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Novo Astérix de Ferrix e Conradix até parece um dos antigos

Os sucessores de Goscinny e Uderzo estiveram em Lisboa para apresentar o novo álbum de Astérix e Obélix. O gaulês gordo é a vedeta desta aventura.

Coronavirus é um dos novos personagens de Astérix e a Transitálica | DR

Poucos são os livros que chegam às livrarias de quase todo o mundo e raros os que atingem cinco milhões de exemplares na edição de lançamento. Então, se for um álbum de banda desenhada ainda é mais improvável, como é o caso do novo álbum da dupla Astérix e Obélix, Astérix e a Transitálica, que teve um número infinitamente inferior, seis mil, na primeiríssima edição em 1961.

O álbum sai hoje em França e Portugal em simultâneo e por essa razão a dupla dos atuais criadores - que sucede a Goscinny e Uderzo - veio a Lisboa promover o Transitálica excecionalmente. Agora, segue-se a publicação em mais 23 países, somando novos milhões aos 370 já impressos desde que em 1959 este herói foi criado para sair na revista Pilote e dois anos depois reproduzido no nosso país na revista Foguetão, sendo só em 1967 que o primeiro álbum, Astérix, o Gaulês, saiu em português.

Jean-Yves Ferri e Didier Conrad, respetivamente os novos argumentista e desenhador, observaram a edição portuguesa com toda a atenção. Gostaram do que viram e estavam bem-dispostos para a primeira conversa sobre o seu terceiro Astérix. Quarenta minutos antes leu-se o único exemplar que estava fora dos cofres da editora de modo a poder fazer-se a entrevista.

A dupla comporta-se como se fossem eles próprios personagens da aldeia gaulesa onde vivem os destemidos heróis e interrompem a conversa ora em cochichos ora em piadas próprias de quem se chamasse Ferrix e Conradix...

Estavam curiosos em saber qual era a primeira opinião sobre a nova aventura e aceitam quando se lhes diz que o único problema é o de a história precisar de mais algumas páginas para não terminar quase abruptamente. Concordam, e Ferrix garante que sentiu essa falta de espaço ao não poder ultrapassar as 48 páginas que o livro pode ter. Aproveita-se para perguntar se Astérix nunca terá um álbum duplo ao longo da sua existência e percebe-se que lhes agradaria a ideia, mas logo confessam que "os editores jamais autorizariam". Dão como exemplo a necessidade de um outro autor, Edgar P. Jacobs, o ter feito nos álbuns de Blake e Mortimer, mas o assunto fica por aí.

O que traz de novo este Astérix e a Transitálica? Uma coisa se pode dizer, lê-se à velocidade da corrida que serve de suporte à história. Conta-se só um pouco: as estradas do império romano estão cheias de buracos, situação que o "ministro" responsável nega e, em desespero, anuncia uma prova automobilística por todas as províncias de Itália para mostrar que as vias romanas estão transitáveis. Quando César sabe do evento, só tem uma exigência: o vencedor tem de ser um romano e nunca um bárbaro conquistado. É aqui que surgem Astérix e Obélix, ou melhor dizendo, o segundo com grande destaque, pois desta vez é ele o principal herói da história.

A partir daqui, estamos na página 8, nada mais se revela, apenas que se lê de uma penada até ao fim, deixando o leitor curioso sobre o que vai acontecer nas quatro dezenas de páginas que se seguem.

É preciso prestar muita atenção para se perceber que este Astérix é desenhado por Conradix, porque o estilo de ilustração está muito próximo do de Uderzo. A juntar à grande fluidez do argumento está um traço que faz esquecer que estamos perante um trabalho dos sucessores, de tão conseguido. Conradix confirma: "Sim, estou cada vez mais à vontade a desenhar." Ferrix completa: "O desenho está muito mais livre porque sentimos menos inquietude por participar no mundo Astérix. É preciso não esquecer que ele é um símbolo da França. Ainda por cima, Uderzo usou vários estilos ao longo da sua vida e nós tínhamos de optar, e fizemo--lo pelo registo que era o mais desabrido."

