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Teatro europeu regressa ao São João em 2016
Guerra, coprodução russo-britânica, chega ao Porto a 5 de Fevereiro. Haverá mais seis estreias entre os 14 espetáculos no calendário deste teatro nacional para o primeiro trimestre de 2016.
Nuno Carinhas, diretor artístico do TNSJ, chamou-lhe mesmo a “pièce de résistance” do calendário de Janeiro a Março, revelando que esta é uma criação que este teatro nacional tentou trazer a Portugal desde a sua estreia no Festival de Edimburgo em Agosto de 2014.
Produzida a pretexto do centenário do início da 1ª. Guerra Mundial (1914-18), Guerra já foi descrito como “um cruel ballet operático” a recriar os dias anteriores à eclosão do conflito que haveria de mudar o mundo, logo no início do século XX. “Uma intempestiva incursão nas imagens e nos sons da guerra, interrogando o poder da arte face à devastação”, acrescentou Carinhas na apresentação deste espetáculo que ficará em cena no palco do TNSJ – em língua inglesa e russa, com legendas em português – apenas dois dias: 5 e 6 de Fevereiro.
A dialogar com esta produção sobre o tema da guerra, Nuno Carinhas – que disse estar disponível para se manter como diretor artístico do TNSJ até final do seu mandato, que entende ir até Outubro de 2017, mas sem pretender eternizar-se no lugar – antecipou a criação para Outubro próximo, numa parceria de encenação com Nuno M. Cardoso, da peça de Karl Kraus, Os Últimos Dias da Humanidade.
Numa programação apresentada num novo contexto político, a presidente da administração do TNSJ, Francisca Carneiro Fernandes, manifestou a expectativa que a instituição possa “voltar a respirar com um bocadinho mais de alívio”, referindo-se à “luta pela sobrevivência” vivida pela instituição nos últimos anos, e ao desejo de fazer regressar a produção própria, que no ciclo de 2008-15 viu o seu orçamento “reduzido em 86%” da verba disponível.
Quatro estreias absolutas
Apesar deste contexto, o TNSJ vai fazer sete estreias (quatro absolutas, duas nacionais) entre os 14 espetáculos que estarão no calendário dos seus três palcos (o próprio São João, o Teatro Carlos Alberto - TeCA, e o Mosteiro de São Bento da Vitória - MSBV) até 27 de Março, que é simultaneamente Dia Mundial do Teatro e domingo de Páscoa.
Uma das estreias absolutas será Dos Mundos Interiores (MSBV, 15 de Janeiro), com texto e encenação de Luís Mestre (Teatro Nova Europa), que, no salão nobre do TNSJ, apresentou esta sua criação como “um diálogo interior e íntimo de uma mulher só”, mas também “uma metáfora” sobre o próprio ato da escrita.
Duas outras criações novas com estreia no Porto são (Des)Individuação, texto, encenação e interpretação de José Eduardo Silva, coprodução com o Teatro do Frio (TeCA, 10 de Março), e Beijo, encenação de Jorge Pinto numa parceria com o Ensemble – Sociedade de Atores (MSBV, 23 de Março), com Emília Silvestre a Paulo Freixinho em palco.
Sobre o primeiro espetáculo, José Eduardo Silva explicou que “está tudo ainda por fazer”, mas que quer apostar numa criação coletiva com músicos, abordando o conceito de “desindividuação” elaborado pelos filósofos Gilbert Simondon e Bernard Stiegler sobre o lugar do indivíduo (e da arte) no mundo globalizado.
Emília Silvestre disse que Beijo é também ainda uma peça “em construção”, que parte da peça de Michel Deutsch, Les Baisers, para criar “um espetáculo muito físico e orgânico” sobre a poesia portuguesa, de Pessoa a Eugénio de Andrade, de David Mourão-Ferreira a Ana Luísa Amaral.
O quarto espetáculo com estreia nacional no Porto será Habeas Corpus – Que tenhas o teu corpo, uma peça “cénico-teatral dramática”, também ainda em construção, de Ruben Marks (TeCA, 26 de Fevereiro). Nuno Carinhas apresentou esta criação como fazendo parte de “um triciclo da dança”, que inclui também Se alguma vez precisares da minha vida, vem e toma-a, de Victor Hugo Pontes (estreia nacional no Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, a 4 de Fevereiro, chegando ao TNSJ no dia 11); e A Festa (da insignificância), que Paulo Ribeiro estreou em Novembro em Lisboa, a assinalar os 20 anos de atividade da sua companhia (e que chega esta sexta-feira ao Teatro Viriato, em Viseu, e depois ao TNSJ, a 18 de Fevereiro).
Sobre a sua peça, também ainda “em construção”, Victor Hugo Pontes disse que ela vai misturar duas gerações de atores e bailarinos numa criação sobre o amor e a comunicação, partindo de A Gaivota, de Tchékhov.
Regressando às estreias, a primeira a subir ao TeCA (21 de Janeiro) será Quarteto, uma nova encenação em Portugal do clássico de Heiner Müller, desta vez assinada por Carlos Pimenta, numa coprodução com o CCB. “Será uma peça muito aberta, tanto para o encenador como para os atores e demais colaboradores”, disse o encenador, acrescentando estar a trabalhar sobre o tema da manipulação, do desejo, do erotismo, mas também da morte, a partir de Ligações Perigosas, de Choderlos de Laclos.
A completar o leque das estreias, Nuno M. Cardoso encena Águas Profundas + Terminal de Aeroporto (TNSJ, 24 de Março), um projecto “dois em um” sobre o amor e a perda na vida urbana moderna, em que vem trabalhando desde há dois anos, a partir de duas peças do dramaturgo britânico Simon Stephens, que serão estreadas em palcos portugueses. “Vai ser um espetáculo fabuloso”, prometeu o encenador sobre esta coprodução com a Cão Danado (Braga) e A Oficina (Guimarães), que depois do Porto correrá estas cidades e outras do país.
O calendário de espetáculos do primeiro trimestre de 2016 completa-se com a produção d’Os Artistas Unidos, Doce Pássaro da Juventude, de Tennessee Williams, encenação de Jorge Silva Melo (TNSJ, 14 de Janeiro); duas produções do Teatro da Garagem com encenação de Carlos J. Pessoa: Finge (MSBV, 4 de Fevereiro) e Graça: Suite teatral em três movimentos (TeCA, 12 de Fevereiro), esta criada sobre a pintura de Graça Morais. Serão também apresentadas no Porto o “policial” As Raposas, de Lillian Hellman, encenação de João Lourenço para o Novo Grupo/Teatro Aberto (TNSJ, 3 de Março), e a produção do Teatro da Comuna, Misterman, de Enda Walsh, encenação e interpretação de Elmano Sancho (MSBV, 4 de Março).
Na programação paralela aos espetáculos, o destaque vai para o programa Shakespeare 400 nos projetos educativos, em que, a pretexto do 4º centenário da morte do dramaturgo inglês (1564-1616), que ocorre no próximo ano, a poeta e ensaísta Ana Luísa Amaral dirigirá, entre 16 de Janeiro e 4 de Junho, a leitura de seis peças, de O Mercador de Veneza a Romeu e Julieta.
“Vivemos um ciclo político novo e inédito, vamos acreditar que seja mais atreito aos vírus artísticos”, disse Nuno Carinhas a encerrar a apresentação do programa.
por Sérgio C. Andrade, in Público | 15 de dezembro de 2015
Notícia no âmbito da parceria Centro Nacional de Cultura | Público