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Curador francês Philippe Vergne é o novo diretor artístico do Museu de Serralves

Sucessor de João Ribas vem do Museu de Arte Contemporânea de Los Angeles (MOCA), que dirigiu por quatro anos. 


A sua saída, em maio, após o controverso despedimento da curadora principal da instituição, foi abrupta.

O curador francês Philippe Vergne (n. 1966) é o novo diretor artístico do Museu de Artes Contemporânea de Serralves (MACS). O anúncio foi feito esta quarta-feira pela administração da fundação portuense, que, em comunicado, explica que a escolha do sucessor de João Ribas, que se demitiu do cargo na sequência da polémica em volta da montagem da exposição dedicada a Robert Mapplethorpe, foi feita após um processo de seleção internacional, com entrevistas a candidatos de várias partes do mundo.

Philippe Vergne, acrescenta a fundação, chega agora a Serralves vindo do Museu de Arte Contemporânea de Los Angeles (MOCA), que dirigiu por quatro anos, entre janeiro de 2014 e maio do ano passado. Vai assumir as suas novas funções na instituição portuense no próximo mês de abril.

“Philippe Vergne junta-se a Serralves com um profundo conhecimento da arte e cultura contemporâneas bem como da gestão de museus”, sublinha a administração de Serralves, que classifica o novo diretor como “um notável curador, [que] traz uma visão artística sólida e inspiradora não só para o museu e para a coleção, mas também para o extraordinário património da Fundação de Serralves e do seu parque histórico”.

O novo diretor artístico, refere ainda a presidente da administração Ana Pinho, citada no comunicado, “é internacionalmente reconhecido entre artistas, profissionais de arte e patronos, e a sua nomeação abre um novo e significativo capítulo para Serralves, no excecional momento em que [se celebram] os 30 anos da sua criação”.

Os seus últimos meses à frente do MOCA, porém, não foram pacíficos. Em março do ano passado, Philippe Vergne esteve envolvido no controverso despedimento da curadora principal do museu, a respeitada Helen Molesworth – “uma das mais proeminentes curadoras dos Estados Unidos”, escreve o Artnet –, e dois meses depois a instituição anunciava a saída, “por mútuo acordo”, do seu diretor artístico, cujo contrato ambas as partes terão acordado não renovar.

A sua saída abrupta, conta o Los Angeles Times, foi lamentada por artistas como Ed Ruscha, também membro da administração do museu, que duvidou então que o MOCA pudesse “alguma vez encontrar alguém tão elegante, amigável, urbano e genuíno”. Apesar da turbulência dos meses que antecederam a partida, Philippe Vergne é apontado pela imprensa norte-americana como a figura que ajudou a sanar as finanças da instituição depois das crises severas da década anterior, a reconquistar artistas como Catherine Opie, John Baldessari ou Barbara Kruger para a administração, e a expandir o quadro permanente do museu.

Parte do meio artístico não lhe terá contudo perdoado o seu papel no despedimento de Helen Molesworth, cuja agenda progressista (expôs artistas como o afro-americano Kerry James Marshall ou a brasileira Anna Maria Maiolino) seria do desagrado de alguns mecenas e administradores do museu e, segundo o Artnet, do próprio Vergne. Oficialmente atribuída pelo museu a “diferenças artísticas”, a saída da curadora-chefe do MOCA poderá ter sido uma decisão pessoal do diretor artístico: Catherine Opie, também membro da administração, comentou na altura que o próprio lhe explicou que Molesworth fora despedida “por sabotar o museu”.

A administração de Serralves refere que a escolha do novo diretor “foi assessorada por um grupo de prestigiados diretores de museus, nomeadamente Frances Morris (Tate Modern, Londres),  Jochen Volz (Pinacoteca do Estado de São Paulo), Laurent Le Bom (Museu Picasso, Paris) e os ex-diretores de Serralves Vicente Todolí (Pirelli Hangar Bicocca, Milão) e Suzanne Cotter (MUDAM, Luxemburgo). “O processo foi conduzido de raiz e independente do anterior" concurso internacional de que resultou a nomeação de João Ribas", explicou ao PÚBLICO o assessor de comunicação de Serralves, Fernando Pereira. De resto, a administração refere que os seus assessores "foram unânimes na escolha de Philippe Vergne como candidato excecional para assumir a direção do MACS".

Antes de liderar o MOCA, Philippe Vergne dirigiu por cinco anos o Dia Art Foundation, em Nova Iorque, e foi diretor adjunto e curador chefe do Walker Art Center, em Minneapolis, onde trabalhou durante uma década, tendo integrado a equipa que liderou o plano de expansão da instituição com projeto de arquitetura do gabinete suíço Herzog & de Meuron. Na Europa, Vergne foi o primeiro diretor do Museu de Arte Contemporânea de Marselha, França.

