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Restauro do manto da rainha D. Amélia
Grupo de Amigos do Museu dos Coches está a angariar fundos para recuperar o brilho de um dos tesouros de Portugal. O manto foi oferecido a D. Amélia pela cidade de Paris aquando do casamento com D. Carlos.
É preciso subir ao primeiro andar do antigo Picadeiro do Palácio Real de Belém, onde entre 1905 e 2015 esteve instalado o Museu dos Coches, e ir mesmo até ao fundo, até ao canto do lado esquerdo para, numa vitrina, se descobrir o único tesouro nacional do museu que não é um veículo. Aí está o manto rosa, bordado a prata, que a cidade de Paris ofereceu a D. Amélia, por altura do seu casamento com D. Carlos I. E que em 1936 a fundadora do museu doou à instituição que criara. Foi o simbolismo da peça que levou o Grupo de Amigos do Museu Nacional dos Coches a apostar no seu restauro, lançando para uma campanha de crowdfunding que pretende angariar seis mil euros, o valor necessário para atenuar os sinais dos tempos que se instalaram no veludo e na prata.
Impossível deixar de perguntar a Silvana Bessone, diretora do museu público mais visitado em Portugal (350 mil visitantes em 2017) se não dispõe de orçamento que permita avançar com a quantia de seis mil euros para garantir o restauro e conservação deste tesouro nacional. A resposta não podia ser mais clara: "Não." E Isabel Raposo Magalhães, que no ano passado fez renascer o Grupo de Amigos deste museu, dá uma achega: "O museu nem sequer tem conservadores-restauradores nos seus quadros."
Enquanto decorre a campanha, lançada no final de 2017 mas que ainda só reuniu 360 euros, avança-se com o trabalho técnico. Com o apoio do Laboratório José de Figueiredo, a conservadora-restauradora Madalena Serro e a coordenadora do departamento de Conservação do museu, Rita Dargent, elaboraram já um relatório técnico que serve de ponto de partida a esta intervenção.
Tanto quanto se sabe, o manto foi usado apenas duas vezes pela rainha. "Usou-o em pouquíssimas ocasiões, porque ele é pesadíssimo", explica Maria Ana Bobone, conservadora do museu. E especifica: "Usou-o numa ocasião muito importante, na entrega da Rosa de Ouro, uma distinção atribuída pelo Papa [Leão XIII], numa cerimónia na Capela das Necessidades [a 4 de julho de 1892]. Sabemos que voltou a usá-lo numa receção de gala realizada no Palácio da Ajuda para comemorar o décimo aniversário do filho mais velho [príncipe D. Luís Filipe]."
Apesar do pouco uso e de estar fechado numa vitrina, o relatório técnico lista várias maleitas: no veludo, regista "alteração e degradação do pelo", que está manchado, ressequido e muito frágil, apresentando "perdas de material, lacerações diversas, acumulação de poeiras, podendo ser identificadas várias intervenções"; quanto ao bordado, os "elementos metálicos do bordado estão muito oxidados, originando uma decoração enegrecida e acumulação de poeiras".
Por isso, Madalena Serro explicou ao DN que este vai ser um trabalho moroso "em que cada ponto é uma ciência". "O pelo perdido não há como recuperar. Mas hidratando as fibras pode ser que consigamos atribuir alguma elasticidade extra ao pelo que ainda existe, prevenindo a sua perda futura. As zonas com lacerações têm de ser reforçadas, com suportes e fios de seda com pontos de agulha, iremos tentar limpar o fio metálico, tentando atribuir algum brilho extra, mas nunca iremos recuperar o dourado original. Essa é uma tarefa impossível, infelizmente." Após a intervenção, o manto deverá ser exposto num outro suporte e num local onde ganhe maior protagonismo.
Esta é a primeira campanha do Grupo de Amigos do Museu dos Coches, que após a sua reativação no segundo semestre de 2017 conta com cerca de centena e meia de elementos. Na página do Facebook vão divulgando as atividades que realizam regularmente, como as visitas guiadas ao museu, às segundas-feiras, dia em que está encerrado ao público. Uma experiência que inclui não só a exposição do museu mas ainda os 1050 metros quadrados da área de conservação e restauro, bem como as reservas, de onde saem histórias a cada armário ou gaveta abertos pela coordenadora do departamento, Rita Dargent. A quota anual do grupo são 25 euros e, para além de dar acesso a estas visitas e outras atividades, como o Open Day, realizado em outubro, garante entrada gratuita nos museus e monumentos geridos pela Direção-Geral do Património Cultural.
por Marina Marques in Diário de Notícias | 23 de janeiro de 2018
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Diário de Notícias