa do arquiteto Siza Vieira de 141 peças, entre desenhos e bordados”, da sua primeira mulher. Desse conjunto estão agora expostas pela primeira vez em Lisboa 36 peças, lembra a curadora Patrícia Rosas na visita para a imprensa.

"Algo que devia ser normal"

Em 2017, Penelope Curtis dizia ao PÚBLICO que um dos passos mais simples para atingir o equilíbrio de género nos museus é a aquisição de obras de artistas no ativo; recuperar o que se perdeu no passado é uma tarefa mais complexa. “As aquisições não são assim tão fáceis porque as mulheres [artistas] não tinham uma grande presença profissional ou comercial e por isso é que é uma grande oportunidade ter uma doação de Siza Vieira da obra da sua primeira mulher”, diz agora Penelope Curtis. Mas a coleção tem núcleos fortes de artistas femininas já desaparecidas, exemplifica, “como Ofélia Marques ou Mily Possoz – são é mostrados muito raramente”.

A diretora do museu aplica a lente do género à exposição como mais uma forma de a dinamizar – “estamos a conseguir entrar num ritmo”, disse na quinta-feira durante a visita guiada –, mas o momento também pode servir para fazer um balanço, ou para ganhar balanço. Para mostrar que “os números não são nivelados”, mas que a Gulbenkian está a fazer “o possível”, detalharia depois ao PÚBLICO. Entre as novas aquisições desde que chegou à direção, em 2015, estão muitas jovens artistas portuguesas como Ana Cardoso, Mariana Silva, Mariana Gomes, Sara Bichão, Luísa Jacinto ou Filipa César (que também esta sexta-feira inaugura a exposição Crioulo Quântico na Gulbenkian). Se em 2017 dos 1253 artistas representados na Coleção Moderna da Gulbenkian 268 eram mulheres, segundo dados solicitados pelo PÚBLICO, desde então entraram no acervo mais 189 obras de mulheres (141 são do espólio de Maria Antónia Siza) e 18 novas autoras. “O que estamos a tentar fazer é normalizar a presença das mulheres”, explica Penelope Curtis sobre o novo percurso expositivo. “Infelizmente às vezes temos de agir de forma positiva para fazer algo que devia ser normal, ou presente, ou óbvio.”

O encontro com novos velhos nomes, alguns no feminino e mais desconhecidos do grande público, é uma constante neste percurso expositivo que baralha e volta a dar a Coleção Moderna, com 130 novas obras num total de mais de 420 peças à vista do público. Pode rever-se a instalação de Ana Vieira Ambiente – Sala de Jantar (1971), que não era mostrada há quase uma década, ou a instalação avoiding the mistral wind II (2013), de Leonor Antunes, a dialogar de longe com a sua exposição na atual Bienal de Veneza. Há ainda Menez, Paula Rego, Querubim Lapa, Júlio Resende, Abel Manta, Helena Almeida, Júlio Pomar. O museu “não é sempre a mesma coisa, muda”, diz a sua diretora aos jornalistas, e é “mais ou menos o museu nacional de arte portuguesa do século XX”.

 


por Joana Amaral Cardoso, in Público | 31 de maio de 2019
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público 

 

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