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FITEI encena a falta de poder das minorias, dos pobres, dos habitantes do sul
Festival de teatro de expressão ibérica decorre de 12 a 22 de junho, e desdobra o calendário até setembro e outubro.
“Não queremos chegar ao poder, mas queremos que ele seja mais bem distribuído”. A meio da conferência de imprensa de apresentação, esta quinta-feira, do programa do próximo Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica (FITEI), o seu diretor artístico, Gonçalo Amorim, explicava assim um dos sentidos do tema escolhido para a edição deste ano do festival – os empoderamentos.
No programa distribuído à comunicação social presente no Teatro Municipal Rivoli, o conceito já estava explicado na sua versão mais ampla. Trata-se de “dar poder a quem normalmente não o tem: à mulher, às minorias étnicas, ao pobre, ao habitante do sul da Europa, ao habitante do sul do mundo, ao indígena e a muitos outros exemplos que nos obrigam a refletir e a reequacionar a ideia de centro e de periferia, assim como a própria ideia da verticalidade hierárquica”.
Falando, a seguir, da situação mais concreta do FITEI e das condições gerais de produção teatral no Porto, Gonçalo Amorim não fugiu ao tema que tem marcado os últimos tempos. O festival, que agora vai chegar à 41.ª edição – e que pela sua programação criteriosa “tem conseguido morder os calcanhares dos festivais internacionais da primeira divisão”, reclamou o diretor –, viu-se excluído da primeira lista de apoios da Direcção-Geral das Artes, protestou, e acabou por ver-se apoiado apenas para dois anos – mesmo se, no final, o apoio atribuído (203 mil + 224 mil euros) “triplicou o valor dos anteriores”, reconheceu Amorim.
Ficaram, contudo, algumas sequelas, e a mais notória foi a necessidade de diferir para os meses de setembro e outubro alguns momentos da programação: atividades formativas e produções estrangeiras, como Correo, da chilena Paula Aros Gho (que estenderá, pela primeira vez, o festival a Vila Nova de Gaia, ao Convento Corpus Christi), ou a residência artística do argentino Federico León – porque “aos estrangeiros não podíamos pedir para se pagar mais tarde”, justifica o diretor.
Mas é com uma co-produção brasileira, “um dos melhores espetáculos do ano passado”, Caranguejo Overdrive, que Marco André Nunes encenou para a Aquela Cia., que o 41.º FITEI abre a agenda de presenças internacionais no programa (Rivoli, 13 de junho), numa ficção sobre o estado atual da cidade do Rio de Janeiro.
Duas outras produções internacionais destacadas pelo programador foram A House in Asia, da companhia espanhola Agrupación Señor Serrano (Teatro Constantino Nery, Matosinhos, 15 de junho), uma espécie de western cénico recheado de ironia a comparar a captura de Bin Laden pelo exército dos Estados Unidos com a do índio Gerónimo, em 1886, no final da Guerra Apache; e Mendoza, dos mexicanos Los Colochos (Teatro Nacional São João, 20 de Junho), uma atualização do Macbeth shakespeariano ao contexto da revolução mexicana de 1910, e que – notou Gonçalo Amorim – foi considerada pela crítica “o espetáculo do ano em Espanha”, em 2017.
Regresso a Lulu
Num calendário de dez dias preenchido com mais de duas dezenas de espetáculos, um momento forte da produção portuguesa – já assinalado, de resto, quando da apresentação da temporada do TNSJ – será a estreia da co-produção com este teatro nacional Lulu, numa encenação de Nuno M Cardoso (Teatro Carlos Alberto, 13 de Junho). O próprio encenador esteve no Rivoli a prometer que esta sua adaptação de textos do alemão Franz Wedekind, que aborda temas como o sexo, o dinheiro e o lugar da mulher nos dias de hoje, “vai ser um espetáculo extraordinário, belíssimo e magnífico”.
Gonçalo Amorim destacou ainda quatro estreias portuguesas no feminino, de outras tantas jovens encenadoras, três delas em co-produção com o Teatro Municipal do Porto. São elas Longe, de Raquel S. (que abrirá o FITEI no Teatro do Campo Alegre, a 12 de junho); De Onde Vens?, de Ana Luena, a partir da escrita alegórica de Mohammed Dib (Rivoli, 16 de junho); Bela Adormecida, de Diana de Sousa (Rivoli, 21 de Junho), um espetáculo sobre a maturação feminina baseado no imaginário do clássico popularizado pelos irmãos Grimm; e também, a assinalar os 65 anos de história do Teatro Experimental do Porto (TEP), Teoria das Três Idades (Rivoli, 18 de junho), que Sara Barros Leitão encenou a partir dos arquivos da companhia fundada por António Pedro.
Referência ainda para a nova produção do encenador-cineasta Marco Martins, que por estes dias se encontra em Great Yarmouth, no leste da Inglaterra, a realizar Provisional Figures (Rivoli, 15 de junho), convocando uma dezena de emigrantes portugueses a mostrar como vivem nesta região em que recentemente encontraram emprego nas grandes fábricas de transformação alimentar.
O programa do 41.º FITEI vai ter também concertos – por exemplo, com o cabo-verdiano Julinho da Concertina (sede do Guindalense Futebol Clube, 16 de junho), oficinas de dramaturgia, workshops, conferências, debates… e, finalmente, a edição do livro comemorativo dos 40 anos do festival, que chegou a ser anunciado para a edição do ano passado.
por Sérgio C. Andrade in Público | 24 de maio de 2018
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Público