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Ao fim de quarenta anos, o Citemor tenta vislumbrar um futuro
Regresso ao quadro de apoios estruturais da DGArtes permite que festival volte a ter residências artísticas.
Depois de anos sob a pressão da precariedade e da incerteza, o Citemor recupera parte do que se perdeu nesse período em que os apoios públicos oscilaram entre a escassez e a inexistência. A 40.º edição do festival de artes performativas de Montemor-o-Velho começa esta quinta-feira e vai até 11 de agosto, voltando assim à sua época natural, após um ano de 2017 em que o calendário de atribuição de apoios da Direção-Geral das Artes (DGArtes) empurrou o Citemor para novembro e dezembro.
O anúncio de que a DGArtes voltaria a atribuir apoios estruturais ao festival em 2018 ajudou a “dar sentido a todo o esforço realizado” nos últimos anos, afirma ao PÚBLICO o diretor artístico do Citemor, Armando Valente. “Se não tivesse havido este resultado, o trabalho desta equipa teria ficado por aqui. Não havia condições para continuar o projeto”, refere, descrevendo os últimos seis anos como “um esforço de resistência brutal que era impossível prolongar”.
Por isso, ao fim de quatro décadas, o Citemor “tenta vislumbrar um futuro”, sendo que o apoio da DGArtes é válido para esta e para a próxima edição. Tantos os criadores como as propostas que vão a Montemor este ano espelham essa tentativa de um festival que tenta dialogar com a sua história. “Saímos de um período particularmente difícil, em que o festival esteve à beira da extinção e em que perdemos apoios estruturais”, descreve Armando Valente, que desvaloriza a condição redonda do número 40. “Não entrámos no espírito comemorativo”. A direção artística está mais preocupada “em recuperar a capacidade de produção e recuperar as suas dinâmicas artísticas”, seja de residências ou de produção, que se foram diluindo nos anos da crise. O festival tenta assim “reerguer-se”, após “um período esmagador, que teve também efeito noutras estruturas”.
O regresso a um ponto de algum equilíbrio nos apoios permite ao Citemor recuperar a sua atividade de residências artísticas iniciada em 1992 e cuja regularidade se manteve até 2013. O Citemor volta assim a um programa que faz parte da história das artes performativas portuguesas.
“Apesar do apoio não ser extraordinário, permite ao festival reforçar um pouco as suas dinâmicas, retomar as residências ao longo do ano e co-produzir o programa que apresenta”, descreve Armando Valente.
Quatro projetos da programação deste ano foram desenvolvidos em residência artística: Cuaderno de Trabajo, da artista catalã Angélica Lidell; Viagem Sentimental # Montemor-o-Velho, do coreógrafo Francisco Camacho; Imprenta Acústica en (14 Borrones de una) Aparición da bailarina e coreógrafa espanhola Mónica Valenciano e Pontes de Sal, do Teatro do Vestido.
O projeto do Teatro do Vestido consistirá apenas numa “apresentação informal”, uma primeira fase do trabalho, explica o diretor artístico, sendo que a estreia do espetáculo está marcada para a próxima edição do festival. A programação de 2019 já está “desenhada e estabilizada”, algo que o programa de apoio de dois anos tanto permite como exige. Não há ainda financiamento assegurado para os anos seguintes, mas a equipa do Citemor tem “frentes de discussão aberta para perspetivar o projeto”. A preocupação, assegura Armando Valente, é “assegurar a existência deste festival”.
A programação deste ano é também feita de regressos, para além de Angélica Lidell (que esteve pela terceira vez em residência artística), do Teatro do Vestido e de Francisco Camacho, Rafael Alvarez e Márcia Lança (que apresenta Nome, com Carolina Campos) reatam a relação com Montemor.
O Citemor começa nesta quinta-feira com um concerto de I-VO, nome adotado por Ivo Dimchev para a sua faceta musical. Com um trabalho desenvolvido na fronteira entre performance, dança, teatro, música, ilustração e fotografia, o artista búlgaro abre o festival no palco do Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra. A 11 de agosto, Luís Severo encerra a programação o Citemor também com música, num concerto na Garagem Auto-Peninsular da Figueira da Foz.
Diana Gadish, Inês Campos, Paula Digo, João Fiadeiro e uma extensão do Loops. Lisboa completam a programação de um festival que mantém a extensão territorial dos últimos anos, com apresentações em vários pontos do eixo Coimbra, Montemor-o-Velho e Figueira da Foz. Continua a ser o espectador a definir o preço dos bilhetes de cada espetáculo.
por Camilo Soldado in Público, 19 de julho de 2018
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público