Notícias
Bem-vindo à Lisboa de portas abertas (só por dois dias)
São 87 espaços, 30 deles nunca antes incluídos, que no próximo fim de semana recebem a Open House Lisboa. O melhor é preparar a visita.
Se nunca passou pelo número 98 da rua Presidente Arriaga, em Lisboa, junto às Janelas Verdes, procure-o no Google Maps. Só para constatar que não faz ideia do que se esconde por detrás daquela porta. Todavia, e porque o Open House regressa no próximo fim de semana, poderá entrar naquela casa privada que ganhou o nome da rua: o Apartamento Arriaga.
Este é um dos 87 espaços que estarão abertos a quem os queira visitar nos próximos sábado e domingo, com entrada livre, em toda a cidade de Lisboa. Dos 87 espaços, entre palácios, museus, hotéis, ou teatros, 37 abrem as portas pela primeira vez nesta iniciativa que acontece já em 36 cidades do mundo. E mais: bateram-se os recordes das cinco edições anteriores neste Open House que, pela primeira vez, teve as irmãs e arquitetas Catarina e Rita Almada Negreiros como comissárias.
É com elas, netas "do Almada", que entramos no apartamento do também arquiteto Paulo Albuquerque Goinhas, da sua mulher Maria do Carmo, e da pequena Laura, que ainda não tem idade para perceber porque é que aquela sua nova casa deixava embasbacado o grupo que por ali entrava, entre José Mateus, presidente da Trienal de Arquitetura (responsável pelo Open House), Joana Gomes Cardoso, presidente da Empresa de Gestão de Equipamentos e Atividades Culturais (EGEAC) da Câmara Municipal de Lisboa, jornalistas, ou o intérprete de língua gestual, sinal óbvio da inclusão que marca esta sexta edição, que tem um programa paralelo para pessoas com deficiências auditivas, visuais, ou cognitivas. Mas lá iremos. Por agora, a casa (uma das oito que fazem parte do programa) por onde todos começámos imediatamente a deambular. De tal forma que Paulo teve de pedir que esperássemos um pouco, para que o ouvíssemos primeiro. Começou por fazer um elogio ao Open House: "A melhor exposição de arquitetura que existe." Depois falou daquela casa que outrora era cheia de pequenas divisões e por onde agora a luz perpassa a ampla sala, vinda do pátio, até aos quartos onde, por baixo do estuque, eles encontraram pinturas na parede.
O chão da cozinha é constituído por pedras que eles próprios, marido e mulher, foram buscar às pedreiras. Dispuseram-nas depois no puzzle aqui claro ali escuro que os nossos pés pisavam a caminho do pátio. A grande porta de madeira presa à parede esconde uma pequena despensa. A origem dos azulejos que rodeiam a abertura da chaminé variam: alguns já lá estavam, outros foram comprados por eles. Depois o pátio, que visto da janela da banheira se avista verdejante, com o sol a bater na parede branca. Maria do Carmo explica ao DN que o processo de reabilitação da casa durou "quase dois anos".
Quando chegamos ao pátio, Paulo está a explicar que descobriram uma cisterna sob uma chapa que estava no chão. Levanta a proteção envidraçada, e quem ali estava debruçou-se para ver a parte subterrânea do Apartamento Arriaga. O arquiteto diz: "É um espaço muito bonito, abobadado. Vai até à parede da cozinha. No Open House podia-se pôr aqui umas escadas..." Um pormenor cómico, antes do fim da visita: uma mesa da cozinha, virada para o pátio, está exatamente no mesmo sítio que estava antes "de uma obra que revolucionou tudo" naquela casa cuja data de construção não é conhecida. "O registo mais antigo que encontrámos é de 1840", explica o arquiteto que propôs ele mesmo a sua casa ao Open House, algo que é comum acontecer.
Um roteiro entre muitos
A paragem seguinte não ficava longe: a nova sede EDP, projetada pelos arquitetos Aires Mateus. Mas antes ainda de entrarmos naquele espaço que quis criar uma praça pública na avenida 24 de julho, e por onde de todos os ângulos parece vir luz: outras sugestões. Se não quiser sair da zona do Apartamento Arriaga, pode visitar o MAAT (Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia), o Palácio Nacional da Ajuda (onde pode ver a coleção portuguesa de Miró sem pagar), ou a Gare Marítima do Conde de Óbidos. Se for para outras paragens, digamos, o Príncipe Real, apresentamos-lhe uma das "meninas dos olhos" das comissárias, Catarina e Rita: o Palacete Barão de Santos.
"É um palacete do século XIX que esta a ser reabilitado de uma forma inacreditável, com tempos que hoje em dia já não são comuns na nossa arquitetura. É quase uma arquitetura do século XIX, mas com arquitetos contemporâneos a intervir no espaço de uma forma muito correta. É uma obra que ainda não está terminada, mas isso quase que a torna mais interessante, porque revela os métodos construtivos que estão a ser usados", diz Catarina, explicando que o palacete está a ser dividido em quatro frações. Rita completa a irmã: "Era só uma habitação. É inacreditável, e muito bom porque não é um projeto que procure uma rentabilidade. É para um cliente final - não para uma venda posterior - que tem tempo e dinheiro, e gosta de investir em arte e em arquitetura. É um dos tesouros."
Ainda naquela zona, pode fazer uma visita ao subsolo do Príncipe Real, visitando a câmara de pedra do Reservatório da Patriarcal. E uma última sugestão: o laboratório químico do Museu Nacional de História Natural e da Ciência.
De volta à EDP, edifício onde trabalham atualmente cerca de 800 pessoas, as comissárias lembram que este é um dos apenas seis novos espaços que compõem o cardápio arquitetónico do Open House. "Existe um cuidado nos edifícios novos que apresentamos que achámos muito interessante. Tem que ver com a reabilitação da cidade", explica Rita Almada Negreiros.
É Francisco Caseiro, arquiteto do ateliê Aires Mateus, quem faz a visita guiada. Tal como fará no sábado às 14.00, para quem quiser assistir. Fala daquelas duas torres perpendiculares ao rio da obra em que "cada linha atravessa o edifício de uma ponta à outra". Descemos depois até à entrada, onde tudo foi erguido em betão. O átrio, assim como a cafetaria, podem ser usados por qualquer pessoa estranha à EDP. Visitaríamos depois o auditório, cuja "ideia era ser uma caixa de madeira", explica o arquiteto, com capacidade para mais de 300 pessoas. Aqui e ali, num e noutro corredor ou esquina, obras de artistas portugueses. O azul de José Pedro Croft num quadro, uma instalação de João Louro na cafetaria. "É a molécula do café", explica Fernando Santos, diretor da EDP Imobiliária. Não visitámos o ginásio nem os escritórios onde trabalham os funcionários, porque era um dia de semana. Algo que não acontecerá no próximo fim de semana.
Neste ano, além de novos espaços, há um novo programa: o Plus, que inclui portadores de deficiências visuais, auditivas ou cognitivas. Para os primeiros, há, entre outros lugares, visitas ao Museu do Azulejo ou à Casa dos Bicos. Para os segundos: o Centro Ismaili, o MAAT ou o Teatro D. Maria II. Para os terceiros: o Atelier Museu Júlio Pomar ou o Teatro Romano. As crianças também têm atividades destinadas em todos estes espaços e noutros tantos. Um conselho: programe atempadamente as visitas, pois para algumas é preciso reserva.
por Mariana Pereira, in Diário de Notícias | 18 de setembro de 2017
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Diário de Notícias