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A Perve abre o seu acervo: de Picasso ao "Inferno" de Dalí

A galeria regressa a uma tradição que perdeu quando Cesariny morreu e mostra o seu acervo numa exposição.

Carlos Cabral Nunes mostra a edição de "A Divina Comédia", com cem gravuras de Salvador Dalí   |  Paulo Spranger/Global Imagens

 

Até Mário Cesariny morrer, em 2006, a Perve todos os anos mostrava o seu acervo em exposição. Nessa altura, explica Carlos Cabral Nunes, que dirige a galeria e que este ano notou como "passaram dez anos: "Concentrámo-nos muito em divulgar a obra dele, em fazer a Casa da Liberdade - Mário Cesariny." No próximo ano, a Perve fará 17 anos. E "há muita coisa que ainda não foi mostrada." Por isso, naquela estreita rua de Alfama, a das Escolas Gerais, em Lisboa, a mostra Acervo já está patente ao público.

E lá está Mário Cesariny em quatro fotografias penduradas numa das paredes. Foram tiradas em 2006 pelo próprio Cabral Nunes.Ama como a estrada começa, verso do poeta, dá nome àquela série em que o vemos com uma escultura do artista cubano Wifredo Lam, Oiseau de Feu (1970). Foi Cesariny quem convenceu o diretor da galeria a adquirir aquela escultura em cobre, agora encimada pelas fotografias. "Ele gostou imenso, e era uma oportunidade única de ter uma escultura do Lam; esta peça é de facto muito bonita." Ainda de Cesariny: Naniora. Joia escultórica feita em outro, prata e cobre. Poucos saberão que o artista era filho de um ourives e que, logo quando era jovem, aprendeu as técnicas daquele ofício.

"O livro custava o equivalente a um carocha." Cabral Nunes calça as luvas brancas para manusear aquele que é um dos 450 livros do acervo, composto por cerca de três mil obras. A Divina Comédia, de Dante Alighieri, traduzida para português por Alexandre O"Neill e ilustrada por cem gravuras de Salvador Dali, conseguidas através de 3500 chapas, produzidas durante quatro anos de trabalho. Por isso o livro custava, à época em que foi produzido, no final de 1973, o equivalente a um carro.

Comercializado por venda postal, o livro deveria ser entregue em março e abril de 1974. "Deu-se o 25 de abril e o editor teve de sair. A edição não ficou completa. Presumo que não tenham feito mais de 30, 40 [exemplares]", afirma o diretor da galeria.

Este já é o segundo exemplar daquela obra que passa pela galeria. Pois se uma obra está no acervo da Perve, pode ser comprada. "Ainda há tempos houve uma coisa assim. Eram três obras que já me acompanhavam há uns dez anos e pronto, sofro imenso. É fundamental ter essas vendas, são recursos financeiros para sustentar o projeto, mas há um sentimento de perda", conta Carlos Cabral Nunes.

Ao lado dos três tomos de A Divina Comédia - Inferno, PurgatórioParaíso -, há ainda dois exemplares de Os Lusíadas. Uma das edições é ilustrada por Gil Teixeira Lopes; a outra edição conta com obras de vários artistas, de Júlio Pomar a João Cutileiro.

Malangatana da Perve para a Tate

Noutra sala, aqueles grandes olhos das figuras de Malangatana espreitam-nos em dois desenhos feitos na prisão. Foi da Perve que saiu a obra do pintor moçambicano que a Tate Modern mostrou na exposição inaugural da sua nova ala, inaugurada em junho. "Também nos interessava que um autor como ele pudesse estar representado numa das coleções mais importantes do mundo. Era uma obra [sem título] dos anos 60, quando o Malangatana está ativamente na oposição ao regime colonial", diz o diretor e curador desta mostra.

Noutra sala: Picasso. Duas gravuras feitas pelo espanhol que mostram o também pintor, e escritor, Max Jacob. Judeu, Jacob, morreria de doença em 1944, depois de ter sido preso capturado pelos nazis. Chronique des temps Héroiques. Aquela série - a que pertence ainda uma terceira obra - ilustra um livro de Jacob.

Uma máscara de Carnaval que Cruzeiro Seixas pintou em Angola para a sua mãe, uma enorme tela de António Palolo, nunca antes exposta pela Perve, duas gravuras de Man Ray, Sophia de Mello Breyner fotografada por Fernando Lemos nos telhados de Lisboa, fotografias do moçambicano Mário Macilau, uma mulher numa montra de Amsterdão pintada pelo argentino Alberto Cedrón, uma obra de Sonia Delaunay que leva Cabral Nunes a comentar: "A Ana Salazar ia adorar isto!" São cerca de 150 obras, para ver até 8 de outubro.

Na última sala, encontrará o angolano Sueki e a sua sérieLiberdade Já, com retratos dos ativistas angolanos presos em junho de 2015, libertados em junho deste ano por decisão do Supremo Tribunal. Está lá Sedrik de Carvalho. Cabral Nunes lembra: "Quando foi a questão dos ativistas, circulavam retratos, que lá [em Angola] circulavam mesmo em manifestações. Encontrei um rapaz novo, que era designer, pintor. Disse-lhe: "Dou-lhe um conselho, tem de sair daí e não pode usar o seu nome." O rapaz foi para Itália e começou a usar Sueki."


 

in Diário de Notícias | 7 de setembro de 2016

Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Jornal Diário de Notícias

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