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Um verão cinéfilo com 25 filmes de Buñuel
A partir de 11 de julho, o mestre espanhol de A Bela de Dia ou O Charme Discreto da Burguesia será objeto de um ciclo retrospetivo que circulará pelo país – meio século de filmes, começando pelo manifesto surrealista Un chien andalou.
Sacha Guitry, Marlen Khutsiev, Jean-Pierre Melville, Kenji Mizoguchi, Ingmar Bergman, Yasujiro Ozu, Satyajit Ray, Jean Renoir, Roberto Rossellini, Andrei Tarkovsky, Jacques Tati, Wim Wenders – aos nomes destes cineastas, aos quais a Leopardo Filmes de Paulo Branco tem vindo a dedicar ciclos retrospetivos, vai-se juntar, este Verão, o do espanhol Luís Buñuel (1900-1983), um dos grandes mestres do cinema do século XX. A partir de 11 de julho, primeiro no Nimas, em Lisboa, e no Teatro Campo Alegre, no Porto, e depois em circulação pelo país, o ciclo resgatará 25 filmes de Buñuel para preencher o Verão cinéfilo.
“Cineasta dos cineastas” admirado por Godard, Hitchcock ou Oliveira, Buñuel foi um satirista escarninho e atento, “o mais individualista dos cineastas” segundo o crítico Serge Daney, mas que, apesar dos seus inícios no cinema (então) chamado “de arte”, soube sempre manter o seu olhar corrosivo e subversivo mesmo dentro de restrições de produção, género ou orçamento.
A seleção da Leopardo inicia-se com os dois primeiros filmes do cineasta, os manifestos surrealistas Un Chien Andalou (1929) e L’Âge d’Or (1930); presta especial atenção aos filmes rodados no México na década de 1950, e, depois de passar pelos seus clássicos europeus das décadas de 1960 e 1970, como A Bela de Dia (1966) ou O Charme Discreto da Burguesia (1972), termina com a sua última longa-metragem, Este Obscuro Objeto do Desejo (1977). Os títulos mais premiados da filmografia buñueliana fazem também parte do ciclo: Viridiana(1961), o seu controverso regresso a Espanha, valeu-lhe a Palma de Ouro em Cannes, onde já tinha vencido o prémio de melhor realizador pelo seu olhar sobre os meninos da rua da Cidade do México, Los Olvidados (1950); A Bela de Dia foi Leão de Ouro em Veneza, onde a média-metragem Simão do Deserto (1964) teve o prémio especial do júri; O Charme Discreto da Burguesia teve o Óscar de melhor filme estrangeiro.
O “resgate” destes filmes – vários dos quais, segundo a distribuidora, serão exibidos em cópias restauradas – devolve ao público um cineasta que, apesar de reconhecido pela comunidade cinéfila, não tem, nestes tempos de disseminação digital, obtido a mesma exposição global de realizadores seus contemporâneos. Isso é especialmente verdade acerca dos filmes que realizou no México enquanto exilado, trabalhando dentro das regras estritas do melodrama ou da comédia mas apondo-lhes a sua marca própria de irrisão (cerca de metade dos títulos do ciclo vêm desse período): Susana, Demonio y Carne (1951), A Filha do Engano (1951) Una Mujer sin Amor (1952), El Bruto (1953), Él (1953), O Monte dos Vendavais(1954), Ensaio de um Crime (1955), Nazarín (1958) e A Febre Sobe em El Pao(1959), bem como a sua adaptação das Aventuras de Robinson Crusoe (1953).
O ciclo irá igualmente exibir os seus grandes filmes “sociais” sobre a pobreza, a curta de 1932 Las Hurdes, Terra sem Pão (filme que marcaria o início dos seus problemas com as autoridades espanholas, levando-o ao exílio após a vitória franquista na Guerra Civil) e Los Olvidados. O seu regresso à Europa após o escândalo de Viridiana será seguido praticamente na íntegra pelas restantes escolhas: El Ángel Exterminador (1962), Diário de uma Criada de Quarto (1963), Simón del Desierto, A Bela de Dia, Tristana (1969), A Via Láctea (1969), O Charme Discreto da Burguesia, O Fantasma da Liberdade (1974) e Este Obscuro Objeto do Desejo.
Em quase todos os casos, trata-se de filmes que ou desapareceram do circuito comercial desde a sua estreia (limitados a exibições na Cinemateca ou em ciclos pontuais) ou nunca tiveram sequer estreia comercial em Portugal (parte significativa dos filmes anteriores a 1974, aliás, apenas chegou às salas depois do 25 de Abril). O programa completo da operação está ainda a ser ultimado, mas incluirá leituras de textos escritos por Buñuel (como a sua versão de Hamlet traduzida para português por Mário Cesariny) e terá passagem garantida por Coimbra, Braga, Figueira da Foz e Setúbal.
por Jorge Mourinha in Público | 7 de maio de 2019
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público