Desde 1992, como diretor ou como curador, Vergne concebeu e organizou exposições em grandes instituições de todo o mundo. Entre elas contam-se a coletiva Let’s Entertain: Life’s Guilty Pleasures (Centro Pompidou, Paris) e as monográficas dedicadas a Carl André (Museu Reina Sofia, Madrid), Yves Klein (Hirshhorn Museum and Sculpture Garden, Washington) ou Huang Yong Ping (Ullens Center for Contemporary Art, Pequim). Em 2006, Vergne foi co-curador da Whitney Biennial do Whitney Museum of American Art, em Nova Iorque.

Paralelamente à intensa atividade curatorial, Vergne é autor de diversos livros, catálogos e ensaios. É licenciado em Direito pela Universidade Pantheon-Assas, Paris II, e em Arqueologia e História de Arte Moderna pela Universidade de Paris IV, Sorbonne.

“Uma notícia muito boa”

Para João Fernandes, subdiretor do Museu Rainha Sofia, em Madrid, uma instituição de referência no circuito da arte contemporânea na Europa, a nomeação é “uma notícia muito boa”. O percurso do francês permite, diz ao PÚBLICO o curador português que foi diretor de Serralves entre 2003 e 2012, acreditar no presente e no futuro do museu. “Fiquei muito contente. Ele tem um trabalho que respeito muito a nível curatorial e trabalhou com instituições sólidas, interessantes, dirigindo algumas delas." Fernandes espera agora que Vergne tenha à sua disposição “todas as condições” para criar “um bom programa”, capaz de desafiar artistas e públicos.

Já o professor e ex-diretor artístico do Museu Coleção Berardo, Pedro Lapa, enuncia que não “conhece bem” o trabalho de Philippe Vergne, embora tenham contactado no contexto da programação de uma exposição que não viria a realizar-se. “Ele esteve no museu de Los Angeles, que atravessou um período difícil, perdendo relevância, desde que saiu o Paul Schimmel, um fantástico diretor, mas não conheço em detalhe o seu trabalho para poder fazer um balanço”, afirma.

Do que Pedro Lapa não tem dúvidas é que os contextos são relevantes. “Os EUA são diferentes da Europa, e no interior desta, uma coisa é a Alemanha e outra Portugal, por exemplo.” Na sua visão, não está em questão o nome de Philippe Vergne, nem o facto de ser estrangeiro, embora de uma forma genérica sublinhe que se impõe uma reflexão: “É importante ter um bom conhecimento dos contextos para pensar no posicionamento local em relação ao resto do mundo. E o problema é que se tem vindo a criar uma situação, puramente funcional e burocrática, de curadores que vão saltando de cidade em cidade, como se fosse tudo igual. Claro que podem ter boas ideias. Mas também existe o perigo de se estar a promover a homogeneização, o que acaba por não ser o caminho mais significativo para uma instituição portuguesa que tem necessidade de repensar a importância do global no local e do local para o global.”

Essa capacidade, diz, tem vindo a perder-se “com opções puramente empresariais dos conselhos de administração dos museus e com a importação permanente de modelos empresariais que não têm nada que ver com o papel e a missão dos museus”. Pedro Lapa admite “que há grandes profissionais, com muito mérito, que fazem carreiras internacionais” relevantes, por estarem “por dentro de um sistema que funciona segundo essas regras empresariais”, mas salienta que “lhes falta por vezes o empenho e o saber gerir certo tipo de questões locais”.

Questionado sobre o que significa para Serralves ter um curador com este percurso internacional disposto a assumir a sua direção artística num momento delicado para a instituição, João Fernandes responde: “Serralves tem um excelente passado, tem excelentes memórias construídas. Tem as coleções, tem a arquitetura e tem todas as condições físicas. É um museu onde pode ser muito aliciante trabalhar.” E tendo este passado, acrescenta, “tem, naturalmente, um presente e um futuro a construir”.

E será a nomeação de Philippe Vergne um bom desfecho para o clima de instabilidade criado com a saída de João Ribas, em rutura com a administração? “Espero que seja. Eu desejo que seja.”

A escolha do novo diretor vem preencher o vazio deixado pela saída de João Ribas, há cinco meses, período durante o qual o MACS foi dirigido interinamente por Marta Almeida, que em Abril voltará a ocupar o cargo de diretora adjunta. 


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