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VÍTOR SILVA TAVARES (1937-2015)
Se houve exemplo em Portugal de editor independente, sobretudo preocupado com a edição de livros de autores de qualidade, mas sem preocupação de êxito multitudinário, foi Vítor Silva Tavares.
O seu percurso de vida daria um romance da Lisboa genuína e popular. O seu amigo João César Monteiro poderia tê-lo feito. Conheci-o na Rua das Madres, no coração da Madragoa, a caminho da Rua da Emenda, onde fazia questão de ser um editor artesanal. Quem conhecesse a Lisboa literária e boémia, capaz de compreender Bocage e Nicolau Tolentino, mas também Cesariny e Alexandre O'Neill conhecia Silva Tavares e a sua marca inconfundível - & etc. Quem o ouvisse, sabia que a sua luta de gato e rato com a gente da censura tinha sido um mimo de imaginação. & etc. nasceu no Jornal do Fundão para iludir a censura, sempre atenta à página da cultura, que levara à suspensão do jornal da família Paulouro. Herberto Helder, Adília Lopes, Luiz Pacheco - são autores queridos do artífice de &etc...
Um dia quando quis lançar & etc como revista, antes de ser marca editorial (inconfundível) foi buscar o Hernâni Cidade e o José Blanc de Portugal. Pretendia, assim, fugir às malhas censórias. Mas nem mesmo assim o conseguiu, porque apanhou um coronel que implicou com a prosa do José Blanc, ignorante de que este até escrevia crónicas para a Emissora Nacional. No fim de tudo, o censor lá caiu em si e deixou passar a prosa com cortes mínimos, só para não dar o braço a torcer.
Um dia perguntaram ao Vítor quem tinha sido o seu maior mestre - e ele não hesitou em dizer que foi o Dr. Fernando Amado (a alma do Centro Nacional de Cultura), porque lhe soube inocular o bichinho da paixão do teatro, como expressão da vida. Deixou-nos por estes dias, libertário sempre, amante do bom português, cultor da pureza do povo, dessa gente que ainda há poucos anos cosia as redes à porta de sua casa e das varinas que lhe ensinaram o genuíno calão da Madragoa... Quem foi ele? Tudo, & etc!