Arquitetos Aires Mateus vencem concurso para museu suíço e batem três prémios Pritzker
Projeto de 85 milhões de euros para novo pólo cultural de Lausanne bate propostas assinadas por três prémios Pritzker.
A dupla de arquitetos portugueses Manuel e Francisco Aires Mateus venceu esta segunda-feira o concurso internacional para criar a nova casa de dois museus - o Museu da Fotografia de Elysée e o Museu de Design e Arte Contemporânea (Mudac) - em Lausanne, na Suíça. A sua solução, escolha unânime do júri, foi criar “um museu que não é um museu, são dois”, como disse ao PÚBLICO Francisco Aires Mateus: um único edifício que estará construído em 2020 e cuja obra está orçada em 85 milhões de euros.
“Desenhem-me dois museus” foi o pedido do Cantão de Vaud, cuja capital é Lausanne. “Um museu, dois museus, um espaço” foi a resposta da dupla Aires Mateus, que com a sua proposta deixou para trás no concurso três arquitetos que já receberam o prémio Pritzker: o japonês Shigeru Ban, a dupla japonesa Kazuyo Sejima e Ryue Nishizawa (do atelier Sanaa) e o francês Jean Nouvel.
A escolha do atelier português foi unânime, lê-se no texto de apresentação do projecto vencedor assinado por Olivier Steimer, presidente do júri, que classifica a ideia dos arquitetos como “fabulosa”. Um único edifício, “maravilhosamente engenhoso”, composto por duas partes, uma dedicada à fotografia e outra ao design e à arte contemporânea. “Cada uma no seu espaço, unidas por uma formidável área de recepção e ponto de encontro, formando uma extensão natural” ao espaço público, lê-se no documento apresentado pelo júri que, no outro extremo de uma grande praça, albergará o também futuro Museu do Cantão de Belas-Artes (MCBA).
O projeto, com data prevista de construção para 2017, foi apresentado esta segunda-feira em Lausanne. O valor da obra está estimado em 85 milhões de euros (90 milhões de francos suíços). “É o nosso maior projecto, em termos de valor e de qualidade do programa”, confirmou ao PÚBLICO Francisco Aires Mateus, lembrando que “os programas culturais são bastante interessantes e para nós são particularmente estimulantes”, disse sobre um dos tipos de equipamentos que a dupla portuguesa mais gosta de projetar.
"O projeto é bastante compacto", descreve o arquiteto português, ao telefone a partir de Lausanne, "situa-se ao fundo de uma grande praça urbana com o MCBA ao fundo". A disposição do espaço nesta antiga zona de armazéns ferroviários "gera uma praça muito comprida" e o museu dois-em-um dos Aires Mateus fica num dos extremos, no que até agora é uma espécie de beco, um cul-de-sac. E o edifício único desenhado pelos portugueses vive "entre dois mundos: um museu de fotografia, com menor necessidade de luz e que portanto ficará no nível -1, e o museu de arte contemporânea que ficará no piso 1". No meio há um grande vazio e o teto e chão do edifício "são desenhados como se de uma topografia se tratasse, não são sempre planos". Essa zona será "um espaço polivalente" que albergará desde lojas a cafetarias, e que ao mesmo tempo "recolhe as pessoas e as distribui para cada um dos museus. A ideia é prolongar para dentro dos dois museus a cidade".
O concurso para a construção destes dois museus abriu no início do ano. Foram recebidas 150 propostas (uma ficou imediatamente pelo caminho por não cumprir todos os requisitos), das quais apenas 21 foram selecionadas para a fase final. Além dos arquitetos-estrela a concurso, entre os finalistas figurava uma colaboração entre o suíço Local Architecture e o português Camilo Rebelo (um dos autores do Museu do Côa). Os restantes projetos vinham de países de todo o mundo, sendo o país mais representado a Suíça, com seis propostas a concurso. Seis chegaram a uma finalíssima e a escolha dos Aires Mateus para a construção do edifício que será a casa do Musée de l’Elysée e do Mudac é, para as diretoras de ambas as instituições, “o primeiro passo para a criação de um complexo museológico de reputação internacional em Lausanne”, lê-se na declaração conjunta de Tatyana Franck, diretora do Musée de l’Elysée, e Chantal Prod’Hom, diretora do Mudac.