Também existem situações novas no argumento de Ferrix, pois nota-se a presença de mais personagens femininas com um papel ativo na história, bem como de uma fuga ao cenário tradicional da aldeia gaulesa, não desaparecendo o habitual jantar que celebra o regresso de Astérix e Obélix - e Ideafix, claro -, com o bardo amordaçado para não cantar. Ferrix avisa que a única dificuldade foi encontrar símbolos para representar a Itália daquela época, pois a maioria das referências que identificam o país são as do Renascimento.

Entre as novas personagens está Coronavírus, um condutor mascarado que criará muitas surpresas; pela segunda vez surge um lusitano; e existem temas que jamais entraram em qualquer dos 37 álbuns da série, como é o caso da globalização e das referências às diferenças entre os povos do Sul e do Norte da Europa, bem como o cenário da Península Itálica, próprio para mostrar que Roma dominava várias culturas e sociedades, nem sempre satisfeitas com esse poder central.

Astérix e Obélix já tinham estado em Roma (Astérix Gladiador e Os Louros de César), mas nunca fora dessa capital, em convívio com vénetos, úmbrios, etruscos, oscos, messápios, apúlios. "A Itália não se resume a César, a Roma e ao Coliseu! Demo-nos conta de que já era tempo de Astérix e Obélix ficarem com uma ideia mais exata sobre aquilo que era verdadeiramente a Itália", explicam Didier Conrad e Jean-Yves Ferri. Além de que esse cenário geográfico, diz Conradix, foi uma homenagem a Uderzo, nascido em Itália: "Obélix era de quem mais gostava, portanto era lógico fazer dele a vedeta."

Quanto ao papel importante que César tem neste livro, Conradix considera impossível de fugir: "A história passa-se nos territórios governados por Roma e ele defende o seu campeão." O mesmo refere em relação à inovação que é a presença das personagens femininas com mais força de sempre: "É muito bom desenhar mulheres e demos um papel muito importante a duas "amazonas" que conduzem uma das quadrigas em competição." Quanto aos lusitanos presentes, reclama-se do pequeno papel, mas Ferrix responde que "têm vindo a ganhar papéis cada vez maiores e desta vez terão uma recompensa muito importante no final".

Para ambos os autores é necessário "ter muito cuidado na escolha dos temas porque Astérix já esteve em todos os lados e em todas as situações". Ferrix acrescenta que a opção em Transitálica era "fazer um álbum diferente do anterior, que tinha um tema muito sério - o controlo da informação - e desta vez quisemos mais diversão".

Para Conradix, esta é uma das "raras séries de banda desenhada que podem ser lidas e relidas através de gerações sucessivas. Creio que há cada vez mais jovens leitores apesar de terem outros meios que os de antigamente não possuíam". Ferrix acrescenta que "as séries antigas funcionam melhor nas continuações que estão a ser feitas por sucessores e vemos muitos jovens nas nossas apresentações. É preciso fazer a história de modo a que eles a compreendam.

A meio da conversa pergunta-se a Ferrix e a Conradix como nasceu a ideia para este álbum. A resposta do desenhador é desconcertante: "Estávamos no Festival de Locarno e convivíamos com pessoas que vinham de várias locais e que contavam a sua história com paixão. Então, surge a ideia de colocar Astérix e Obélix entre os povos da Península e mostrar as diferenças entre os que Roma queria pacificar."

Mais uma vez, este novo álbum mantém uma periodicidade de saída a cada dois anos. Como é que se faz um álbum neste período, principalmente quando o desenhador vive no Texas e o argumentista em França? Conradix garante que não é assim tão complexo e Ferrix brinca, mais uma vez, ao dizer que ainda bem que "não são obrigados a conviver". Segundo Conradix, "todo o trabalho de preparação é feito durante a promoção - como esta em que estamos -, porque vivemos juntos a maior parte destes dias, pelo menos um mês. Depois, trocamos ideias por e-mail ou por Skype e resolvemos os problemas. Dois anos é o tempo necessário para fazer um novo Astérix".


por João Céu e Silva, in Diário de Notícias | 19 de outubro de 2017

Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Diário de Notícias

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