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A Casa Eames, ícone da arquitetura e do design modernos, vai ser conservada

Plano foi anunciado este mês para preservar a emblemática mas “frágil” casa californiana assinada e vivida pelo casal que humanizou o design industrial. O imóvel cumpre 70 anos em 2019.

A Lounge Chair, um dos objetos mais icónicos da dupla formada por Charles e Ray Eames, aqui ladeada por peças de artesanato e plantas de interior O exterior de um dos blocos da Casa Eames Ray e Charles Eames na estrutura de aço de sua casa em 1949_ Eames Office O casal no seu sofá embutido, 1951_ Jim Eppinger/Eames Office Parte dos lados norte e leste da sala que mostra a varanda da zona do quarto, com painéis deslizantes_ Eames Office A sala em 2013: a varanda forma um teto para um nicho numa sala em open space Leslie Schwartz/Eames Office


Aos 70 anos, a Casa Eames, um dos mais importantes exemplares intactos da arquitetura e do design modernos, vai beneficiar de um projeto de conservação que visa “protegê-la para as gerações futuras”. Charles e Ray Eames construíram-na entre os eucaliptos centenários de Pacific Palisades, na Califórnia, e depois viveram nela – mas esta memória viva da influência do casal de designers que acabou nos compêndios do movimento moderno está “frágil”, e por isso serão necessárias algumas mudanças para restaurar a sua velha glória. Com esse objetivo, até as árvores vão ser substituídas, mas de resto a ideia é que a habitação seja reconduzida ao período em que foi de facto uma casa: “Queremos que pareça que Charles e Ray se ausentaram por um bocadinho”, diz Lucia Dewey Atwood, da Eames Foundation, citada num comunicado do Getty Conservation Institute, que aconselhou a fundação na definição do plano de conservação que esta pagará (o valor da intervenção não foi revelado) e levará a cabo.

Construída em 1949, a Casa Eames é uma referência de estilo e de História, “um ícone de vidro e aço da arquitetura moderna”, como sublinha a fundação criada em 2004, mas é simultaneamente a casa vivida em que os netos do casal de designers norte-americanos se lembram de brincar, uma casa marcada por camadas várias de gostos, coleções e manias. O plano agora posto em marcha contemplará “o cuidado continuado, a gestão, a conservação, a exposição e a interpretação do espaço, incluindo a casa e o estúdio, a coleção de objetos e a paisagem”, garantem as instituições no mesmo comunicado.

A Eames House, como é conhecida internacionalmente, nasceu de uma encomenda mas acabaria por ser a casa do casal autor das icónicas cadeiras Lounge e Shell – objetos que mesmo quem não conhece os Eames reconhecerá. Foi John Entenza, editor da revista Arts & Architecture, que lhes encomendou este projeto no âmbito de um programa destinado a erguer casas-protótipo da nova tendência de arquitetura mais acessível para mostrar aos seus leitores, o Case Study House Program.

Em pleno boom do pós-guerra, esta residência modular usava componentes industriais já prontos e inovava nos materiais, na construção e no design: dois blocos de aço e vidro (a casa e o estúdio) com painéis de madeira, um interior que parecia prolongar a vegetação exterior, paredes de vidro e portas quase sempre abertas.

“Publicada antes de ser construída”, como recordava há dias a revista Wallpaper, a Casa Eames obteria consagração dois anos depois na publicação A Guide to Architecture in Los Angeles and Southern California. Charles e Ray Eames, que muitas vezes seriam truncadamente identificados como um par de irmãos (homens), estavam disponíveis para mostrar a sua casa no condado de Los Angeles, com vista para o Pacífico, lia-se no guia. E os curiosos chegaram, entre eles o arquiteto britânico Norman Foster e o designer finlandês Eero Saarinen, mas também amigos, como o cineasta Billy Wilder.

Ao longo dos seus 70 anos de vida (Charles e Ray morreram entretanto, em 1978 e 1988, respetivamente), a casa foi sofrendo a passagem do tempo. É monumento nacional norte-americano desde 2006, mas, ainda que “em bom estado, é [um edifício] frágil” como disse ao jornal especializado Art Newspaper Chandler McCoy, o responsável pelo projeto do lado do Getty Institute. O plano de conservação foi precedido de sondagens técnicas conduzidas por uma equipa de conservadores, cientistas, arquitetos e engenheiros para avaliar e resolver problemas mais prementes: metais corroídos, móveis da cozinha amarelados, têxteis e papéis queimados pela exposição solar generosa.

O piso de vinil e amianto estava “gravemente danificado” e tinha perdido a cor verde original – os azulejos foram removidos da sala e substituídos por um novo pavimento, de compósito de vinil, e foi melhorada a resistência à humidade. Os peritos estudaram as várias camadas de tinta para perceber a forma como o casal usava a cor, descobrindo que inicialmente a casa foi pintada de cinzento, cujo pigmento terá sido misturado à mão, o que confirma a história oral da casa. Recomendaram, porque a casa aquece muito, uma proteção contra os raios ultra-violeta. As madeiras dos interiores foram tratadas mas manteve-se, ainda assim, a sua patine. Serão plantados novos eucaliptos, porque o mato atual está lá desde 1880.

A moradia é uma “representação da vida dos Eames como designers”, consideram os responsáveis pelo plano, e por isso mesmo “a equipa começou [por abordar] a história da casa e do seu design, os seus aspectos físicos, e a forma como incorpora o espírito criativo de Charles e Ray Eames”, explica Chandler McCoy.

O projeto de restauro integra o programa de bolsas Keeping it Modern, dedicado à conservação da arquitetura moderna, e está a ser pensado desde 2012 – já em 2011, quando uma exposição esvaziou a sala da Casa Eames para a replicar minuciosamente no Los Angeles County Museum of Art, os netos do casal tinham manifestado publicamente a sua preocupação perante a presença de amianto e o estado do pavimento, por exemplo.

“Charles e Ray Eames eram uma força imparável do design na América de meados do século XX”, lembra a Eames Foundation. A sua “abordagem fresca, do Sul da Califórnia” acabaria por torná-los influenciadores globais multidisciplinares, da arquitetura ao cinema passando pelo design de exposições. Viviam rodeados de obras de arte, de objetos que recolhiam em viagens, de arranjos florais, de têxteis, de artesanato, de brinquedos e claro, do mobiliário que eles próprios desenhavam. A sua casa é o testemunho de uma vida dedicada à humanização do design industrial, como mostra o plano de ação agora adotado.


por Joana Amaral Cardoso in Público | 22 de abril de 2019
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público 

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