Valorização da arquitetura made in Portugal
O projeto português integra-se então na segunda fase do futuro pólo museológico da gare de Lausanne, um “antigo território ferroviário, desativado”, ilustra Francisco Aires Mateus, que integra os dois museus. A primeira fase disse respeito ao MCBA, cujo concurso escolheu o projecto dos catalães Barozzi-Veiga - Fabrizio Barozzi integrou o júri que deu a vitória aos Aires Mateus (foram os vencedores do último prémio Prémio Mies van der Rohe), e a sua concretização está prevista para 2018. Dois anos depois, prevê-se então a inauguração do Mudac e do Museu de Fotografia da dupla portuguesa.
A articulação entre os projetos dos diferentes museus foi assegurada e planeada, em traços largos, por Barozzi, e foi tida em conta na escolha da proposta de Francisco e Manuel Aires Mateus. Na zona, em que "se andava e não havia uma ligação" com o resto da cidade, como um grande beco, nascerá agora o edifício que quer ser "não só um destino magnético ao fundo da praça, mas também criará escadas e percursos para atingir a cota mais alta da cidade. No fundo, quer ser não só um chamamento da vida urbana para o museu mas também permitir que as pessoas amplifiquem os seus circuitos na cidade", remata Francisco Aires Mateus, poucas horas depois do anúncio da vitória do seu projecto no ambicioso concurso.
O pólo cultural compreende 22.300m2 e tem um custo global estimado, de acordo com a imprensa suíça, de 164 milhões de euros (180 milhões de francos suíços), cujo financiamento será público e privado.
Para o crítico de arquitetura André Tavares, este novo projecto da dupla portuguesa é importante para o posicionamento dos profissionais pela importância das instituições que vão albergar, e não só pela "possibilidade de continuarem a construir, e a construir edifícios relevantes que abrem desafios na sua carreira, mas também por serem edifícios que são públicos - que criam espacialidade e transformam as cidades". Na carreira destes irmãos arquitetos, recorda o especialista, "que há muitos anos ensinam fora e têm audiência internacional, faltava-lhes obra internacional. Esta é mais uma confirmação, que o projecto da sede da EDP trouxe, de que os seus projetos são transponíveis para a escala urbana com mais-valias para a cidade. Foi uma porta extremamente importante para alcançarem estas encomendas" que agora surgem. André Tavares frisa ainda que esta vitória de um concurso internacional "é uma belíssima notícia para os arquitetos em Portugal, para a valorização da arquitetura" made in Portugal.
Os lisboetas Francisco (n. 1964) e Manuel Aires Mateus (n. 1963) formaram um dos mais conceituados ateliers de arquitetura portugueses em 1988, depois de anos de colaboração com Gonçalo Byrne. São autores de obras como a nova sede da EDPna zona ribeirinha de Lisboa, foram por duas vezes finalistas do prémio Mies Van Der Rohe e venceram o primeiro prémio da VIII Bienal Ibero Americana de Arquitetura em 2012. Lecionam na Suíça, em Mendrisio, desde 2001, na Academia di Architectura, e na Universidade Autónoma de Lisboa desde 1998. Têm em curso obras como Centro de Criação Contemporânea Olivier Debré, em Tours (França), cuja obra deve terminar em Fevereiro de 2016, segundo disseram ao PÚBLICO, e acaba de arrancar a obra da nova Faculdade de Arquitectura de Tournai, na Bélgica. "À espera", mas não cancelada, está a construção do Centro Muçulmano de Bordéus, em França. Até 1 de Novembro, e a propósito do seu projecto para o Centro Olivier Debré, encontra-se em Tours uma exposição sobre o trabalho dos irmãos Aires Mateus.
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