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Descoberto inédito de José Saramago

O 6º Caderno de Lanzarote, que Saramago já anunciara em entrevistas, ficou esquecido com a confusão dos anos que se seguiram ao anúncio do Prémio Nobel. Sai a 8 de outubro.

O escrirtor José Saramago esqueceu-se de um 6º Caderno de Lanzarote © José Carlos Carvalho/Globalimagens


A palavra "digna" é a última a ser impressa no inédito de José Saramago descoberto em fevereiro. Uma palavra que não se refere a questões políticas ou sociais, mas porque na entrada final deste Último caderno de Lanzarote o escritor conta que estava a comprar umas meias numa loja e foi reconhecido por uma leitora enquanto se baixava para as experimentar, daí que refira que "não estava numa posição muito digna".

Este inédito estava no segredo dos deuses desde a sua descoberta e só foi anunciado hoje, às 15.30, em Portugal pela presidenta da Fundação José Saramago, Pilar del Río, e pelo editor da Porto, Manuel Alberto Valente. Uma revelação que foi feita a nível mundial através de uma comunicação conjunta e à mesma hora pelas editoras espanhola e brasileira, entre outras, do escritor.

O mais estranho - e inédito! - é que este 6º Caderno já tinha sido referido pelo escritor em várias entrevistas, mas com a confusão à sua volta após a Academia Sueca o ter declarado Prémio Nobel da Literatura de 1998, o único até hoje da língua portuguesa, terá ficado no esquecimento. Até porque o escritor continuou a escrever estes Cadernos nos meses que faltavam para terminar o ano do Nobel.


O antigo jornal A Capital tinha mesmo publicado uma notícia a 21 de dezembro de 2001 que titulava "José Saramago retoma Cadernos de Lanzarote" baseada numa notícia da Lusa em que a Editorial Caminho revelava que ia "retomar no início de 2002 a edição dos Cadernos de Lanzarote, interrompida em 1998 (...). José Saramago também confirmou que "se tudo correr bem" deverá ter pronto um novo romance [Caverna]". Três dias antes, vários jornais espanhóis tinham também feito o mesmo anúncio: "Haverá uma última (entrega de Cadernos de Lanzarote) em que Saramago está a trabalhar e que terminará em 1998, o ano do "seu" Nobel."

Um mistério que não era mistério

Segundo Pilar del Río, que conhece extremamente bem a obra do autor, foi uma grande surpresa: "Estava uma pasta no seu computador com os Cadernos de Lanzarote que nunca tinha sido aberta. Quando Fernando Gómez Aguilera precisou de confirmar um dado no livro que está a preparar sobre as conferências de Saramago foi consultar a pasta e, ao abrir o arquivo, deparou-se com os originais dos Cadernos 1 a 5 mas também com mais dois: o 6 e o 7."

Pilar garante que considerava que nada mais havia de inéditos e ficou boquiaberta: "Pensava que estava tudo publicado." E, como não fazia há vários anos, passou a madrugada a ler o que o marido deixara escrito". Porquê só 20 anos depois pergunta-se? "Só posso dizer que foi com muita perplexidade que me dei conta de que ninguém se tinha apercebido da existência deste livro: a tradutora (a própria Pilar), o editor e o autor."

A partir do momento da descoberta comunicou com os editores - português, espanhol e brasileiro - e chegou-se à conclusão de que outubro seria o momento mais adequado para apresentar o inédito aos leitores pois perfaz duas década sobre o anúncio do Nobel. Um livro que vai conter todos os escritos de 1998, o referido sexto volume, sendo que o sétimo, como corresponde a duas únicas entradas, será integrado neste único livro.

Apesar de por enquanto não ter sido revelado o conteúdo do sexto e último original do Nobel da Literatura, Pilar del Río revelou que este Caderno descreve o ano de 1998, edição a que serão acrescentadas mais duas entradas do ano de 1999. Ou seja, os meses que antecedem o anúncio pela Academia Sueca e as semanas de uma roda-viva nacional e internacional após o anúncio.

Para os que gostam de Saramago este livro será o melhor momento para se conhecerem as primeiras reações pessoais do escritor perante o galardão, bem como os momentos que viveu até ao fim do ano e na deslocação a Estocolmo para receber o Nobel.

20 anos sobre o Nobel esquecidos oficialmente

Para Manuel Alberto Valente, o atual editor da obra de José Saramago, a razão deste esquecimento também só pode ter sido a repercussão do Nobel: "A vida transformou-se com o Nobel e o tempo disponível foi menor." Pilar acrescenta que "o original é muito representativo do método de trabalho do escritor. Há dias muito significativos, outros sem anotações. Mas, emocionei-me profundamente com várias partes, como aquelas em que faz questão de registar os nomes dos jornalistas a quem deu dezenas de entrevistas. Ou quando anotava "ler jornais" para depois recriar esses dias."

Uma coisa é certa, diz Pilar, "há menos de vida pessoal; não conta quando andava a arranjar o chão da casa como fez no primeiro volume, e tem um grande posicionamento cultural e ético muito relacionado com o continente americano, designadamente sobre o Brasil, México, Argentina, Uruguai ou a Colômbia, entre outros países".

O editor aproveitou a oportunidade para questionar as autoridades oficiais portuguesas, como o Ministério da Cultura, para o descaso na comemoração dos 20 anos sobre a entrega do Nobel: "Ironicamente estamos num ano em que não vai haver Nobel e é a melhor razão para se comemorar José Saramago". Acrescentou: "Não tenho conhecimento de que esteja preparada uma celebração nacional... Pode ser que sim mas se existir está em segredo." Manuel Alberto Valente recordou que esse esquecimento já se verificou na Feira do Livro de Lisboa e parece que se irá repetir na Feira do Livro de Frankfurt."

O editor confirmou que em data próxima será anunciado o programa com que a Porto Editora pretende celebrar os 20 anos sobre o Nobel da Literatura.

Quanto a Pilar del Río, questionada pelo apagamento de eventos oficiais, optou por não responder, preferindo elencar vários eventos promovidos pela Fundação, como o lançamento de um "thriller" de Ricardo Viel sobre os dias que antecederam e sucederam ao anúncio do Nobel, bem como um volume com entrevistas e textos de Anabela Mota Ribeiro, um álbum com 1000 fotografias em Lanzarote, a estreia mundial de uma obra de António Pinho Vargas composta para celebrar o Nobel e a Carta dos Direitos Humanos, encontros internacionais no México, Sófia, Praga, Washington, todas estas iniciativas previstas para o último trimestre do ano.


por João Céu e Silva in Diário de Notícias | 3 de julho de 2018
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Diário de Notícias

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