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Descobrir toda a genialidade de Bosch em 21 obras
A partir de terça-feira, todo o universo do pintor holandês pode ser descoberto no Museu do Prado, em Madrid.
"A mais completa e a de melhor qualidade." É assim que o Prado apresenta a exposição de Bosch, que abre portas na próxima terça-feira, a grande aposta do museu para 2016 e que está a ser planeada há anos. Deixando de lado a guerra com o Museu de Noordbrabants, na terra natal do mestre holandês, em Madrid são mostrados, pela primeira vez, 21 quadros originais de Hieronymus Bosch (1450-1516), incluído o do Museu Nacional de Arte Antiga, e oito desenhos também atribuídos ao artista, o que constitui mais de 75% das suas obras que chegaram até aos dias de hoje.
Sendo impossível encontrar uma datação certa para todas as obras, a comissária da mostra El Bosco. A Exposição do V Centenário, Pilar Silva, especialista em pintura espanhola, flamenga e das Escolas do Norte da Europa, decidiu uma outra organização para esta mostra monográfica: seis temas que marcam a produção do artista ao qual juntou um inicial, centrado no tríptico Ecce Homo, do Museu de Boston, pintado por um artista do ateliê de Bosch, Peter van Os, que mostra o mestre holandês, a sua cidade e o seu tempo.
E se mais de 500 anos passados sobre as suas criações a originalidade do universo dos quadros de Bosch continua a maravilhar o público em geral e a influenciar artistas, original é também a forma como o Museu apresenta os quadros, sendo possível ver a parte de trás de muitos deles, revelando assim outras obras do pintor quase nunca vistas. Para tal, foram criadas estruturas ondulantes que levam o visitante a serpentear pelo percurso.
E esta exposição vem também pôr em evidência que "Bosch é um elo na cadeia da tradição holandesa, fazendo a ponte entre a Idade Média e a Renascença", assinala Alejandro Vergara, curador do Museu do Prado especializado em pintura flamenga e das Escolas do Norte da Europa.
Dando também a descobrir um Bosch muito para além dos anjos e demónios, dos animais fantásticos e das figuras etéreas que identificam o universo criado pelo mestre holandês e que, nos anos 1920, influenciou de forma determinante o movimento surrealista.
Pilar Silva não se cansa de chamar a atenção para isso mesmo: "No século XVI, na segunda metade, Bosch era conhecido quase só pelos seus demónios. E hoje também é ainda um pouco assim. Mas ele copiava tudo da realidade, era e é muito mais do que os demónios. Bosch é um pintor original. A sua capacidade de inovação, tanto técnica como a iconográfica, distanciam-no do que era feito na sua época. Mas parte do que o rodeia, da realidade, da vida quotidiana, da natureza, para renovar por completo a pintura flamenga."
Sobre o facto de ser alguém que pertenceu a sociedades ocultas ou, até como algumas vozes têm argumentando, que tomaria alguma substância para criar todo o imaginário que torna a sua obra única, Pilar Silva encolhe os ombros e com um sorriso diz que, pelo que se sabe, "era uma pessoa normal, inserido na sua comunidade".
E como que cortando esta linha de perguntas, a comissária lembra que "o amor e o interesse de Felipe II [I de Portugal] por Bosch explica a forte ligação entre os espanhóis e Bosch e a existência de um conjunto de oito pinturas do mestre holandês em Espanha", sendo um dos poucos pintores estrangeiros que até têm direito a nome em castelhano, El Bosco.
Além das seis obras pertencentes ao Museu do Prado, apresentadas como "as maiores e as melhores do mundo", a exposição conta com empréstimos importantes, e "sempre difíceis de conseguir", sublinha Pilar Silva, como as Visões do Além (da Galeria da Academia de Veneza), ou o Juízo Final, do Museu de Bruges, atribuído a Bosch pelo Bosch Research and Conservation Project, uma atribuição aceite pelo Museu do Prado, ao contrário da "desclassificação" de três das suas obras.
Infância e Vida Pública de Cristo, com o recém-restaurado tríptico A Adoração dos Reis Magos (do Prado), é o primeiro núcleo em que surgem os primeiros dos 21 quadros e oito desenhos originais de Bosch aqui expostos até 11 de setembro. Os Santos é o tema do segundo conjunto, o maior de todos, onde se destaca o tríptico emprestado por Lisboa, seguindo-se Do Paraíso ao Inferno dominado pelo tríptico Carro de Feno, onde está representado um havaiano, logo seguido de Jardim das Delícias, onde o tríptico com o mesmo nome bem como estudos recentemente realizados pelo museu madrileno mostram a complexidade do desenho subjacente das obras de Bosch e as muitas modificações que o artista fazia entre o desenho e a pintura.
O Mundo e o Homem, com a singular Mesa dos Sete Pecados Mortais, exposto mesmo como se de uma mesa se tratasse - "talvez a função original da obra", concede Pilar Silva -, e a Paixão de Cristo encerram a exposição.
por Marina Marques, in Diário de Notícias | 29 de maio de 2016
no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Diário de Notícias